Quem se move mais na área das Tecnologias de Informação conhecerá - pelo menos de nome - o conceito "Open Source". Este tipo de abordagem ao desenvolvimento de software deu amplas provas de sucesso, como demonstram as múltiplas distros de Linux (como o Ubuntu e o Linpus, que uso), o Firefox (que provavelmente usa para ler estas linhas), o Apache (que disponibiliza boa parte de todas as páginas Web na Internet) e várias aplicações Office.
O conceito de "Open Source" gira em torno de um grupo flexível de pessoas, cada uma trabalhando por sua conta e risco, nas áreas que sentem mais importantes ou interessantes. Realizações notáveis como o Linux, o Firefox e o Apache, que concorrem com aplicações criadas por grandes corporações multinacionais, com recursos quase infinitos, provaram o valor do modelo na área das Tecnologias de Informação.
O fundamental de uma organização "open source" é a capacidade que cada elemento tem para decidir sozinho em que é que vai trabalhar. Sem esta liberdade básica, todas as demais são irrelevantes.
O grande problema com o conceito de "open source" é, naturalmente... Como viver dele. Este dilema já conheceu varias "soluções", sem que, contudo, nenhuma conseguisse cumprir a primeira liberdade básica: a escolha do trabalho.
Uns tentaram criar uma empresa que vendesse o suporte sobre o software desenvolvido em "open source", como sucedeu por exemplo com a distro de Linux, RedHat. Outros deixaram-se engolir por uma grande empresa que lhes garantia o ordenado, como sucedeu com o MySQL (hoje em integração por osmose com a Oracle). Um e outro modelo, implicam o fim da liberdade básica de escolha do "open source" já que em ambos, os membros acabaram a receber ordens de um "patrão". De facto, esse é o grande problema, quem estará disposto a pagar a alguém que faça apenas aquilo de que gosta? A saída para este dilema tem passado por aturar trabalhos repetitivos de dia e guardar os interessantes para a noite, como hobby... Escrevendo por exemplo, estas linhas. É claro que assim teremos pessoas que podem ser inovadoras e criativas cumprindo tarefas chatas e enfadonhas a maior parte do tempo e relegando para aquele que devia ser o seu tempo de lazer ou descanso os seus momentos de maior criatividade em que, precisamente, poderiam ser socialmente mais úteis.
Agostinho da Silva já discorreu sobre vertente escravizante do "trabalho" recorrendo para tal ao seu conhecimento das sociedades clássicas e explicando-o pela sua ligação à palavra latina para um instrumento de tortura. E se a ligação existe é porque para a maioria de nós, "trabalhar" corresponde a fazermos algo de que não gostamos. E sempre foi assim. Ou não? Não, no mundo do "open source", razão pela qual a transposição deste modelo de organização poderá ser tão interessante para as sociedades do futuro. E na verdade, nem se pode realmente dizer que seria um modelo de organização original: a maior parte da existência do Homo Sapiens sobre a Terra correu sob um regime de caçadores-recolectores, sem efetiva sem reais estruturas hierárquicas e de Poder, onde qual se adaptava e seleccionava as atividades que mais lhe agradavam e que melhor julgava poder desempenhar. Ou seja, respeitando o essencial do regime "open source"... Na época o conceito de "trabalho" (que Agostinho bem ligava à origem latina do termo em "tripallium", um instrumento de tortura) ainda não existia e de facto foi exatamente assim durante 90% da existência do ser humano. Foi somente a partir do momento em que a população explodiu e houve necessidade de impor a especialização do trabalho, que este - propriamente dito - surgiu.
Uma possível forma de aplicar no mundo empresarial o conceito de "open source" poderia ser pela formação de micro empresas, concebidas a partir do autoemprego de um único indivíduo, produzindo um produto ou um serviço de software proprietário. Assim seremos apenas nós próprios a decidir o que fazer. O modelo não está, contudo, isento de fragilidades... O facto de sermos só um, quer dizer que teremos que fazer tudo, mesmo aquilo que não queremos fazer ou que fazemos menos bem. E, é claro, se algo lhe acontecer, como um acidente ou uma doença que o torne improdutivo, a empresa pode não sobreviver, já que os clientes cujo desenvolvimento tenha sido interrompido não lhe irão perdoar e poderão sofrer até prejuízos significativos se planearam em função do seu compromisso de entrega, que, agora não pode manter por motivos compreensíveis mas de impacto profundo no seu negocio. Oferecer o código fonte da aplicação pode resolver parte deste problema, já que outros poderão estudar e modificá-la consoante o necessário.
Assim temos na "Empresa Aberta" um conceito de organização empresarial em que não há patrões nem empregados, em que qualquer um pode juntar-se ou sair a qualquer momento, participando apenas nos projetos que ache verdadeiramente motivadores, durante exatamente o tempo que melhor lhe aprouver.
Este é o modelo em que foram criados programas como o Apache ou o popular browser Mozilla Firefox, mas o modelo não se esgota nas funções de programadores ou analistas informáticos. Uma organização precisa de muito mais de informáticos para sobreviver. Todas as áreas, do helpdesk ao marketing podem ser alvo da mesma metodologia de organização do trabalho. O grande problema de manter uma organização assim será sempre o de encontrar mecanismos de compensação e remuneração adequados. Em projetos como a Wikipedia ou o Firefox o reconhecimento de mérito inter-pares é fundamental. Mas numa organização mais privada, menos voluntariosa e mais comercial como estes projetos não-comerciais o simples reconhecimento inter-pares é insuficiente para cativar e preservar os melhores, mais produtivos e criativos elementos que, naturalmente, serão seduzidos por organizações mais tradicionais a um ritmo muito elevado.
Uma das formas de estabelecer formas de compensação adequadas para uma organização "Open Source" pode ser uma tecnologia conhecida como "Trust Metrics". Com esta tecnologia, cada colaborador avalia o seu par, mas elaborando os níveis de escala de uma forma que torna qualquer forma de "batota" ineficazes. Esta é essencialmente a mesma tecnologia empregue pelo Pagerank da Google, com tanto sucesso na relevância dos resultados do incontornável motor de busca norte-americano. Baseando a compensação financeira em ratings contínuos é possível ir ajustando a quantidade de tempo reservada para projetos "open source" e ir ajustando este às variações destes ratings, até um ponto em que eventualmente a compensação se torna tão alta que se pode deixar o emprego "normal".
Nestas organizações, ninguém pode impedir alguém de participar num dado projeto, mas também ninguém pode ser despedido. Isto faz com que estas organizações sejam formas de vida muito mais seguras que as tradicionais, livres da arbitrariedade, dos favores de chefes ou gestores, assim da vaga oscilação dos seus favorecimentos ou das suas birras irracionais. O papel de cada colaborador nestas organizações "open source" depende unicamente das capacidades e do empenho de cada um no seu seio.
Atualmente, a maioria das organizações publicas e privadas já possuem programas de avaliação de desempenho. Estes, contudo, são sempre mais ou menos opacos, com parte das métricas fora da compreensão ou controlo dos colaboradores avaliados e determinadas de forma quase invariável sem o seu conhecimento ou consentimento, pelas chefias e sem participação direta dos colaboradores avaliados. Com esta metodologia de ratings pelos pares, todos terão pleno acesso às formas de avaliação e como estas são produzidas.
Uma vez estabelecido o mecanismo de "Trust Metrics" há que elaborar os mecanismos de compensação. Desde logo, fica evidente que ainda que a remuneração salarial fixa seja a que corresponde ao salário mínimo (nos países onde este existe) o essencial do plano de compensação será variável e alimentado diretamente a partir dos lucros da organização que serão distribuídos por todos os colaboradores consoante o seu rating no sistema de "Trust Metrics".
Fonte principal:
http://e-texteditor.com/blog/2009/opencompany
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