DA MEMÓRIA… JOSÉ LANÇA-COELHO
No ano lectivo de 1978/79 fiz o Estágio Pedagógico, numa escola de Setúbal, para me tornar Professor Efectivo.
A orientadora de estágio era uma colega embirrante, com poucos escrúpulos, que não fazia o que apregoava, e que pegava por tudo e por nada, com os seis estagiários.
Um dos meus colegas, havia concorrido para várias cidades do país, onde funcionavam os estágios pedagógicos, e conhecia muito bem dois dos estagiários que, naquele ano, tinham sido colocados em Estremoz, encontrando-se com eles ao domingo.
Assim, à segunda-feira, ouvíamo-lo a contar o que os colegas de Estremoz diziam da benevolência do seu orientador de estágio, e todos lamentávamos não ter concorrido para aquele cidade, quando, inevitavelmente, o comparávamos com as extravagâncias das exigências da nossa orientadora.
Entretanto o ano de Estágio Pedagógico terminou, cada um dos seis professores seguiu o seu nobre caminho e, pessoalmente, a única coisa que retive na memória, foi que o tal colega de Estremoz, que era uma pessoa extremamente humana para com os seus estagiários, se chamava António Telmo.
Alguns anos depois, por aqueles inexplicáveis acasos da vida, conheci dois membros do denominado grupo da Filosofia Portuguesa que, se reuniam em duas pastelarias de Lisboa, à 5º feira à tarde numa da Rua Alexandre Herculano, e ao domingo de manhã, numa outra na Avenida João XXI, a “Munique” se não me falta a memória.
Álvaro Ribeiro e José Marinho já tinham falecido. Dos nomes mais sonantes que conheci então, faziam parte, António Quadros, Afonso Botelho, Brás Teixeira, e outros, a que a memória já não consegue chegar.
De entre eles, havia apenas um que não vivia em Lisboa, mas que, por amor à Filosofia ou ao Filosofar, fazia cerca de quatrocentos quilómetros ao domingo, para vir trocar impressões com os seus amigos. É verdade, vinha expressamente de Estremoz e, chamava-se António Telmo.
Lembra-me que, no dia que me estreei a emitir uma opinião perante tão douta plateia, formulei um juízo acerca da natureza material de Jesus Cristo, considerando-o do ponto de vista material, uma pessoa igual a todos nós, porém, sem negar a divindade da sua natureza espiritual.
O grupo ouviu-me e, em seguida, alguns dos presentes, sem me contradizer ou/e afrontar, deram a sua opinião. Porém, à saída da pastelaria, o António Telmo aproximou-se de mim e disse:
“ – Você hoje, já deu um ar da sua graça, ahn!
Sorri, e cada um foi à sua vida. Encontrámo-nos, posteriormente, algumas vezes naquela pastelaria acerca de tudo e de nada.
Anos depois, comprei e li com agrado o seu livro História Secreta de Portugal.