A História dos povos é a história do quotidiano dos homens, repleta de feitos heróicos e de comezinhas rotinas que raramente acham lugar entre as páginas dos livros, persistem na memória de uns quantos até o tempo as engolir no esquecimento. Não encontro, nas páginas das enciclopédias, o nome dos meus avós, criaram seis filhas em tempo de guerra, passaram fome, viveram, morreram e só eu os recordo. Há um tributo por conceder: honrar o cidadão anónimo, as mulheres que se cruzam comigo e das quais, muitas vezes, só lhes conheço o rosto pelos olhares cabisbaixos dos filhos que escondem a fome. São elas que inventam sopas de batata e massa, até o fardo do orgulho vergar ao vazio da despensa. São elas que choram caladas, entre portas, e soltam o riso no meio da multidão, alheia à sua dor. São elas que fazem anéis de missangas e comida para fora e colares e se levantam todos os dias para o emprego onde trocam o seu silêncio por conversas de circunstância.
São essas mulheres que eu quero honrar.
São essas mulheres que eu não posso esquecer.
São essas mulheres que eu quero honrar.
São essas mulheres que eu não posso esquecer.
11 comentários:
Não sou de elogios fáceis e também não venho para elogiar a qualidade da escrita ou algo de género - venho dizer que muito pouco do que aqui se tem publicado considero tão pertinente e sincero como este texto!
As pessoas vêm até aqui por diversos motivos - que não vou classificar.
Neste texto tudo o que adivinho é de uma elevada dimensão ética e política... e não mais uma auto-coçadela ao ego.
Bem hajas pela tua coragem.
Nosso cotidiano é repleto de heróis que se perpetuam através de gerações, porém anônimos na História ainda que agentes desta, mas sempre vivos em nossa história.
Beijos, Anabela.
Klatuu, percebeste-me bem.
Um abraço
Biazinha, a questão é que também têm que ter lugar na nossa memória, pois a História não é só feita de grandes vultos mas também de grandes homens que suaram as estopinhas.Houve mais Fernandos para além do Pessoa e mais pessoas para além deste Fernando. Ser culto e patriota é também reconhecer no cidadão anónimo esse herói.
Um beijo
Anabela,
Leio e vem-me à memória a história da minha própria família e de tantas outras.
Não nos podemos esquecer dessas mulheres, sem dúvida. À sua maneira são de uma heroicidade tremenda, raramente reconhecida.
"Ser culto e patriota é também reconhecer no cidadão anónimo esse herói."
Subscrevo totalmente.
Beijinhos
P.S. Aprecio imenso o que escreves e faço minhas também as palavras do Klatuu no que respeita à pertinência e sinceridade do texto.
A sinceridade "cheira-se" à distância:)
Junto-me à homenagem.
Uma vénia.
De certa forma ninguém morre completamente enquanto é recordado; mas ninguém está inteiramente vivo enquanto não sabe olhar os outros - todos os outros - olhos nos olhos, até ao fundo e até ao fim.
Sim, de tão poucos heróis falam as enciclopédias. De tão poucas almas.
Um abraço, Anabela.
Andorinha, Mariazinha e Casimiro, e assim querendo estar vivos, olhamos os outros, «- todos os outros - olhos nos olhos, até ao fundo e até ao fim»,como bem lembra o Casimiro.
Um abraço a cada um
Parabéns pela clareza do seu pensamento. Subscrevo. Homens e mulheres corajosos e anónimos maioria silenciosa. Ele,tu e eu, essa gente humilde e honesta, somos nós os pouco ou nada remediados. Mas não aceitemos o estatuto de coitadinhos, atentemos antes na responsabilidade de sermos quem somos: o "demo" da "cracia".
Posso ser útil? O meu Senhor agora não pode, pouco admira o que inventa, é sóbrio e, ao contrário do que se diz, nada vaidoso.
Eu sabia que a donzela de fulvos cabelos irrequietos faria sombra aos pirilampos...
Lord, a donzela agradece com um beijo.
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