A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
Sede Editorial: Zéfiro - Edições e Actividades Culturais, Apartado 21 (2711-953 Sintra). 
Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

Donde vimos, para onde vamos...
Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

Onde temos ido: Mapiáguio (locais de lançamentos da NOVA ÁGUIA)

Albufeira, Alcáçovas, Alcochete, Alcoutim, Alhos Vedros, Aljezur, Aljustrel, Allariz (Galiza), Almada, Almodôvar, Alverca, Amadora, Amarante, Angra do Heroísmo, Arraiolos, Assomada (Cabo Verde), Aveiro, Azeitão, Baía (Brasil), Bairro Português de Malaca (Malásia), Barcelos, Batalha, Beja, Belmonte, Belo Horizonte (Brasil), Bissau (Guiné), Bombarral, Braga, Bragança, Brasília (Brasil), Cacém, Caldas da Rainha, Caneças, Campinas (Brasil), Carnide, Cascais, Castro Marim, Castro Verde, Chaves, Cidade Velha (Cabo Verde), Coimbra, Coruche, Díli (Timor), Elvas, Ericeira, Espinho, Estremoz, Évora, Faial, Famalicão, Faro, Felgueiras, Figueira da Foz, Freixo de Espada à Cinta, Fortaleza (Brasil), Guarda, Guimarães, Idanha-a-Nova, João Pessoa (Brasil), Juiz de Fora (Brasil), Lagoa, Lagos, Leiria, Lisboa, Loulé, Loures, Luanda (Angola), Mafra, Mangualde, Marco de Canavezes, Mem Martins, Messines, Mindelo (Cabo Verde), Mira, Mirandela, Montargil, Montijo, Murtosa, Nazaré, Nova Iorque (EUA), Odivelas, Oeiras, Olhão, Ourense (Galiza), Ovar, Pangim (Goa), Pinhel, Pisa (Itália), Ponte de Sor, Pontevedra (Galiza), Portalegre, Portimão, Porto, Praia (Cabo Verde), Queluz, Recife (Brasil), Redondo, Régua, Rio de Janeiro (Brasil), Rio Maior, Sabugal, Sacavém, Sagres, Santarém, Santiago de Compostela (Galiza), São Brás de Alportel, São João da Madeira, São João d’El Rei (Brasil), São Paulo (Brasil), Seixal, Sesimbra, Setúbal, Silves, Sintra, Tavira, Teresina (Brasil), Tomar, Torres Novas, Torres Vedras, Trofa, Turim (Itália), Viana do Castelo, Vigo (Galiza), Vila do Bispo, Vila Meã, Vila Nova de Cerveira, Vila Nova de Foz Côa, Vila Nova de São Bento, Vila Real, Vila Real de Santo António e Vila Viçosa.
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domingo, 7 de março de 2010

Terão as pessoas mais amáveis uma vantagem evolucionária?

Por Yasmin Anwar, UC Berkeley
http://www.alternet.org/story/145888/

Pesquisadores da Universidade da California, Berkeley, estão a desafiar as antigas crenças de que os seres humanos estão programados para serem egoístas. A partir de uma longa série de estudos, os cientistas sociais estão a reunir um crescente conjunto de evidências que demonstram que estamos a evoluir para nos tornarmos mais compassivos e colaborativos na nossa luta pela sobrevivência e pelo sucesso.
Em contraste com as interpretações do "cada um por si" da teoria da evolução de Charles Darwin através da selecção natural, Dacher Keltner, um psicólogo da Universidade de Berkeley e autor do livro Born to be Good: The Science of a Meaningful Life (Nascer para ser Bom: a Ciência de uma Vida com Significado) e os seus colegas estão a desenvolver uma teoria de acordo com a qual os humanos são bem sucedidos como espécie exactamente por causa das suas características de altruísmo, capacidade de cuidar e compaixão.

Chamam-lhe a "sobrevivência dos mais amáveis."
"Por causa da vulnerabilidade dos nossos bebés, a tarefa essencial para a sobrevivência humana e reprodução genética é cuidar dos outros," diz Keltner, co-director do Centro de Ciência Um Bem Maior da Universidade de Berkeley. "Os seres humanos sobreviveram como espécie porque desenvolveram a capacidade de cuidar daqueles em necessidade e de cooperar. Tal como Darwin há muito tempo resumiu, a simpatia é o nosso instinto mais forte."

Empatia nos nossos genes
A equipa de Keltner está a analisar de que forma a capacidade humana de cuidar e cooperar está activa em determinadas regiões do cérebro e do sistema nervoso. Um estudo recente encontrou evidências fortes de que muitos de nós somos geneticamente predispostos à empatia.

domingo, 14 de fevereiro de 2010

Todas as cartas de amor são ridículas, mas no entanto...


«Todas as cartas de amor são
Ridículas.
Não seriam cartas de amor se não fossem
Ridículas.

Também escrevi em meu tempo cartas de amor,
Como as outras,
Ridículas.
As cartas de amor, se há amor,
Têm de ser
Ridículas.

Mas, afinal,
Só as criaturas que nunca escreveram
Cartas de amor
É que são
Ridículas.

Quem me dera no tempo em que escrevia
Sem dar por isso
Cartas de amor
Ridículas.

A verdade é que hoje
As minhas memórias
Dessas cartas de amor
É que são
Ridículas.

(Todas as palavras esdrúxulas,
Como os sentimentos esdrúxulos,
São naturalmente
Ridículas.)»

Álvaro de Campos, 21/10/1935

Leia um excerto em: www.zefiro.pt

quarta-feira, 7 de outubro de 2009

Eclipsados


Fitando a negritude noturna, um menino enamorou-se da Lua. Tornou certo para si que teria de ir ao encalço daquilo que emaranha a alma na mente em um misto de idéia e quimeras.
Quando se tornou um homem, libertou-se das amarras que o atavam ao chão. Por noites a fio a seguiu radiante sem se negar a doações. Mas, os constantes movimentos de transformação em todo o universo refletiram a rápida passagem do tempo no homem. Mesmo velho, ainda amava a Lua.
Deitado sobre a grama, sentindo o mundo inteiro embaixo de si, descobriu que era apenas mais um estranho em um mundo estranho de coisas estranhas. Fitou a Lua com uma expressão que jamais havia se esboçado em seu rosto. Uma expressão de amor explosivo e travou com ela, pela primeira vez em sua existência, um diálogo verbal inflamado. Seu amor foi além das possibilidades humanas.
Vendo o concreto diluir-se entre seus dedos, o ancião chegou ao seu ponto final. Flamejante de lágrimas pôde ver tudo em vão, porque o destino da vida é perpetuar o mistério de seu próprio fenômeno. A vida é o mistério de si mesma. Fechando os olhos, sereno, sussurrou: “vejo agora o lado oculto da Lua que ela mesma nunca foi capaz de desvendar”.
O ancião teve seus olhos e pensamentos eclipsados repentinamente. Um eclipse eterno de sombra eterna.

sexta-feira, 31 de julho de 2009

Amor tudo cala

Homenagem a um concerto religioso de Leonard Cohen, irmão mais velho na Via da Paixão e do Despertar!

Lisboa, Pavilhão Atlântico, 30.09.2009.

(Não consegui postar um video de "Take this Waltz". Haverá uma alma bondosa que o faça?)

terça-feira, 12 de maio de 2009

Voto de Ardente Amor Divino

«Amar Jesus é ser com ele na morte passageira e na vida eterna. Não se trata de sobrevivência, em nós, de qualquer entidade invisível e abstrata, mas do próprio corpo [do coração] ressurgido.»
Teixeira de Pascoaes, São Paulo

«Quem me dera por língua um raio ardente
Que os corações abrirá e abrasará,
E os derreterá, unirá e transformará,
No amor, que arde e inflama suavemente.

Amor, que tudo quer, nada consente,
Amor, que não se vê, sendo luz clara,
Amor, que do céu vem, e no céu pára,
Amor, que quem o sente, não se sente.

Amor que n'alma imprime um ser divino,
Que alumiando abre, abrindo acende,
Derrete unindo, e une transformando,

Amor, que cá na terra é peregrino,
Amor, que atrai o spírito e o suspende,
Amor, enfim, que só se adquire amando.»
Frei Agostinho da Cruz

sexta-feira, 8 de maio de 2009

A Inte(r)ligência

«Como o homem psíquico, tendo a sua base na emoção, que é a substância [in]consciente do seu espírito, tem, para chegar à vontade que é o contorno do seu corpo psíquico e o fim da sua pessoa mental, que passar pela inteligência; (...)
Assim a humanidade, tendo a sua base no indivíduo, que é a substância socialmente inconsciente do seu todo, tem para chegar à civilização, que (...) passar pela nação, que é o órgão da civilização, a Inteligência e consciência da humanidade.
(...)
Todas as profecias têm três realizações, e isto é simbolizado pela tripeça, que tem três pés.
(...)
A chave está dada, clara e obscuramente, na primeira quadra do Terceiro Corpo das Profecias do Bandarra (...).
A quadra é assim:

Em vós que haveis de ser Quinto
Depois de morto o Segundo,
Minhas profecias fundo
Nestas letras que VOS/AQUI Pinto.


(...)
Se as letras são as da palavra VOS, indicam, como se mandou que se soubesse, Vis, Otium, Scientia. E se as letras são as da palavra AQUI, indicam, segundo a mesma ordem, Arma, Quies, Intellectus, que logo se vê serem termos sinónimos dos outros.
Temos pois que a Nação Portuguesa percorre, em seu caminho imperial, três tempos - o primeiro caracterizado pela Força (Vis) ou as Armas (Arma), o segundo pelo Ócio (Otium) ou o Sossego (Quies), e o terceiro pela Ciência (Scientia) ou a Inteligência (Intellectus).
(...)
No primeiro tempo - a Força ou Armas - trata-se de el-rei D. Manuel o Primeiro, que é o quinto rei da dinastia de Avis, e sucede a D. João o Segundo, depois deste morto. Foi então o auge do nosso período de Força ou Armas, isto é, de poder temporal.
No segundo tempo - Ócio ou Sossego - trata-se de el-rei D. João o Quinto, que sucede a D. Pedro o Segundo, depois de este morto. Foi então o auge do nosso período de esterilidade rica, do nosso repouso do poder - o ócio ou sossego da profecia.
No terceiro tempo - Ciência ou Inteligência - trata-se do Quinto Império, que sucederá ao Segundo, que é o de Roma, depois de este morto.
Quanto ao que quer dizer esta Roma, a cujo fim ou morte se seguirá o Império Português, ou Quinto Império, ou o que seja a Ciência ou Inteligência que definirá a este - não direi se o sei ou o não sei, se o presumo ou o não presumo. Saber seria de mais; presumir seria de menos. Quem puder compreender que compreenda.»
Fernando Pessoa, Sobre Portugal

«(...) o amor não se poderá separar do conhecimento, como forças entre si unidas e que através da contemplação, levarão a essa usufruição última e desejada de Deus: a força do conhecimento sempre aumentando a força do amor, e reciprocamente. (...) como ordem de amor e pelo amor. E nessa união derradeira, que é sono espiritual da alma, se realizará a perfeição desse amor.»
Dalila Pereira da Costa, Místicos Portugueses do Século XVI

terça-feira, 28 de abril de 2009

O Mar

«Ser apenas o Amor, não ser quem ama.»
Teixeira de Pascoaes

«Dai-me uma alma transporta de argonauta,
Fazei que eu tenha, como o capitão
Ou o contramestre, ouvidos para a flauta
Que chama ao longe o nosso coração,
Fazei-me ouvir, como a um perdão,
Numa reminescência de ensinar,
O antigo português que fala o mar!»
Fernando Pessoa

Ser apenas o que falo, não ser quem fala.

sábado, 25 de abril de 2009

Li-berdade é a Verdade da Luz: a Vera Lei

(Vieira da Silva )

«Uma mesma alma em todos os peitos! um mesmo amor em todos os corações! Consoladora intuição, luz crepuscular do mundo antigo, que é hoje a nossa força, a nossa certeza pela revelação do pensamento, pela Ciência.

A Ciência é a alma do mundo, porque o seu nome diz-se Liberdade.

A Arte é - a Verdade feita Vida.

Poesia! mas poesia que console,
E a alma acalente em berço d'harmonias!...
Dessa que, quando dói, tanto consola,
E às sombras do viver dá seu crepúsculo...
Desta poesia, sim! que nos eleva,
Sem se ver com que mão...
Poética de vida e sangue e tudo!
Que só tomou por lei o livre Amor...

Andam ali os mundos encobertos,
Que um só olhar amante patenteia...

Vós, que ledes na noite... vós, profetas...
Que sois os loucos... porque andais na frente...
Que sabeis o segredo da fremente
Palavra que dá fé - ó vós, poetas!

Estendei vossas almas, como mantos
Sobre a cabeça deles... e do peito
Fazei-lhe um degrau, onde com jeito
Possam subir a ver os astros santos...

Levai-os vós à Pátria-misteriosa

(...) os a[u]stros (...)
não querem mais lei que o infinito
Antero de Quental, Prosas da Época de Coimbra, Odes Modernas, Primaveras Românticas



O Homem é Filho do Amor Maior!
O Seu de Todos.




«Mas nele é que espelhou o Céu.»
[Portugal em] Pessoa, Mar Português

Toda a Palavra significa Liberdade

«Eucken afirma a necessidade de uma cultura noológica de permanência espiritual, que seja a medula da civilização, de outra forma dispersa em oca actualidade. O fluxo desagregou o pensamento platónico, arrancou a alma às ideias e as ideias à realidade (...).

Qual o rio que, atravessando os mundos, os traga cinturados e reflectidos a repassarem as mesmas viagens, a repetirem o milagre do encontro?
A Memória.
Esse o grande rio do tempo regressando à origem, como peregrino que fosse a ver o mundo e ao lar doméstico voltasse (...).

A máscara humana é um acaso da Natureza, é um milagre de equilíbrio, só a lembrança da palavra, acusando-a, faz tremer e a mostra à beira do Abismo do Nada em que se erguera. (...)
Não é a nossa máscara um penhasco talhado pela erosão das lágrimas?
Não é em nossos olhos que a paisagem chora uma Saudade tão velha como os mundos?

Oh, meus amados portugueses (...) alvorece a nova luz! (...)
Fraternidade é a palavra do Deus Infante, do D. Sebastião redimido! Ele aprendeu Portugal no exílio, e traz do exílio a sua alma aos portugueses sem ânimo. Esse exílio ensinou-lhe que o homem é o eterno exilado de si mesmo, se em si mesmo não acende Deus. No exílio aprendeu a perfeita bondade, porque conheceu o íntimo da vida.
E ele volta para Portugal, porque Portugal é agora o Universo.
Tudo será perdoado, porque o Deus Infante é português e tudo fraterniza nesta língua de silêncio, de intimidade imediata, de amor aceso no próprio coração divino.
(...)
Deus é o Amor que une, e cada consciência é a unidade elementar que pelo amor se move atraído pela «grande Unidade». Por isso, a compreensão é a Unidade e compreender é Amar.

A luz é o grande músico do Infinito
Leonardo Coimbra, Dispersos II - Filosofia e Ciência, Dispersos I Poesia Portuguesa, Sobre a Obra de Teixeira de Pascoaes, Regresso ao Paraíso

Todo o homem nasce cego. É apenas graças à luz do Sol que pode ver. Ao Sol nascido do Mar do Amor.
Luz não é só o que ilumina, é também o que é iluminado, pois nada existe fora da Luz.

A Palavra invisível simboliza o mundo visível, tal como o mundo visível simboliza o invisível. A Palavra espelha a Criação Original: a Luz originária.
A Palavra de Deus é Luz: do Amor, o Criador: do Homem.

A palavra Luso [de/a Luz], vem do Grego Lys significando Liberdade.

A Palavra é o som da Luz, é a Luz criando-se a si mesma:
toda a palavra significa Liberdade.

«A Terra inteira [através do Homem] dando à Luz o Céu.»
Teixeira de Pascoaes




«a chama, que a vida em nós criou...
A mão do vento pode erguê-la...»
Fernando Pessoa, Mensagem

Oh a poderosíssima mão da Nossa Voz!... Que é já a nossa Chama: chamando-Nos!
Iluminando e re(i)nascendo a Nossa Alma: Portugal.
O Porto onde Tudo é Igual, (pelo) Amor, (ao) Infinito.

sexta-feira, 24 de abril de 2009

A Seiva de Pascoaes, de Portugal

(Google - Rio Douro)
A Água é a Seiva da Serra

Tomai, e bebei! Este é o sangue de Portugal, o sangue da eterna nova Lusitânia! A Nossa Seiva de Sempre.

«Mas o Verbo divino, ao condensar-se
Em pobre corpo humano,
Não encarnou de todo, e nele vive.

Por mais que eu fale de outras pessoas, de viagens, das árvores (...) em última análise, o assunto da minha conversa sou eu próprio.

(...) o seu [do Homem] destino é interpretar e definir o Indefinido, talhar o informe, concluir, em outro plano, o mundo esboçado neste:
Concluir a imperfeita Criação
Que Deus iniciou.

A poesia espontânea só obedece ao ritmo da sua expansão natural. É instintiva. Despreza os modelos consagrados, porque ela contém a virtude de criar as leis que a regulam. É como as seivas das árvores, que trazem, no seio, quando afloram nas ramagens, o desenho futuro das folhas e das flores.

(...) a Dor, síntese do Amor e da Morte, é a própria essência da Poesia lusitana. As lágrimas duma Pátria caem sempre no coração dos seus poetas, para que eles as redimam nos seus cantos. Todo o canto é redentor. (...)
Eram tudo memórias... Sim... tudo é lembrança para o amor que deseja oculta a incerteza do futuro na certeza do que passou (...).
Há palavras que são estrelas. (...)
In principio erat verbum... e o Verbo é a Saudade. (...)
As cousas e os seres vivem mais na nossa memória que diante dos nossos olhos. Existir não é pensar: é ser lembrado. E para ser lembrado, é preciso amar. Só o amor cria a substância imperecível em que a nossa imagem se desenha.

D. Sebastião é o Desejado e o Encoberto ou antes o desejo encoberto da alma pátria, essa nuvem indecisa (...) o autor de D. Sebastião é o Povo, o poeta do Cancioneiro. O autor do D. Quixote é um homem. (...)
D. Sebastião é uma vaga existência divinizada e absorta no seu remoto encantamento. A sua acção pessoal não é presente, como no D. Quixote, mas futura, porque ele há-de vir numa incerta manhã de nevoeiro, e a esperança é o áureo fulgor da sua coroa...
D. Quixote é. D. Sebastião há-de ser. (...)
O português é indeciso e inquieto, como as nuvens em que as suas montanhas se continuam e as ondas em que as suas campinas se prolongam... É uma tendência do Passado para o Futuro, uma ansiedade sobre o Além, uma ave sentimental nas garras da Tentação, descrevendo um voo incerto e doloroso. (...) Alma que foge de ser corpo, insatisfeita e perdida numa existência vaga, sem limites. Tem um fundo de feminina ternura. A sua sombra é de mulher no pressentimento de um filho esperado em vão. É uma lembrança que chora, grávida de misteriosas esperanças: a eterna promessa de uma dádiva, um eterno crepúsculo amanhecente...
O Verbo, feito homem, espera a hora do seu regresso a Portugal...
Não regressou ainda, mas já sabemos o que ele sente, pensa e quer.
A alma portuguesa tinha de encarnar num ser individual e transcendente, a fim de encontrar o instrumento da sua actividade patriótica e religiosa.
Foi por isso que D. Sebastião, aplaudido por Camões, caminhou, aureolado de sonho, para a morte. E foi por isso também que se criou a Lenda, que é mãe de personagens vivos e não de simples e isolados sentimentos.

- A serpente que outrora se enroscou
Na árvore do Paraíso, seduzindo
Nossos Primeiros Pais.

Nem Hércules, nem o Anjo Gabriel,
Nem S. Jorge puderam destruí-la.
Foi ela que traçou, na escuridão,
Com a ponta da cauda traiçoeira,
As órbitas dos mundos.

Era a cobra o sinal do seu Império
A cobra e o riso eterno dos seus lábios:
Riso que anima as plantas e as estrelas
E que percorre o corpo humano - e é sangue
!

Aqui, no Inferno, neste sítio lúgubre,
As almas das criaturas são imagens
Vivas de corpos mortos e desfeitos,
(...)
A criatura expia o velho crime
De se ter entregado às mãos da Morte,
Havendo sido dada à luz da Vida.
Eis o crime sem fim, primordial...

Aqui, no País do Drama, nossos Pais
Desde a noite dos tempos têm vivido
A vida demoníaca e nocturna...
Quem de nada se lembra nada espera.

Aqui, no País da Sombra,
Da Saudade da Vida
, as criaturas
Sofrem a dor da sua imperfeição...
... e até parece
Haver turvado a misteriosa fonte
da Luz originária...

Mas a alma ressuscitará sem prejuízo do corpo. Há entre ele e ela um mal-entendido, que necessita de findar.

Cada alma tem seu medo...
O seu segredo
Que Deus lhe disse, ao nascer,
Para ela o não dizer...


É a Palavra misteriosa
Que faria eterna luz,
Na escuridão da Natura.
Mas nem a disse Jesus,
Nem Sibila fabulosa...
E só baixinho murmura,
Ou na lágrima primeira
Ou derradeira...
Di-la o primeiro vagido
E o derradeiro gemido...

Emana um fumo d'alma o crepitar do lume...
O incêndio duma flor dá a cinza do perfume...
A luz envolve a chama e a chama envolve a lenha...
Sensível musgo cobre uma insensível penha,
E sobre o musgo paira o aroma espiritual...
Mistério... Num aroma a pedra é imaterial!
E todavia são a mesma vida pura
O claro aroma, o verde musgo, a penha dura!...
A terra é a mãe da Alma, a terra deu à luz
O perfume da flor e a alma de Jesus
!...
No Poeta comovido há a loucura do vento;
A nuvem é um delírio, a água um sentimento...
A fonte que através dum areal se perde,
As suas margens vai vestindo de cor verde,
Lançando nessa terra estéril, ressequida,
Num beijo sempiterno, a semente da Vida...

Todos os robles dão, ardendo, a mesma luz...
Um tronco sobre um lar é um Cristo numa cruz!
E é calor que agasalha e facho que alumia
O que é em Cristo amor, piedade, harmonia...
E tudo o que é no poeta emoção e delírio
É luz no sol, canto nas aves, cor no lírio!...
E tudo o que é em nós Bondade é num rochedo
Viçoso musgo e santa sombra no arvoredo!...
E, enquanto dou a um pobre um bocado de pão,
O sol enche a luz o saco da amplidão!
E, qual Samaritana, a nuvem religiosa
Dá de beber a toda a terra sequiosa...
E enquanto eu sou a morte, ó velho e frio inverno,
Perante o sol - Jesus, és um Lázaro eterno...
E as verdes ervas são versículos sagrados
Que os ribeiros e o sol escrevem sobre os prados...
E uma pedra contém a história verdadeira
Do Génesis, da Luz e da Mulher primeira!...
E a mais estéril terra ainda recorda e chora
O tempo em que beijou teus lábios d'oiro, aurora.
Pela primeira vez, ardente de paixão!...
E nos olhos da terra ainda fulgura a imagem
Através da penumbra infinda do Mistério,
Até desabrochar num coração etéreo!
Há nos olhos da terra a imagem desse olhar
Que a saudade transforma, às vezes, em luar...

Deus disse à luz do sol o segredo da Vida.
Desvendemos a Luz amada e preferida!...
Vejamos a razão suprema da existência
E o que ela tem d'amor, de espírito e de essência,
O que nela é real, eterno e inconfundível
...
Que o nosso olhar penetre o mundo do invisível,
Os páramos do Sonho, a amplidão da Quimera,
Onde já se descobre a etérea Primavera, (...)
A nova Criação que está para surgir
Do caos do Amanhã, do beijo do Porvir
!...

E a nova Vida, numa onda a resplende,
Aflora à superfície ideal do novo ser.
Um novo Apolo vai tocar a nova Lira...
E na água que se bebe e no ar que se respira,
Nas nuvens onde dorme a clara luz dos céus,
Palpita um novo amor, murmura um novo Deus...

Vemos Deus pelos olhos da Saudade

Quero viver a Vida na Morte; beijá-las num só beijo...

E vejo erguer-se o rio cristalino,
Transfigurado em sonho, em nevoeiro,
E faz-se eterno espírito divino
Aquele corpo de água prisioneiro.

Ó láctea emanação! Ó névoa densa!
Ó água aberta em asa! Ó água escura!
Água dos fundos pégos no ar suspensa.
Vestida como um Anjo, de brancura.»
Teixeira de Pascoaes, Cânticos, O Homem Universal, Os Poetas Lusíadas, Regresso ao Paraíso, Terra Proibida, Para a Luz, Verbo Escuro, A Arte de Ser Português

quinta-feira, 23 de abril de 2009

Saudade, Espelho Eterno: Presente de Deus

«ó gente humana, nascida para voar ao Paraíso, porque deixar-se abater por um ténue sopro de vento*? [Anjo no Purgatório: *desejo de glória (i)mundana]

(...) os bem-aventurados, contemplam todos Deus, que é o Espelho, em que se revela o teu pensamento ainda antes de o conceber.

Nos bem-aventurados o sentimento e a inteligência são de igual valor (...) pois que Deus iluminou com a luz da sua sapiência e com o calor do seu amor, nada é comparável a esta igualdade.»
Dante, Divina Comédia

«Pela Lembrança conhecemos o que fomos e pelo Desejo pressentimos o Futuro.»
Teixeira de Pascoaes

Saudade, Ponte entre Passado e Futuro: Presente de Deus, a Fonte.

«Vemos a imagem reflectida, mas não o espelho que a reflecte.»
Teixeira de Pascoaes, O Bailado

Vemos a Ponte mas não a Fonte... pois a Ponte é a Fonte, que para Si mesma caminha.

«Dois espelhos se confrontam mudos:
entre eles nós dois nos interpomos.
Alguém sabe quem somos? Simples nomes
ou reflexos falantes de um espelho?

Vem vindo oh vem vindo a estrela d'alva
olhando serena o espelho que se acalma.

a pomba vem e desata
o saber genuíno
do coração.

Ama por amar»
Dora Ferreira da Silva, Poemas da Estrangeira




«A Saudade, que nos mostra a Ausência dolorosa, cria a Presença radiosa... Mostra-nos o vácuo infinito, para o povoar de infinitas almas.»
Teixeira de Pascoaes

O Homem é Filho de sua Filha Ideia.
Para que haja o Filho é necessário que haja o Pai,
mas para que haja o Pai é necessário outro Pai:
que o Pai seja Filho de seu Filho.
Que todo o Homem seja Pai e Filho em simultâneo,
pelo Espírito Santo,
pelo Espelho da Alma do Amor,
pela Estrela d'Alva do Sol.

terça-feira, 21 de abril de 2009

Na Volta que a Serpente de Fogo Dá...

A Lei da Vida cria-Se a Si mesma, pelo Amor que (se) Ama, que (se) Nutre. Que (para) sempre d(ar)á à luz a vida, à custa de a ir tirando:ardendo.

O Amor-Sangue redimido do Corpo de Jesus
renascerá como Leite de Tétis, da Mãe-Terra:
Sangue Espiritual do Novo Homem - Icor:
pela Aliança Eterna do Homem consigo próprio
na Viva Poesia da Língua Portuguesa.

Tal como o Som se cria Luz, assim o Sangue se criará Leite:
Sangue de Luz.



... para chegar ao Seu L-ug-ar: a Vera Lusitânia.
À Terra da Luz do Céu igualada à Luz do Mar da Terra:do Sangue do Homem.
À Ilha de São Vicente.

domingo, 19 de abril de 2009

Na Livre Vida só há a Palavra de Luz

«Estás preso dentro da luz»
Carlos Nejar, A Idade da Noite

«O Espírito vive, mas amarrado à palavra, à cruz.»
Teixeira de Pascoaes, O Homem Universal

Nostradamus

As páginas do Livro da Vida estão vazias.
Pois as suas palavras somos nós.
O único Livro da Vida é a própria Vida: Livre.

Todo o Ato de Vida é Mudo.
O Som-Palavra é o caminho que o Ser toma para se conceber:conhecer. Mas o seu Fim só pode ser o seu Princípio: o Ser que (se) fala: o Coração do Silêncio. Quando o Homem reconhecer que o Lugar da Palavra é sempre o Silêncio: a Luz do seu Olhar, permitirá o regresso à sua Origem. Então, a Grande Mudança se dará, quando a Música do Mundo voltar a ser dançada de acordo com a sua natureza: Muda. Quando o Homem de novo se Vir na Palavra-Luz do Sol Amado: Vivo!... E o Amor em Pessoa terá vindo.

A-té-Deus.

sábado, 18 de abril de 2009

Pela Nau da Palavra, a Terra da Alma II

As palavras servem pa-ra-lavrar a dura terra muda, para abrir sulcos... para navegar através do tenebroso mar de silêncio da vida. A Palavra é a nau, e como a Palavra é criada pelo silencioso corpo: a nau é o próprio mar.

Pois, «há só o mar» [Fernando Pessoa, Mensagem].
E «(...) todos nós somos ceguinhos a cantar o que não vemos.»
Teixeira de Pascoaes, Ensaios de Exegese Literária e Vária Escrita

O Homem não vê palavras, porque Ver é Amar, e as palavras não podem ser Amadas senão encarnadas - na Vida.
A função principal da Leitura é recordar ao Homem a Beleza de ouvir com o olhar, de escutar a Vida: de Ver.

«Ver é ouvir em luz»
Teixeira de Pascoaes, O Homem Universal

«Cantar não basta:
é preciso plantar
a voz nas raízes,
levantar a liberdade.

Onde o Brasil?

Alguma ave oculta
em suas penas
de escuridão?

Há um Brasil
que às vezes calo
junto ao peito represado.

Um outro
que jamais digo
e às vezes não
distingo
do que falo.

O Brasil vai acordando
com a luz.

Tudo é futuro.»
Carlos Nejar, Vozes do Brasil

(Música Açoreana no Dia de Antero)

sexta-feira, 17 de abril de 2009

Amar é Saber : Ser

«a luz do sol vale mais do que os pensamentos
[do que os sons - Alberto Caeiro]

Esse, será o núcleo do testemunho do sensacionismo e daquele que se apresenta como o Descobridor da Natureza, o Argonauta das sensações verdadeiras. Porque será o seu imediatismo, o que concederá ao homem, como poeta, a abolição da distância interposta entre ele e o real, como verdadeira terra-de-ninguém, ou terra queimada, possibilitando-lhe de novo construir com ele a perfeita união cognitiva e vivencial, que foi a de antes da queda na história.
E como saber experimental, em si trazendo toda a marca da tradição portuguesa, como saber de salvação:
(...)
Amar é pensar.

Assim, todo o acto de conhecer, pagão ou paradisíaco e celeste, se transmutará em amor. E ainda aqui, esta evolução, perfeita por Pessoa, se integrará o mais profundamente na tradição portuguesa, a mais específica e remota, a que entre todas as faculdades do homem, concede lugar central e proeminente, à do sentimento como amor, e vendo-a como faculdade cognitiva por excelência: o coração sendo o órgão do conhecimento e como o vero centro do homem.

Somente assim agora, será de novo possível, a inserção do homem na totalidade da sua pessoa, numa concepção de saber: nessa totalidade indivisa de novo conquistada. E não mais unicamente como medida de todas as coisas: modelo de toda a realidade: antropomorfizada. Tal como ela foi no humanismo clássico desta corrente ocidental. Mas, numa outra perspectiva, num mundo à medida do divino, ela será aí o espelho necessário da sua reflexão, o instrumento privilegiado da sua revelação, da subida à luz daquilo que nele existia de não-manifestado, latente no seu seio - como nova epifania.

A partir de então, nesse saber finalmente «orientalizado» [para a Origem], o conhecimento interessará de novo o homem, pois que na sua totalidade de seu ser indiviso, ele será de novo, não unicamente teórico, mas conhecimento de salvação.
Porque nele o Ser, aquele a que o homem tem de fazer face, assumir na sua existência, «substância das coisas eternas», será também o Deus do amor, do qual o conhecimento o levará à beatitude. A alma humana será de novo caracterizada pelo seu poder de conhecimento. (...)
Então nessa forma nova, ou renovada, de conhecimento, sujeito e objecto serão indescerníveis - numa final intuição para além do conhecimento racional, que divide, distancia os dois.

O acto de conhecimento e de criação é um acto de amor. Fechando assim um círculo único - o da eternidade.

Numa transmutação última, onde tudo é consumido por esse fogo purificador, o «amor Dei intellectualis» [de Espinosa].

Sentir como quem olha
Pensar como quem anda
»
Dalila Pereira da Costa, A Nova Atlântida

Ninguém sabe o que é saber, somente saber: como ninguém sabe o que é viver, somente viver.
Mas quando se sabe que se Ama (se sabe Amar), que mais importa saber?

Quando se Ama o que se sabe, É-se o que se sabe:
e ninguém precisa de saber ser, pois Ser é já Saber...
Ahh... como Amar é Saber!

Pode-se saber que se Ama, mas não saber que se sabe (fora do Amor). Pois o Amor é que é o saber que pode ser sabido, é que pode ser Amado, isto é, encarnado, vivido. É o Amor que vive além de Si, que se recria a Si próprio, que está acima de tudo, e de(o) nada: só o Amor se pode conhecer a Si mesmo.

A Vera Filosofia não é tão-só amor ao saber, é o Amor-Saber.

O Oriente da Alma

Homenagem ao Nosso Poeta do Arquipélago dos Amores,
que Amanhã e (para) Sempre celebrará o seu Nascimento.

«A contemplação inerte não pode ser o ar que o espírito do homem pede para respirar! O ar da vida é outro... A vida! no seu voo para o céu, na sua sublime ambição ideal, foi isso que esqueceu ao Cristianismo - a terra, a vida.

VII
Viver! ser homem! Que mais alta ambição pode um coração conceber?
Círculo de ilimitado desejo que abraça a terra, o horizonte até onde o olhar se perde, o espaço até onde se some a fantasia!
São as esperanças do céu e os cuidados da terra. Os ardentes amores do mundo, e as vagas aspirações de além túmulo. O finito deste momento que se sente, e o infinito da duração que se adivinha. O que as Religiões da Natureza podem dar à vida de calor e força, e o que podem inspirar de lânguido e místico as Religiões do Espírito. É pensar, crer, pressentir e amar! Erguer-se para cima, sem por isso desprezar o palmo de terra aonde se firmam os pés. Inclinar a cabeça sobre o brando regaço da realidade, sem esquecer o áspero caminho do ideal por onde tem de se seguir. Aonde há aí lei, religião, código que contenha no abraço ambicioso maior porção de verdade, da vida universal? A certeza do roteiro, que, para guiar-nos, nos dão esses pilotos de mares encobertos some-se, esvai-se na orla do horizonte que abrangem com os olhos. Para lá é o desconhecido; o oceano do possível - e os caminhos estão todos por abrir!
Uma bússola só, por fatídico condão, aponta o Norte e o Sul. Mas não é a civilização dum ou outro século, a tradição desta ou daquela raça, o absoluto que uns sonham para que outros acordem em face do nada - um código ou uma religião -. É o secreto instinto da vida! a revelação natural! a voz da lei humana!

(...) como se explica o próprio facto do movimento, que deste modo está em toda a parte sem estar em parte alguma? que é por toda a parte efeito, sem ter causa em parte alguma? como se concebe esse modo de ser, que, não tendo autonomia em nenhum dos pontos onde se realiza e realizando-se universalmente, parece ser e não ser ao mesmo tempo?

A causa do fenómeno está na mesma natureza do ser onde ele se dá, ou antes, do qual ele é essencial modalidade. "No fundo, a verdadeira causa dos fenómenos reside no ser dos mesmos fenómenos, cujo fim último é a afirmação plena de si mesmo." (Comentário de Leonel Ribeiro dos Santos)
(...) na espontaneidade inconsciente da matéria está a raiz do que na consciência e na razão se chama verdadeiramente liberdade.»
Antero de Quental, Filosofia

«Se há só seres, como existe o bem, a harmonia e a beleza?
(...) O Absoluto e o Relativo não são opostos irreconciliáveis como o não são a Razão e a Realidade; mas encontram-se na Experiência, como, e igualmente, na Memória se encontra o idêntico e o diverso, o subsistente e o transitório.»
Leonardo Coimbra, O Pensamento Filosófico de Antero de Quental

«As religiões antigas não faziam da alma humana prisioneira dum dogma imutável. Sentiam ser ela mesma o verdadeiro dogma. Abriam o seio a cada palavra inspirada e transformavam-na em sangue do coração...»
Antero de Quental, Prosas da Época de Coimbra

«Deixemo-nos de nénias - enterremos
As antigas paixões!
É d'ar puro e de luz que nós vivemos...
E nossos corações
De luminoso amor, d'amor contente,
Disso querem viver eternamente!

Viver de flores, como insecto alado...
E, como ave, de cantos
Viver de beijos, de prazer sagrado..
Sim, de prazeres santos,
Como homem que embala noite e dia
O fecundo regaço da alegria!

Serena fonte, que nos banha a vida
Em dulcíssimas águas:
E, através da existência dolorida,
Nos lava as velhas mágoas...
A alma parece nova: e limpa e bela,
Brilha em face de Deus, como uma estrela!

Brilha em face do mundo! Resplandece
Como lúcida aurora!
É o sol da ventura, que alvorece!
Vale e monte colora
Co'as mil cores do íris da bonança...
E as mil do íris d'alma - a esperança!

Amor que espera e crê... amor ditoso...
Quer Deus que se ame assim!
Dormir no mundo o sono mavioso
De prazeres sem fim...
Passar como em triunfo, em mago enleio,
Mãos unidas e seio contra seio...

Põe teus olhos nos meus, para que veja
Luz melhor que a do céu...
O que dentro em teu peito rumoreja
Tudo, é tudo meu!
Meus são teus ais e minha essa harmonia
A que chamas amor, e eu poesia.

Poesia não são lágrimas... são beijos...
E abraços também...
Paixões não são suspiros... são desejos...
Quantos a vida tem!
Compõe com tuas mãos minha poesia
De paixão e de beijos e alegria.

Vem comigo na vida! Hei-de levar-te
Por caminhos de flores...
Cantará para ti, por toda a parte,
Um viveiro d'amores...
Eu sei o que é amor! estes conselhos
Amor tos dá - deixa falar os velhos!

Deixa, deixa-os dizer, os velhos sábios,
Que só sabem chorar!
Mulher bela, se Deus te pôs nos lábios
Botão de flor sem par,
Flor de luz e ventura... é por que o riso
A abra e transforme em flor do Paraíso!»
Antero de Quental, Primaveras Românticas

«Mete-se a mão no coração e fala-se - são palavras de vida as que assim se proferem. Que importa a tradição, o caminho trilhado, a ordem velha? Longe, nas últimas brumas, se perdem as extremas orlas do antigo continente. Incerto crepúsculo! e nenhuma carta diz o rumo que indicam as estranhas constelações desse hemisfério, pela vez primeira avistadas! Mas, lá para o Oriente, vê-se um brilho pálido no céu, como reflexo de luzes à distância. Para lá se inclina a alma. Para esse lado, o lado da luz, há (...) um novo mundo a descobrir!»
Antero de Quental, Prosas da Época de Coimbra

Terra do Sempre II

Porque ficou a faltar isto:

Terra do Sempre

A Morte e o Amor, os dois lados de uma só face: a Nossa;
a Ausência e a Ausência da Ausência, a Presença.
Ahh!, o Possível é, pois, o Impossível do Impossível...
ou o extremo do Impossível.
Como não Desejar alcançar a Terra do Nunca?,
se aqui, onde vivemos, é já a Terra do Nunca do Nunca,
e só por isso nela andamos.
Mas não, eu só quero a Terra do Sempre. Sem-pré.
É lá que mora o meu Coração Independente da Morte: de Si.
Eterno vagabundo, vag(ue)ando pelas ondas do Amor sem fim.

O Amor Real é o que se sente imortal, pois só assim se pode unir à Morte (que o precede): existir.
Só a Morte pode ser Amada, só assim o amador se transforma na amada.
O Amor Ama, a Morte é Amada. A Morte Ama o Amor, matando-O...
O Amor, espelho da Morte, mata a Morte: torna-a Imortal.
É Amando para lá do Amor - em Amor Absoluto, que a Morte é Amada para lá da Morte: que a Morte mata sem matar.

À falta de um Amor de(a) Morte que nos ligue, restou-nos nas mãos esta morte do Amor...

«Nas praças, nos templos e olivais
um grito de louvor à Terra, dançai!

Vim sem o esplendor da aurora, mendiga,
não como as musas de outrora, dadivosas Diotimas,
vim mendigar o que há muito vos ofertei, Poetas:
sopro-vos à garganta dilatada, vossos olhos ceguei
para que o fundo olhar se liberte. Sibila em agonia,
há tanto silenciada, falarei por vossas bocas,
em vossos versos arquejará minha voz embriagada, rouca -
sustos e soluços, gritos, silvos, neblinas de esgares,
mares de canto e pranto. No tempo além do tempo
meus lábios murmuram por ti e perto dos templos derruidos,
a respiração do velho Mar, seus haustos e gemidos.

Mostra-me o silêncio o lacre escarlate, verbo indigente
dos mitos que sempre me uniram às setas de Apolo.
Há tanto minha palavra foi calada, os deuses recuavam...
Mas os poetas mantiveram-me viva. O mais ínfimo
deu-me de beber e em sua hídria refresquei meu rosto.
Sensíveis a meu sopro, os maiores coroaram-me de folhas verdes.
O nascimento do Poema é o silvo que Apolo harmoniza e Orfeu faz cantar.
Rompendo as cisternas escuras eu vim, raiz coleante
por entre as pedras e a secura. Dilacerada, arquejante,
acolhe-me Apolo em seus braços de névoa.
Gemidos rasgam mil caminhos na gruta: Ai, ai, oh...
A Sibila arrasta-se no pó, soluça, seus lábios deliram,
traça no ar os gestos incertos dos agonizantes, colhe flores
na neblina. Ai, ai, oh... Foram-se os deuses da Grécia,
só espelhos reflectem espelhos, o eterno assim se dá e esconde.

Onde Afrodite, a de róseos tornozelos, ungida de óleo incorruptível,
com seus perfumes, colares e pulseiras cintilantes?
Onde Ártemis, a de doçura selvagem? Foram-se as ninfas
e hamadríades! Nunca mais a vida estuante dos bosques,
suas flores e clareiras, onde Zeus e Hera adormeciam ao calor do dia.

Ai, ai, neblina, o que enlaçarão agora nossos braços?
Não mais que névoa e vento. Apolo, assim te afastas, e me deixas presa
à teia indecifrável destes sons selvagens? Aaa Oooo...
Em teu ombro dourado me apoiava, inventando poemas que ditavas
a meu secreto entendimento. Infeliz de mim! Agora
só posso tocar névoa e memória. Dissiparam-se Mundo e Palavra.

A Sibila chorou.

Nesse momento as coisas cessam, silenciosas,
atemorizadas. Os ventos param de soprar,
nas árvores as folhas não se movem.
Os rios adormecem e o gigantesco Mar
é liso e sem ondas. Paira sobre tudo um
SANTO SACRO SILÊNCIO

Perde-se na neblina a medida do Tempo,
tudo se abisma no silêncio, à espera
do alto Deus, meta dos séculos.

A Sibila abre os grandes olhos
e vê o Deus que nasce.

A Mãe, junto ao Menino, parece uma vinha
e enquanto a Lua surge, clara, ela adora
o Filho em seus braços. De ouro vivo é a Criança
e em resplendores toda a gruta se ilumina.
Luz nascida como o orvalho descendo do Céu à Terra
e em torno, suavíssimo aroma.
Anjos perpassam, alígeras borboletas
e cantam: Amém.

A Sibila sorri.

Um cântico novo brota em seus lábios, mas não é seu,
o infinito o modulou:

O aroma de teus perfumes é delicado
e teu nome, óleo que se derrama.
Serás novo júbilo e alegria...
Não repares em minha tez morena, que o sol queimou.
Irados, meus irmãos fizeram-me guardar as vinhas,
eu, esquecida da Vinha!

Ouço a voz do meu Amado batendo à porta
Lentos são meus pés e ao abrir a porta
o Amado já se foi. Corre minha alma
e o busca por toda a parte. Não respondes, Amor,
ao meu chamado?

Eu vos suplico, filhas de Jerusalém,
se o encontrardes
dizei-lhe que estou doente de amor.

O que tem ele - elas perguntam -
o que tem o teu Amado mais do que os outros
para que assim o busques, quase morta?

Meu Amado é róseo e brilhante,
meu Amado vermelho. Sua cabeça é de ouro puro,
seus cachos, negro-azulados.
Seus olhos são duas rolas
perto de um lento riacho.
Destila mirra
o lírio de seus lábios.
Sei que habita um jardim,
companheiros ouvem sua voz...
Oh, faze que eu também te escute!

Quem é essa que vem do deserto
como um cântaro apoiado a um peito amoroso?
Ele é um selo sobre seu coração,
sobre seu braço moreno,
pois o Amor é forte como a Morte,
seus centelhas são de fogo:
uma chama divina!

Dissipa-se na névoa um rosto efêmero,
mas a face do Amado permanece.»
Dora Ferreira da Silva, Poesia Reunida

Portugal está Vivo!...
Pois É a - Vera - Vida!




«Só na reflexão do espelho da água, ou do tempo que passa, se duplica e vem mostrar a eternidade: o céu se reflecte na terra.»
Dalila Pereira da Costa, Introdução à Saudade

quinta-feira, 16 de abril de 2009

Idade da Águia

Ao Julio, um seu conterrâneo:

«"A águia pelo tempo sendo achada, no cimo do invisível vai entrar."

As palavras são mãos que aprenderam a ver.

Na luz o tempo acaba.

(...) os rios que correm aquém da infância, nada têm com os outros. Sob um eixo maior se movem. Como plantas em órbitas junto à foz do sol. As ondas, de grandes olhos, brincam de ser rio.

Tinhas na ponta da língua: amor, ias falando com a didática da luz. E atalhou Laor, com as feições de um albatroz desajeitado sobre a trancosa oliveira:
- Aqui tudo convive e essa é a língua que te ensino, aprendendo a respirar. E falas o que assopra o paraíso.

E a(l)mou.

(...) a alma (...) lia o céu em letras de vento.

A ilha era a alma.

E amor é a fala do paraíso.»
Carlos Nejar, A Idade da Aurora