- Olhem o mar, disse o velho, mas olhem com olhos marinheiros já que é de Portugal que falo quando vos digo olhem o mar ("Georges!", não é? "Georges! Anda ver meu país de marinheiros / o meu país das naus..."). Às vezes esquecemos, tantas vezes vem o engano: de engano e de esquecimento parece que o mundo se fez, mas marinheiros não têm tempo para se enganar: olhem com olhos marinheiros para o mar que Portugal cumpriu.
- O mar, disse o estudante de azul, então também tu falas do mar; e também eu tantas vezes mas tantas vezes estou na falésia ou na duna ou na praia a olhar, a perder-me. Imensidão, encantamento líquido do mar. É esta a alma dos Portugueses.
- "O mar sem fim é português", disse o estudante de verde, e lembrou-se de outros versos do Pessoa e disse baixinho: Portugal é feito de mar.
- Nada disso, disse o velho, e essa é a armadilha maior: cautela com o mar, é o que o marinheiro vos diz. O marinheiro não ficava na falésia ou na duna, à praia só iam as viúvas e as noivas com os corações rasgados: "máraios partam o mar!" Portugal foi o domador do mar, e o mar era o Adversário. O Pessoa disse Deus ao mar o abismo deu, mas devias saber que ele às vezes diz a verdade e às vezes o seu exactíssimo contrário... Deus o mar ao Abismo deu.
- Estás velho e já não queres sonhar, disse o estudante de azul, e o estudante de verde disse isso que dizes, como pode ser? Não somos nós a bruma, a névoa atlântica de não ter fim? Não é essa a fonte e a consumação?
- Somos sim, disse o velho e disse: somos a névoa e a bruma mas isso é porque estamos ainda sem nada ser. Não te lembras? "Pescador da barca bela / inda é tempo, foge dela / foge dela / Oh! Pescador!" Encantamento da sereia, podridão da Atlântida, sofreguidão abissal de Sirius, são estas as histórias do mar, é isto o que nos prendeu. Povos do império do mar, é isto o que nos quer desde sempre barrar. Olhem o mar com olhos de marinheiro: o barco. Olhem o corvo santo que o leme conduz. Olhem Sagres, promontorium sacrum: sagrada a terra que fere o mar.
- Confundes-me, disse o estudante de verde, e o estudante de azul disse: Perturbas-me.
- Sim, disse o velho, e sorriu: abro-vos os olhos para a serpente do mar. No timbre de Portugal a Serpe Alada: e o mundo não sabe de batalha maior.
6 comentários:
Olá,
Passei para desejar um bom fim de semana.
Abraço
Do que me possa ter falhado, acrescente o fidalgo Casimiro, que é mais culto do que eu.
Quanto ao mais, Nihil Obstat, nem a acrescentar, excepto:
Viva Portugal!
Um estreito abraço.
Alémmareando movimento das marés, ora calmaria, ora turbulência... é um mar intenso e profundo... às vezes parecer sereno na superfície ,eterno marinheiro..., nessa busca infinita, virando até alpinista se preciso for, só pra gritar por seu amor pelo mar!!!
Porreta tio 2dão!
Beijos.
belo.
Abraço.
"Máraios partam o mar..." :)
Dito noutra grafia está algures no Raul Brandão; mas exactamente assim o ouvia eu muitas vezes em criança às peixeiras e "banheiras" velhas de Espinho.
Agora que reli, isto parece um rally-paper para alunos do antigo Liceu :P
Enfim, inclino-me perante o Nihil Obstat. Abraço, Klatuu. E Ruela.
Biazinha, "tanta água a nos separar". Beijo
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