Caros, com pena de não ter mais tempo agora:
1. O assunto foi tomando, por assim dizer, a forma de uma estrela de David, de duplo triângulo: num plano, a tríade Vieira - Pessoa - Agostinho; num outro, a tríade Portugal - Europa - Lusofonia. Se quisermos, de um lado a idealização (Império, para manter a palavra) e, do outro, a realização (CPLP como caminho e, em pano de fundo, a globalização planetária). Curiosamente, cada vez mais claramente parece estarmos a falar de coisas completamente diferentes (foi a minha primeira reacção ao ler a "provocação" do Arnaldo); julgo que não estamos, e que nos falta no mapa um 7.º ponto, que não é vértice mas centro da estrela... Lá iremos ao andar da conversa, acho.
2. O que o Renato diz de Vieira, Pessoa e Agostinho é crucial, e merece análise mais funda: por agora, só dizer que o Agostinho está claríssimo, mas que, no Pessoa, a questão do "jogo literário" (precisamente por causa da sua possível confusão com qualquer "jogo interior") tem muito que se lhe diga, para não envolver uma petição de princípio: a de dar por demonstrado precisamente aquilo que em última análise toda a tradição de pensamento "esotérico-religiosa" (em amplíssimo sentido) repudia, e que é a ideia "moderna" de que o acto solitário, por si, não transforma o mundo (incluo neste "acto solitário" tudo o que vai da oração judeo-cristã à prática alquímica ou mágica).
3. Quanto à análise da situação actual, subscrevo quase inteiramente o que disse o Klatuu (o "quase" vem do ponto 2 e nasce só de ser eu, ao contrário, o maior céptico relativamente à minha racionalidade...). O ponto mais importante a meu ver vem trazido pelo Renato, e está nos pontos 4 (de ambos) sobre "europa das pátrias" e "europa imperial".
4. Da europa imperial há que excluir liminarmente a Inglaterra e o seu actual herdeiro americano, como tão perfeitamente compreendeu De Gaulle: o império destes não é império europeu mas império marítimo, e a vocação destes há-de ser sempre a de cercar e neutralizar a hipótese de um império continental (que na actual circunstância só pode ser russo-europeu).
5. De passagem, não penso que Portugal tenha sido alguma vez um império marítimo, ao contrário do que nos ensinam a pensar: marítimas eram, no tempo das nossas Descobertas, as potências com quem conflituámos (Veneza, Inglaterra, Holanda), e por isso a elas se deve a parte "material" da modernidade: o capitalismo na sua forma financeira, por exemplo. Mas à medida que Portugal se expandia (e expandia-se aprendendo, pois foi preciso re-conhecer primeiro o mundo a descobrir) procurou sempre uma plataforma continental em que ganhasse o fôlego de território que nesta faixa da europa lhe faltava, sendo a Índia e o Brasil as sucessivas hipóteses de centrar o império: através da expansão marítima, Portugal buscava penetrar na terra.
(a continuar)
2 comentários:
Caro Casimiro
Publiquei o meu post antes de ter lido o teu, mas não há problema. Mesmo um pouco desencontrados, vamos avançando...
Quanto ao que escreves, há, desde logo, um ponto a esclarecer quanto ao Pessoa:
1. Eu não acredito no alcance dos "actos solitários" que referes: oração, magia, etc. (talvez seja defeito meu, mas é mesmo assim).
2. Dito isto, acho que Pessoa quis realmente intervir no mundo. Mas apenas enquanto "ideólogo" (o que também não é defeito, apenas feitio). Mas, na altura, ninguém o ouviu...
3. Aliás, Pessoa teve paixões políticas, e grandes: vide, desde logo, o caso de Sidónio...
Renato,
na verdade os posts deviam ter saido ao contrário (o teu comentário é anterior), mas eu tinha aberto a página algum tempo antes...
Estou ciente do que dizes em 1., e não é defeito :). No Pessoa, e independentemente da "sinceridade" das suas incursões esotéricas, o que acho que mereceria ser realçado (não sei se alguma vez o foi, não sou grande leitor dos seus estudiosos) ter reforçado na mitologia portuguesa um factor de hipnotização pelo "mar". A velha história do "mais vale a viagem para Ítaca do que a chegada a Ítaca" escrita de mil maneiras diferentes por um dos maiores poetas do Ocidente mudou a nossa percepção do "destino de Portugal".
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