A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
Sede Editorial: Zéfiro - Edições e Actividades Culturais, Apartado 21 (2711-953 Sintra). 
Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

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Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

Onde temos ido: Mapiáguio (locais de lançamentos da NOVA ÁGUIA)

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terça-feira, 21 de outubro de 2008

AGOSTINHODA SILVA: UM FERNANDO PESSOA , “MENSAGEM UM” (II)

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A primeira ideia que nos dá Pessoa é a de que há um certo passado de Portugal que não é de natureza puramente histórica: é apenas uma revelação no passado do que é em Portugal uma pere­nidade; o apuramento dessa perenidade constitui o conteúdo da primeira parte do poema, aquilo a que Pessoa chamou justamente Brasão, mas que não é para ele brasão de túmulo, ou brasão daque­les palácios em ruínas que foram obsessão em Gomes Leal: o seu Brasão é a nobreza em cerne, é a essência do ser fidalgo de Portu­gal. Quando agir, será no Passado, a segunda parte do poema, Mar Português, e, no Futuro, a terceira parte, O Encoberto. Brasão terá como lema Bellum sine bello: é a potência sem o acto, a energia sem a matéria, a História sem o tempo: Deus, vendo Portugal em Si eterno, escreveria Brasão. Mar Português é o acto que não esgota a potência, a matéria que não apaga a energia, o tempo que não liquida a História: por isso é apenas a Possessio Maris que o poeta lhe deu por lema: é Portugal podendo apenas uma mínima parte do que pode; não se entregando todo e, portanto, apenas possuindo; em Mar Português, Portugal Tem, não É. Em O Encoberto, porém, toda a sua grandeza se revela: e o descerramento desta sua glória é quase a renovação, agora de homens para homens, do clamor anti­go dos anjos, quando o Céu fez, por uma Terra que dele se desa­viera, o sacrifício supremo de si próprio: Pax in excelsis; paz nas alturas em que o homem, indo além de si mesmo, se faz Santo; não a paz em que o homem, rendendo-se, organiza, explora e defende sua própria baixeza.
Em Brasão, Portugal é o rosto com que a Europa fita um Ocidente que, ao plenamente ser, justificará todo o passado de miséria que a Humanidade tiver atravessado; a missão de Portugal não poderá ser outra senão a de resgatar o que a Europa fez e de a salvar a seus próprios olhos; por isso o seu campo, o dos Castelos, é o que serve de base ao das Quinas, o das Chagas de Cristo, este o campo próprio de Portugal: é expirando na cruz, esgotando-se no seu sangue e na sua piedade, que Portugal poderá salvar o mundo. No dos Castelos, porém, Portugal porá, como seu alicerce, o que de mais fundamental a Europa poderá ter dado ao mundo: com Ulisses, a ideia de que o mito é mais importante do que a realidade, de que o poder vir a ser é o substrato do que é, de que as coisas morrem à medida que são; com Viriato, a de que a verdadeira força propulsora da vida não é a inteligência, mas a reminiscência, e de que o ponto criador não é a definição, mas o pressentimento; com O Conde D. Henrique, a de que a acção, se Deus é o agente, se faz para além das intenções e das possibilidades do herói, consistindo o heroísmo apenas em se não recusar o que se não compreende; com D. Tareja, juntamente com a da contemporaneidade do temporal e do eterno, a de que o dever perante a obra consiste em a ela se dedicar com a bruta e natural certeza com que a Mãe amamenta a seu filho; com D. Afonso Henri­ques, a de que, para se vencerem infiéis, só vale uma indefinível arma, que, espinosianamente, tenha como um dos aspectos o da espada e como outro o da bênção, como um, o do corpo, como outro, o do espírito; com D. Dinis, a de que a intuição poética vale mais do que o plano; com o sétimo castelo, o que junta D. João e D. Filipa, o que se afirma é que a História, ao ser, toma dois aspectos: o do homem e o da obra, sendo as modificações de qualquer desses o reflexo das modificações do outro; e ainda, que o milagre da concep­ção humana consiste em que cada filho, sendo de seus pais, não tem ao mesmo tempo nada que ver com eles: a cada nova geração reafir­ma o Espírito Santo a liberdade de criar. A Europa em que Portugal assenta não é, felizmente, a Europa cartesiana.
Se a força de alicerce de Portugal vem de ter afirmado a existên­cia de uma Europa que duas vezes se perdeu de si própria, primeiro na Idade Média grega, depois na Idade Média ocidental, a sua força de salvação virá de, voluntariamente, ter incluído em seu brasão as chagas de Cristo, não pintando-as apenas, mas consubstanciando­-as em gente sua: primeiro em D. Duarte, o mártir do dever; depois em D. Fernando, o mártir da grandeza de alma, superior sempre a seu destino; e em D. Pedro, mártir da fidelidade a uma ideia claramente pensada e claramente sentida; e em D. João, o mártir de não querer senão o todo, ou o seu nada; e, finalmente, em D. Sebastião, o mártir do sonho de grandeza que está para além das circunstâncias históri­cas. Coroando os campos, a santidade activa de Nuno Álvares, a sua pureza guerreira, o halo que no céu gravam suas acções terrestres; e, numa afirmação final da energia que a tudo subestá, o Grifo com sua cabeça de águia adivinhando o mundo como um perfeito globo, ou melhor, obrigando o mundo a ser o globo que pensava; com uma de suas asas rasgando o firmamento num sulco de vontade, com a outra das asas o rasgando num sulco de poder.
Sobre a base teórica de que a vontade de Deus desperta o sonho do homem e de que o sonho do homem provoca o surgimento da obra, e afastando por aí, para explicar a História, tudo o que sejam causas espirituais ou materiais limitadas ao círculo humano, e pondo nitidamente, logo no primeiro poema, que a história que vai contar, a da Possessio Maris, não é a história de Portugal, mas apenas o seu interrompido prólogo, Pessoa dá o que foi o encantamento máximo dos navegadores, o de transformar o abstracto em concreto; o que foi basilar em sua actividade, a convicção de que só em Deus, como último porto, encontrariam o porto de repouso; a vontade de um rei de carácter sacramental que faz, ao mais humilde dos homens, poder mais do que todos os medos do mundo; a glória de ter mostrado que o mar é sempre o mesmo e que a sua posse nada significa de vital; o sentimento de que o que vale na empresa de buscar é a busca e não o encontro; o mérito de ter sido o corpo da vontade de Deus, de ter sido o Tempo da Eternidade a revelar; o impulso que irá conduzir a História para além dos que o lançaram; a consciência de se ter realizado, no mundo físico, e sem nisso estar verdadeiramente empe­nhado, a mais alta façanha de que homens se podem orgulhar; o ter ensinado que toda a descoberta se faz apenas quando se tem a cora­gem de passar além dos domínios da alegria e da dor; por fim, em Última Nau e Prece, a certeza de que, embora tenha vindo a noite e seja vil a alma, Deus ainda reserva para o seu povo Distância a conquistar.
É essa Distância como distante, é essa conquista como inconquis­tável o que, em O Encoberto, se anuncia pelos Símbolos, pelos Avisos, o último dos quais é o do próprio Fernando Pessoa, e se afirma triunfantemente através do negrume dos Tempos. Portugal, comple­tando a sua obra, dará ao mundo o seu íntimo Império feito de anseios, de lonjuras, de reinos ilocalizáveis em tempo ou espaço, o seu reino de alma humana continuamente sendo e continuamente ansiosa de mais ser, tendo-se inteiramente desprendido das ilusões de uma afirmação puramente pessoal e de uma pessoal felicidade; o mar bate nas costas do Império, mas, se o escutarmos, pára; decerto, porém, um dia, desistindo de nos opormos ao mundo, não mais o quereremos escutar; então, através de todo o nevoeiro, pelo próprio nevoeiro, terá surgido a Hora; o Encoberto, em milagre supremo, se descobrirá.

4 comentários:

Casimiro Ceivães disse...

Fundamental é: o que significa aqui "desistir de opor ao Mundo"?

Unknown disse...

Pode ser que o desistir de opor seja afinal a verdadeira oposição, por complemento, integração e... renascimento.

Renato Epifânio disse...

Tu e os teus olhos de lince, Casimiro (vou pôr a passagem a negrito)

Não tenho respostas fáceis. Acho que a chave está no conceito (muito agostiniano) de "boiar". Que, paradoxalmente, é, a meu ver, muito titânico...

Paulo Borges disse...

A última passagem a negrito é mais uma das várias glosas que Agostinho faz, muitas vezes no fim de alguns dos seus textos fundamentais, do poema "As Ilhas Afortunadas", da "Mensagem" de Fernando Pessoa, onde vejo uma das chaves para a compreensão da experiência espiritual sem a qual não creio que se possa compreender a própria "Mensagem", no trânsito da epopeia histórica para a epopsia da consciência. O problema é que Agostinho, pese mostrar ter um entendimento subtil disto, como por exemplo em "Terceira Revelação", de "Só Ajustamentos", também oscila na ambiguidade de pretender nacionalizar esta experiência de desvendamento, fazendo de Portugal o seu sujeito, como aqui acontece. Não creio, contudo, que uma nação possa alguma vez opor-se ou deixar de se opor ao mundo, pelo simples facto de que isso só uma consciência individual o pode fazer e uma nação não é uma entidade espiritual, com inteligência e vontade própria, por mais que tal a pretendam.