A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
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Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

Donde vimos, para onde vamos...
Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

Onde temos ido: Mapiáguio (locais de lançamentos da NOVA ÁGUIA)

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terça-feira, 21 de outubro de 2008

AGOSTINHO DA SILVA: UM FERNANDO PESSOA , “MENSAGEM UM” (I)

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Àqueles a quem, não querendo mal, também especialmente não amam concedem os deuses uma vida fácil e benigna, que os faz, a eles e aos restantes, acreditar em protecção celeste; aos outros, porém, àqueles cuja carreira se vê essencial aos destinos do mundo, vendem os deuses, e bem caro, todos os dons de que os cumularam; e, porventura, o preço mais alto que reclamam de sua mercadoria é o de, a cada momento realmente importante da vida, nada disporem como que de maneira fatal, deixando que o seu amado possa, em plena liberdade, escolher o que mais é de seu agrado; e aqui a maior parte se perde: porque à chama que os tornaria celestes preferem a temperada medianidade que para sempre os prende à terra.
Começa logo a escolha pela pátria. Para a grande maioria dos homens, se apresenta a pátria apenas como um acidente ou um acaso físico: são de onde nascem, e, a pouco e pouco, a convivência dos pais, de seus conterrâneos, mais tarde a escola e o Estado, os dois grandes organismos encarregados essencialmente de não deixar escapar ninguém das malhas do exército social, os vão gradual e realmente convencendo de que não poderiam ter nascido noutro lugar e de que uma escolha futura que livremente pudessem fazer representaria sempre e de qualquer modo uma diminuição ou uma traição. A outros, no entanto, e porque são amados dos deuses, se apresenta o caso de modo diferente: a vida, mostrando à superfície, como circunstância, o que é meditado e deliberado propósito de quem rege a História, os encaminha à escolha que decidirá de seus destinos: o de resplandecer num véu de glória, que é quase sempre, visto por dentro, um véu de lágrimas, ou o de ser jogado fora como um vaso de oleiro que mentiu, pela má qualidade do bairro, à diligente regularidade da roda e à inventiva agilidade do gesto. Quem pode, em raro jogo, escolher o seu país, por aí mesmo está escolhendo a sua vida: uma vida que dele mesmo se vai alimentar.
Para Fernando Pessoa, cuja existência se iria desenrolar, tanto quanto se poderia prever, no Portugal de seus tempos, isto é, no ponto mais baixo que poderia atingir a descendente curva da austera, apagada e vil tristeza, a alternativa apresentada foi a mais tentadora que se poderia imaginar: a da Inglaterra, e a de uma Inglaterra apreendida na sua história e na sua cultura. Por uma daquelas pequenas resoluções que movem depois as grandes molas, poderia Fernando Pessoa ter passado inteiramente ao domínio inglês e nele se afirmado como um homem de Império, já que o encontro se cumpria na África, ou como um homem de Universidade, já que o encontro era igualmente num ambiente à Walter Pater, com imaginários retratos de Inglaterra elisabetiana mascarando uma outra que apenas procurava colocar seus capitais e manter pela força seus mercados. Numa ou noutra carreira, teria Fernando Pessoa sido célebre: as críticas a seus poemas ingleses seriam apenas o prenúncio do que outros críticos viriam a escrever; um outro Conrad, noutro domínio, se incorporaria à literatura inglesa; apenas isso, porém.
O que, no entanto, acontecia era que iam mais alto as ambições de Pessoa e penetrava a sua inteligência mais longe do que a dos estadistas ingleses. Era o mundo mais nobre, mais humano e mais divino, do que o supunha a Inglaterra e jamais se resignaria a aceitar como permanente, apesar de todas as suas excelências sobre os outros, apesar de não ter constituição escrita, apesar de tender já a uma comunidade de nações livres, um império que, na base de tudo, mantinha as duas noções e invenções diabólicas da força e do lucro. No fim de contas, o melhor que a Inglaterra lançava sobre o universo já Portugal o fizera, muito antes dela; e Portugal, porque não era de nenhuma Igreja reformada, porque se mantivera fiel a Roma e à fraternidade católica, porque nunca fora sequaz de uma ciência que tendia apenas a dominar, de uma economia que tendia apenas a explorar e de uma política que não era outra coisa senão de origem maquiavélica, deixara aberta, apesar de suas falhas, uma esperança para o futuro: a de que o seu império do mar fora apenas o primeiro passo, por isso mesmo ainda físico e político, de uma acção que depois a Europa, incompreensiva como sempre, lhe viria cortar: a de trazer para o mundo aquele reino que milhões de homens quotidia¬namente imploram em vão.
Vai, pois, Fernando Pessoa, deliberadamente, confirmar o acaso físico: vai nascer português porque tem a convicção de que Deus não pode abandonar seu outro povo eleito e de que, passado o domínio da Europa, quando a técnica tiver esgotado todas as suas possibilidades, quando a economia protestante se verificar plenamente anti-humana, quando a centralização estatal se revelar estéril, Portugal virá de novo construir o seu mundo de paz, por maior que tenha de ser o seu sa¬crifico: mundo de uma paz que não surja como a romana ou a inglesa, do exterior para o interior, de um César para seus súbditos, dos tribu¬nais para os corpos; paz que se realize antes de tudo nas almas, lei que seja inteiramente não escrita e, no melhor de si, informulada; reino de Deus que surja pela transformação interior do homem.
É como uma justificação e uma explicação deste seu acto fundamental de vida que Fernando Pessoa, pacientemente, vai durante quase duas dezenas de anos escrevendo Mensagem, sem dúvida a mais importante de suas obras e plenamente emparelhando com Fernão Lopes, Os Lusíadas, D. João de Castro e a História do Futuro na compreensão do que verdadeiramente é Portugal; pela inteligência e entendimento fundamentais que enformam toda a obra e por ter posto mais a claro do que Camões na Ilha dos Amores a concepção de uma verdadeiro Império Português ou Quinto Império, veríamos até Mensagem como de importância superior à dos Lusíadas: no total, o não é, porque inutilmente procuramos na obra de Pessoa traços daquele espantosa e eloquente vitalidade de Camões, daquela ígnea personalidade que em si ardendo destruía todos os círculos limitadores que ele próprio ou os outros tentavam traçar à sua volta; a diferença que há entre Camões e Pessoa é a diferença que há entre um homem e a sua inteligência: mas esta, em Pessoa, mais clara e penetrantemente brilhava; foi mais compreensiva quanto ao Passado estático e ao Passado dinâmico, tão incisiva como a de Camões quanto ao Presente e muito mais aguda na previsão do Futuro.

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