A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
Sede Editorial: Zéfiro - Edições e Actividades Culturais, Apartado 21 (2711-953 Sintra). 
Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

Donde vimos, para onde vamos...
Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

Onde temos ido: Mapiáguio (locais de lançamentos da NOVA ÁGUIA)

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quinta-feira, 28 de agosto de 2008

A paragem do Corvo




Na rota das caravelas e dos galeões que iam e vinham das Colônias Americanas e das Índias, carregados de prata, ouro, especiarias e mercadorias do velho mundo, ficava o local conhecido pelos navegantes e piratas como a “Paragem do Corvo”. Rochedo íngreme, emergido abruptamente no Atlântico Norte, onde as correntezas marinhas e os Ventos do Ocidente geram uma mudança de direção das águas, ao largo, para a Terceira e Continente, assinalado nos portulanos do século XIV, era ponto de aguada e refresco para aqueles que ficavam no mar por muitos meses na arte da pesca e da cabotagem e, para os piratas, área de espreita para pilhagem das ricas presas. A Ilha do Corvo, a mais ocidental e longínqua do arquipélago açoriano, pelas dificuldades de acesso e sobrevivência foi, nos primeiros séculos de ocupação, quase esquecida e marginalizada pelo reino. A dificuldade de acesso, a pobreza e escassez do solo, os impostos desmedidos dos donatários e da Coroa, os caprichos da natureza, a falta de defesa eficiente, fizeram destes ilhéus homens que se adaptaram às circunstâncias, que não se importavam muito com as retardadas ou madrastas decisões do governo. Quando não podiam se proteger ou estavam em desvantagem, barganhavam com inimigo, e quando não tinham o que comer, emigravam com ou sem a permissão das autoridades, geralmente como clandestinos, nos barcos que ali aportavam. Naqueles primeiros tempos, a vida corria envolta em mistério, povoada de lendas, naufrágios e encontros com piratas. O que não chegava pela via legal, a do governo, chegava pela ilegal, com o comercio com a pirataria e a recolha dos destroços das embarcações sinistradas. Nas invasões da ilha, quando não se tinha lugar para esconder ou nada para oferecer, o medo era ser morto ou seqüestrado pelos mafomas, para depois ser vendido no mercado do oriente como escravo, ou para ser resgatado pelos reis cristãos, quando para isso se tinha dinheiro. O recurso foi, como disse Drummond: “ser um pigmeu nas muralhas de Tiro”, procurar inverter a situação. Fazer como se fazia nas costas das ilhas da Bretanha francesa ou na Cornualha inglesa, na escuridão da noite acender tochas nas regiões costeiras, atrair o inimigo para o desconhecido... O mar, às vezes tão traiçoeiro, era quase sempre um aliado. Para se chegar ao porto das Casas era preciso conhecer aquelas águas para não ser tragado. Na fúria das tempestades, quando poderosas ondas escuras se levantavam em altas e ameaçadoras muralhas de espuma e, raivosamente, se atiravam contra as rochas num ruído ensurdecedor e profundo, barcos eram arremessados contra a costa, espalhando as cargas preciosas, engolindo com avidez gentes e cascos. Mais tarde, depois que tudo amainava, vinha a clamaria. Um imenso espelho turquesa se dilatava e, como dádiva, oferecia os restos do seu banquete, àqueles ilhéus que, assustados, os aproveitavam. Com a madeira recolhida casas se levantavam, mobília se completava. Gêneros e utensílios enriqueciam os desprovidos lares ilhéus. Era a pilhagem da desgraça alheia, feita sem culpa. Era a oferta do mar aos cativos do rochedo. Conta-se que, dentre os não poucos naufrágios que ali ocorreram, em dezembro de 1770, uma nau vinda do México, afundou na costa da ilha com cerca de 200 pessoas a bordo e uma grande caixa de ferro, repleta de ouro e pedras preciosas. Os habitantes chamaram o barco de: “A nau dos Quintos”. Em 1654, também nestas águas corvinas, naufragou o galeão português, vindo do Maranhão, com o padre Antonio Vieira e outros passageiros. Salvou-os um navio pirata, que rondava pela paragem. Deixou-os em outra ilha, a da Graciosa, para que seguissem viagem. Acontecimentos fantásticos de desespero, loucura e antropofagia em alto mar, desaparecimento de tripulações, revoltas e batalhas, ficaram esquecidos na história do Corvo, quando os piratas e os corsários de antigamente se foram com o tempo.


Maria Eduarda Fagundes

Uberaba, 27/08/08

sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Corona Fulgens (II)


- Olhem o mar, disse o velho, mas olhem com olhos marinheiros já que é de Portugal que falo quando vos digo olhem o mar ("Georges!", não é? "Georges! Anda ver meu país de marinheiros / o meu país das naus..."). Às vezes esquecemos, tantas vezes vem o engano: de engano e de esquecimento parece que o mundo se fez, mas marinheiros não têm tempo para se enganar: olhem com olhos marinheiros para o mar que Portugal cumpriu.

- O mar, disse o estudante de azul, então também tu falas do mar; e também eu tantas vezes mas tantas vezes estou na falésia ou na duna ou na praia a olhar, a perder-me. Imensidão, encantamento líquido do mar. É esta a alma dos Portugueses.

- "O mar sem fim é português", disse o estudante de verde, e lembrou-se de outros versos do Pessoa e disse baixinho: Portugal é feito de mar.

- Nada disso, disse o velho, e essa é a armadilha maior: cautela com o mar, é o que o marinheiro vos diz. O marinheiro não ficava na falésia ou na duna, à praia só iam as viúvas e as noivas com os corações rasgados: "máraios partam o mar!" Portugal foi o domador do mar, e o mar era o Adversário. O Pessoa disse Deus ao mar o abismo deu, mas devias saber que ele às vezes diz a verdade e às vezes o seu exactíssimo contrário... Deus o mar ao Abismo deu.

- Estás velho e já não queres sonhar, disse o estudante de azul, e o estudante de verde disse isso que dizes, como pode ser? Não somos nós a bruma, a névoa atlântica de não ter fim? Não é essa a fonte e a consumação?

- Somos sim, disse o velho e disse: somos a névoa e a bruma mas isso é porque estamos ainda sem nada ser. Não te lembras? "Pescador da barca bela / inda é tempo, foge dela / foge dela / Oh! Pescador!" Encantamento da sereia, podridão da Atlântida, sofreguidão abissal de Sirius, são estas as histórias do mar, é isto o que nos prendeu. Povos do império do mar, é isto o que nos quer desde sempre barrar. Olhem o mar com olhos de marinheiro: o barco. Olhem o corvo santo que o leme conduz. Olhem Sagres, promontorium sacrum: sagrada a terra que fere o mar.

- Confundes-me, disse o estudante de verde, e o estudante de azul disse: Perturbas-me.

- Sim, disse o velho, e sorriu: abro-vos os olhos para a serpente do mar. No timbre de Portugal a Serpe Alada: e o mundo não sabe de batalha maior.

terça-feira, 29 de julho de 2008

Naufrágio

In "The Wet Side of the Moon"

Um bodião curioso veio observar-me, olhou-me atentamente de cima a baixo. Fiquei a observá-lo também, admirando o seu corpo listado e a graciosidade dos seus movimentos.

Ele cumprimentou-me e fez-me sinal para o seguir. Perguntei-lhe onde me levava e ele foi respondendo para eu ter calma. Ali debaixo de água a pressa e o stress não

tinham lugar. Aconselhou-me a gozar a viagem, a observar a beleza que o Oceano tem para oferecer a quem se dá ao prazer de contemplar.

Concordei em absoluto, fui olhando para a paisagem e vislumbrei a beleza frágil de uma gorgónia, ondeando os braços na corrente, sem pressas vai recolhendo aquilo que a corrente lhe trás, vai crescendo à medida que as gerações se sucedem, ganhando cores e complexidades cada vez mais belas.
Continuamos
a descer, sinto-me invadido por uma paz serena, mas há algo mais. À medida que o computador vai indicando uma profundidade maior, vai aumentando uma sensação de melancolia, penso que se trata do aumento da pressão e da diminuição da temperatura e da luz. Mas não é só isso.

De facto já tinha mergulhado mais fundo e nunca me tinha sentido assim, de repente vejo uma forma. Pergunto o que é ao bodião, este responde-me que não sabe ao certo, mas que é algo que veio do meu mundo.
Aproximo-me e confirmo que aquelas formas só podem ter sido produzidas pela mão do homem, parece uma ancora. Sim, talvez seja uma ancora, mas lá atrás vejo superfícies planas, demasiado planas.

Chegamos ao River Gurara, diz-me o bodião.

É isso estou num naufrágio.


De repente vejo uma sombra na balustrada, sinto um arrepio e presto uma singela homenagem aos que

ali pereceram, por todo o lado sente-se angustia, bravura, terror, valentia, desespero e resignação. Um peso enorme faz-se sentir sobre os meus ombros.

Os fantasmas ainda lá estão, presos entre os corais e o metal, ainda se ouvem os seus gritos, ainda se sente a sua presença, ainda se vêem as suas sombras.

Não há nada de mais profundo que mergulhar num naufrágio, mais do que em outra qualquer catástrofe aqui os sentimentos ficam mais incrustados como se fossem fantasmas, testemunhos indeléveis da angustia e bravura, da morte e salvação.


Não naufraguem no Lado Escuro da Lua!

segunda-feira, 23 de junho de 2008

O PIRATA

No Cais do Tejo (o Aterro em 1881), Alfredo Keil, 1881



Longe, onde o rio encontra o mar,
Sentei-me hoje, sob o sol poente,
Com um sorriso infantil e crente,
A ouvir lendas de um lobo do mar.

Mais do que os quadros emocionantes
Que com as suas palavras descrevia,
Eram outras, mil histórias que eu ouvia
Nas suas rugas e nos olhos cintilantes...

Agora está velho. Os barcos partem sem ele.
Mas mantém dignamente o ar altivo e forte,
Duma proa a desafiar as águas, a sorte.

E quando, alto, as vagas se fizeram ouvir,
Foi entre soluços que conseguiu falar:
«Ouves o mar? Está a chamar-me...»

sábado, 21 de junho de 2008

NOSTRUM

Sunset... Simplicity... por Bruno Dias

Rebenta a espuma pelos corpos nos calhaus deixados, despoletam essências de caminhantes sentidos. Estende-se mais um corpo na praia. De pés voltados para o início do infinito.

Que afunda. Vai Volta Leva. Afunda o corpo que em ti ruma. Salga a pele de lágrimas que em ti se prostra.

No horizonte longitudinal, um abismo de corpos que se dão, deram, darão. No horizonte uma mancha empapada. Podre. Dão-se os corpos à espuma que se abate na pele do tempo. Dão-se os corpos vorazes de vida. Paralogismo brilhante da sina. Dão-se os corpos vagos de essência. Olhos baços de espadas manchadas, que ao passar no cimo das cápsulas povoaram as costas das praias talhadas.

De essências libertas murmurantes, foram ocupadas as raízes vinculadas na origem. Um e outro, apenas mais um pouco, rebento, ramagem, folhagem. E no fim a pedra. Em círculo natural perfeito de água que isola, aprisiona e sufoca. Ama-seca de essências encontradas na encruzilhada do pensamento. Volta a flor ao centro circular em cinco pétalas deixadas: Norte, Sul, Este, Oeste e no centro: Esperança. Mais um corpo que ao calcar os calhaus se deita.



Foto in http://masterdarkness.deviantart.com

DOIS POEMAS – UMA HOMENAGEM *


Painel de azulejos do Palácio Galveias (Câmara Municipal de Lisboa)



QUE TEM GOA, QUE MAGOA


Que tem Goa, que magoa
meu coração português?...
(– Índia sonhada em Lisboa,
diz-me segredos de Goa,
diz-mos baixinho de vez...)

Que tem Goa, que destoa
do mundo que à volta sei?...
(– Índia das noites à toa,
canta-me a voz do Pessoa,
conta-me a volta do Rei...)

Que tem Goa, qu'inda ecoa
nas águas mortas do mar?
(– Índia, vem... moro em Lisboa...
deixei meus barcos em Goa,
preciso de navegar...)



MARINHEIRO DO MAR MORTO


– Marinheiro do mar morto,
porque andas a navegar?
– Nasci num barco sem porto,
quero só morrer no mar.

– Marinheiro do mar alto,
fazes-me falta no mar...
– Já não sou eu que te falto,
falta-te só embarcar.

– Marinheiro do mar fundo,
ensina-me a ser assim...
– Quando a morte for teu mundo
é que hás-de chegar a mim.


Casimiro Ceivães (1912-1931)



* Em homenagem ao nosso Confrade, Casimiro Ceivães, dois poemas do seu tio-avô.

domingo, 25 de maio de 2008

BRASIL, POR PÊRO VAZ DE CAMINHA




As naus aproadas, Senhor, tive medo,
O meu coração, as minhas mãos, a alma
Tremiam-me, a minha coragem é a da pena
Não a das armas e do cordame. Um longe,
Primeiro, acima das vagas, e depois
Todas as maravilhas do mundo, o verde
Puro e alto, com o azul celeste, aberto,
Confundidos no calvário infernal do ar e
Aves, ou anjos, de amarelo forte alucinado
No assombro da visão rasgada. Toda a sede,
Toda a fome, toda a dor, se nos calou,
Senhor, naquele instante. Os batéis
Descidos à pressa, calma, homens mais
Não somos, chegados suplicantes, cristos
De carne e sal, vindos do sem pátria
Do terror das águas, a benção do fogo
Sobre nós caía, luz tanta, que do néscio
Nascia eloquência e virtude e levados
Fomos ao paraíso terreno, ao mais santo
Dos chãos. Desta praia, o que Vos damos,
Majestade, do penhor sereis Vós o reino,
O que Deus conservou só podem os reis
Servir, os homens amar, o engenho e a pena
Defender. Em boa razão Vos digo, Meu Rey,
Escrevo estas palavras no imo do eterno e
Do império da morte foi minhalma salva.
Se meus olhos a essa luz nossa, nem à terra
Regressarem, fui de Portugal filho, longe
Posso morrer, que o amor me é mortalha.


Lord of Erewhon,
aos 25 de Maio de 2008 deste Reino de Portugal