A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
Sede Editorial: Zéfiro - Edições e Actividades Culturais, Apartado 21 (2711-953 Sintra). 
Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

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Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

Onde temos ido: Mapiáguio (locais de lançamentos da NOVA ÁGUIA)

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sábado, 6 de setembro de 2008

O Nada que é Tudo


Crente é pouco sê-te Deus
E para o nada que é tudo
Inventa caminhos teus.

Se Ele é o que dizes
Ele nada pode ser
E se nada, livre está
Para ser o que quiser.
...
Se Deus quisesse ocupar
Lugar a si mesmo igual
Preenchia todo o nada
E o deixava tal e qual.
...
Do que é o Espírito Santo
Só diga quem ficar mudo
Que palavra há que me leve
Áquele nada que é tudo.
...
Oxalá por saber tanto
Me apeteça ficar mudo
Só então vendo sem ver
Aquele nada que é tudo.

Agostinho da Silva


Este "nada que é tudo" de que nos fala o mestre Agostinho, falando a partir das bordas do abismo do Mito, essa sobre-excessiva mudez que nada tem que ver com mutismo, não é um vacuum, um vazio, um apelo à nadificação e à abdicação.
Falou-se já muito aqui em religião, em adeptos, neófitos e coisas assim. Ora, adoptar uma perspectiva religiosa não vai contra a liberdade de expressão. Talvez certos secretismos vão. E a liberdade de expressão não pode ir contra a liberdade religiosa, nem vejo como o Mil possa estar contra isto.
Mas é verdade que o Mestre Agostinho nos diz para sermos contagiosos. Mas eu tenho muita dificuldade em defender isto, porque não quero que ninguém se contagie com o eu ser eu. É uma doença tramada. Assim que me levanto de manhã, vejo-me ao espelho e, caramba!, sou eu!
Ora, eu não preciso de pedir autorização a ninguém para ser eu. Nem eu tenho que me autorizar a ser eu. Posso fingir que não sou eu, mas tratar-se-ia dum fingimento meu.
E os pensamentos vêm-me de algum lado. E o eu agarra-os, como o Kant já se tinha dado conta na Crítica da Razão Pura: a unidade da apercepção agarra os dados fenoménicos e faz com eles um mundo, com a ajuda de todo um instrumentário complicadíssimo que, ao que parece, funcionaria mesmo sem que nós soubéssemos da sua existência.
Mas, no meio disto tudo, não quero um machado, seja ele qual for, a dar-me cabo das engrenagens transcendentais. E do que delas possa ser regurgitado.
E gosto da ideia de Agostinho da Silva segundo a qual cada homem é Deus a ser homem. O que significa que cada homem pode superar-se. Não há mal nenhum nisso. Não é a mesma coisa que a Aufhebung hegeliana, é algo de mais radical. E envolve tudo aquilo que historicamente somos. E, também o que não somos, não fomos e poderemos, ou não, vir a ser. Há uma meta-história, talvez infra e supra histórica. É daí que emergem os mitos. E os mitos são imbuídos de forças de superação, de energias demiúrgicas, capazes de levar à transcensão do que, sendo finito por ser o infinito em acto, sempre pontual e pontuado, pois a História é um pontilhado dinâmico, multimodal e multi-circunstancial, nunca totalmente circunscriptível, nunca está completamente determinado. Não há, contudo, um indeterminismo radical, no fundo mais fundo, mas uma inter-determinação, ela sim, verdadeiramente adunadora de sentidos e de complementaridades, sicronias, discronias, no fundo, o jogo, sempre
caótico, da Physis.
Isto por vezes custa a meter-se-nos na
pinha.
É
natural. Mas há milénios que a coisa marcha, ora duma forma, ora doutra. Muitos dos que defenderam estas ideias foram acalentados pelas fogueiras inquisitoriais. Cavaleiro de Oliveira, recordo aqui a lição de Sampaio Bruno, ardeu em efígie e queixou-se que, no mesmíssimo dia, tiritava de frio na soturna Londres tão afastada no clima, e nos costumes, da sua tão amada Lisboa.
A mesma Lisboa que abalou a harmonia pré-estabelecida de Leibniz ao ser o palco do infausto terramoto de 1755. Aí os mitos tremeram, não só os que tinham por cá uma roupagem religiosa, ou até político-religiosa, mas também os que se erguiam na Europa a caminho do esclarecimento. É que a Razão nada pode contra a Natureza, embora esta última nunca tenha deixado desmentir a sua profunda racionalidade, razão pela qual, "Deus não joga aos dados", segundo Einstein, e o "real é racional e o racional é real", seja qual for a ordem da coisa, de acordo com a versão hegeliana do Princípio da Razão Suficiente. A Natureza participa também da demiurgia mítica. Pode é não estar de acordo com a forma como incarnamos os mitos. Mas isso é uma coisa nossa, cultural, portanto, se calhar, des-naturada, embora possa ser naturante, porque talvez esteja por pensar as formas pelas quais a Cultura se degenera em Natureza, como se pode ver nos mais recentes avanços da ciência genética. O Zoon torna-se artefacta e a Bios, a vida tal como os humanos a vivem, deixa, hoje, de ser encarada como uma poiésis, num sentido muito especial, para passar a ser, cada vez mais , uma mera repetição, uma mimésis de modelos e de formas culturais que nada têm de mítico, mesmo que lhes tenham tomado de empréstimo a aparência.
E aqui há uma lição importante, que nada tem que ver com atitudes religiosas, num texto insuspeito de Derrida: "l'animal donc je suis" (Vários Autores, L'Animal Autobiographique, galileé, Paris, 1999, pp. 251-301). Aí Derrida fala duma compaixão essencial, fundamental, que emerge do olhar do animal sobre o ser humano, o "animal auto-biográfico" exilado da sua nudez primordial, a que não deixa rastos nem rasteja, mas que no caso do homem sofre duma incompletude alienante.
Esse olhar do outro sobre o absolutamente outro que nós somos para si, que, no fundo, não tem um "si", é um olhar desarmante porque incomunicável, como todo o autêntico olhar. E o nosso rosto só a esse olhar se torna transparente, devido à sua capacidade de ir ao fundo, do que mais importa.
É absolutamente falso ligar a rapacidade humana, o egotismo desenfreado, a inveja, o medo de perder protagonismo, as razões para o ódio e para a desunião, a tendências ou instintos animais. Embora Pascoaes, Leonardo Coimbra, Agostinho da Silva e outros autores tenham razão ao afirmar que o mundo humano e a sua caractereologia formam um bestiário exuberante. Talvez seja verdade. E há aí muitas razões para nos regozijarmos, uma vez que voltamos a encarar-nos como naturais. O que já não será pouco.
Também será errado considerar que os homens, todos os homens, não têm um fundo bom. E nada há aqui de religioso. Talvez seja uma palermice minha que até nem sou muito seguidor de Rousseau. Até certo ponto.
Todos os homens são dignos de respeito e de consideração.

4 comentários:

Anónimo disse...

Gosto mais do António Aleixo.

Anónimo disse...

Isto tá a ficar giro, ainda teremos culto, conversas sobre Baphomet, confissões, possessões, anátemas, cismas, devaneios sobre os demónios-redemoinho dos desertos da Namíbia e talvez tudo termine numa orgia.

Semente disse...

Caro Paulo,

Essa fotografia é a forma que o "meu tudo" e o "meu nada" têm aos meus olhos.
Vistos por mim, Alfa e Òmega (e eu mesma de "tudo e de nada") são (somos) assim.

Não por ser belo. Mas por ser assim do jeito que é esse areal e essas rochas que foram tudo e foram nada antes dos tempo seresm o que são e ainda são o tudo e o nada depois de eu me morrer ou me renascer, qualquer dia de uma das minhas vidas.

:)

Espero um regresso "serpenteado" para breve
;)

Casimiro Ceivães disse...

Caro Paulo, novamente gostei muitissimo deste texto. Brilhante.

Porque as coisas se ligam sempre a coisas, e enquanto nos conhecemos melhor, deixe-me dizer-lhe que temo o Tudo que é Nada, e não o Nada que é Tudo... :)

Há um Nada que se assemelha àqueles buracos negros que os astrónomos encontram no espaço: uma coisa de absorver, e há um Nada que se assemelha ao Espírito Santo. De cada um deles não é fácil falar, a menos que sejamos que sejamos filósofos ou poetas; a ambos podemos imediatamente reconhecer quando os encontramos, a menos que não andemos já nos caminhos-nossos.

Deveríamos dar-lhes outros nomes?

Um abraço