Literatura Russa
As forças revolucionárias que triunfaram em 1917 vieram dar à Rússia uma direcção de vida que, se não é completamente nova nos seus elementos componentes, o é no modo por que se apresentam ligados: o ocidentalismo faz triunfar uma filosofia alemã, afirma o poder dos técnicos, impõe-se vigorosamente às características tradicionais do povo russo e faz dos camponeses da resignação, dos proletários miseráveis das cidades os trabalhadores das granjas colectivas e da indústria pesada: a eslavofilia dá a concepção da Rússia como salvadora do mundo e subordina o progresso material a uma concepção moral; implícita ou explicitamente, tem-se a ideia de que o fim último do homem está no Sermão da Montanha e na paz, na fraternidade, no gozo espiritual do reino divino realizado na terra; mas não se vê a pregação moral como o caminho para se atingir o objectivo desejado: é a electrificação, é o tractor, é o canal, é o avião de transporte, é o laboratório de biologia, é o fragor da batalha, é o sangue em torrentes quando for necessário, que hão-de trazer ao mundo a era nova: é neste sentido que Alexandre Blok fala numa das suas poesias de Cristo que marchava à frente das patrulhas na luta de ruas em Moscovo; e todos os escritores russos da época revolucionária estão possuídos da mesma ideia, no mesmo ardor de construção, na mesma consciência de que participam de uma obra grandiosa; o entusiasmo das realizações torna-os pouco interessados pelo estilo, pelas qualidades puramente artísticas da obra literária, e grande parte da literatura russa contemporânea terá a duração que têm tido todas as obras de simples emoção; só depois de passadas as batalhas se escrevem as obras que as imortalizam e a maioria dos romances, das novelas, das poesias da Rússia contemporânea pouco só valem como documentários da experiência humana em que os seus autores se viram envolvidos; além de tudo, a verdadeira arte só se desenvolve num ambiente de apuramento espiritual que não pode existir num país em plena revolução e exactamente numa revolução perante a qual uma revolução religiosa como a Reforma, uma revolução política como a Revolução Francesa, quase nada representam; certamente, a Rússia, se merecer a liberdade, há-de ter a literatura digna do que fez noutro plano e é também fora de dúvida que se terá de a contar entre as melhores obras do espírito humano, porventura excedendo, em riqueza e em número, o que se tem feito até hoje: mas não parece que se possa pôr senão como anúncio dos tempos futuros a produção quer de intelectuais do tipo de Fédine, de Pilniak e de Bulgakov, quer a dos escritores mais ligados aos movimentos profundos do povo como Vsevolod, Ivanov, Gladkov, Nevierov, apesar de todas as qualidades de força, de viril coragem, de inteligência, de engenho e de humanidade que é impossível negar-lhes.
As forças revolucionárias que triunfaram em 1917 vieram dar à Rússia uma direcção de vida que, se não é completamente nova nos seus elementos componentes, o é no modo por que se apresentam ligados: o ocidentalismo faz triunfar uma filosofia alemã, afirma o poder dos técnicos, impõe-se vigorosamente às características tradicionais do povo russo e faz dos camponeses da resignação, dos proletários miseráveis das cidades os trabalhadores das granjas colectivas e da indústria pesada: a eslavofilia dá a concepção da Rússia como salvadora do mundo e subordina o progresso material a uma concepção moral; implícita ou explicitamente, tem-se a ideia de que o fim último do homem está no Sermão da Montanha e na paz, na fraternidade, no gozo espiritual do reino divino realizado na terra; mas não se vê a pregação moral como o caminho para se atingir o objectivo desejado: é a electrificação, é o tractor, é o canal, é o avião de transporte, é o laboratório de biologia, é o fragor da batalha, é o sangue em torrentes quando for necessário, que hão-de trazer ao mundo a era nova: é neste sentido que Alexandre Blok fala numa das suas poesias de Cristo que marchava à frente das patrulhas na luta de ruas em Moscovo; e todos os escritores russos da época revolucionária estão possuídos da mesma ideia, no mesmo ardor de construção, na mesma consciência de que participam de uma obra grandiosa; o entusiasmo das realizações torna-os pouco interessados pelo estilo, pelas qualidades puramente artísticas da obra literária, e grande parte da literatura russa contemporânea terá a duração que têm tido todas as obras de simples emoção; só depois de passadas as batalhas se escrevem as obras que as imortalizam e a maioria dos romances, das novelas, das poesias da Rússia contemporânea pouco só valem como documentários da experiência humana em que os seus autores se viram envolvidos; além de tudo, a verdadeira arte só se desenvolve num ambiente de apuramento espiritual que não pode existir num país em plena revolução e exactamente numa revolução perante a qual uma revolução religiosa como a Reforma, uma revolução política como a Revolução Francesa, quase nada representam; certamente, a Rússia, se merecer a liberdade, há-de ter a literatura digna do que fez noutro plano e é também fora de dúvida que se terá de a contar entre as melhores obras do espírito humano, porventura excedendo, em riqueza e em número, o que se tem feito até hoje: mas não parece que se possa pôr senão como anúncio dos tempos futuros a produção quer de intelectuais do tipo de Fédine, de Pilniak e de Bulgakov, quer a dos escritores mais ligados aos movimentos profundos do povo como Vsevolod, Ivanov, Gladkov, Nevierov, apesar de todas as qualidades de força, de viril coragem, de inteligência, de engenho e de humanidade que é impossível negar-lhes.
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