
“Apologia de Castilho” (excerto)
Como estamos longe da peregrina noção de que a língua é mero instrumento do pensamento que, esse sim, é que teria de ser claro e distinto! Isto sem falar na impugnação de qualquer mérito de Castilho, afora o da estreita área da literatura convencional! O tópico sugere reflexões mais matizadas acerca do conceito de literatura e dos critérios de valor prevalecentes na conservadora perspectiva de tantos historiadores e críticos literários. Baste-nos, porém, nesta circunstância, exaltar a obra de quem, muito antes de Fernando Pessoa, teve consciência do valor constitucional da língua na formação do homem e em especial de quanto urge libertar a portuguesa língua dos factores de abastardamento cujos efeitos se projectam em quase todos os planos da vida social. O poder integrador da língua, já patente, por contraste, na confusão de Babel, mais brilha ainda na diversidade sem fim dos autores que, cada um a seu modo, como António Feliciano de Castilho, ousam ampliar o comum espírito que anima o seu povo.
Joaquim Domingues