A discussão sobre a oportunidade e validade do Acordo Ortográfico tem posto em evidência que ninguém é dono da língua, pelo que não haverá nenhum acordo que impeça evoluções desencontradas.
O conceito que tem circulado em algumas das intervenções, e que parece ajustado à natureza das coisas, é o que sustenta que a língua não é apenas nossa, também é nossa.
É por isso que acordos, declarações, tratados, são certamente adjuvantes de uma política que mantenha a identidade essencial, mas nenhum terá força vinculativa suficiente para evitar que as divergências surjam pelas tão diferentes latitudes em que a língua portuguesa foi instrumento da soberania, da evangelização, do comércio.
Existem locais onde os factos tornaram evidente que a língua não resiste à falta de utilidade para os povos que estiverem abrangidos por qualquer daquelas actividades, e por isso o português sofre dessa erosão no longínquo Oriente do primeiro império, tem marcas pequenas em Macau, luta com o passado apagador da língua pela ocupação de Timor pelo invasor e também com os interesses da Austrália pela expansão da língua inglesa, vai enfraquecendo em Goa.
O critério da utilidade para os povos talvez por isso não seja dispensável no discurso dos procedimentos a adoptar para que o essencial seja uma preocupação e empenho constante dos governos que têm a língua portuguesa como língua oficial, cada um sabendo que não é sua, é apenas também sua.
Muito recentemente a ONU deu um sinal importante do interesse, com ligação ao número de países que, tendo assento no plenário da Assembleia Geral, falam português.
No mês de Março, segundo foi anunciado, o sítio Web Know - Your Rights 2008.org seria tornado mais acessível a pessoas do mundo inteiro, e para isso utilizando oito línguas.
Tais línguas são inglês, francês, italiano, espanhol, alemão, português, holandês e grego.
Esta decisão destina-se a apoiar mais de uma dezena de projectos para os quais se pede e espera a intervenção dos parceiros da organização, governos, parlamentos, ONG, e entidades particulares que aderiram em nome e proveito da sociedade civil transnacional em crescimento.
O interesse comum é muito mais dinamizador de iniciativas e práticas do que a obrigatoriedade assumida por tratados cuja debilidade directiva é logo evidenciada pelo método da entrada em vigor.
Talvez a maleabilidade das Declarações, que estão a ganhar relevo crescente nas relações internacionais, seja mais indicada para servir de apoio directivo a uma política persistente de identificação e defesa do interesse comum, do que a natureza imperativa dos tratados.
O ensino e a investigação, no espaço europeu em definição política acelerada, estão apoiados em Declarações que presidem ao desenvolvimento de redes cada vez mais sólidas, e não em tratados.
Foi esta consideração que inspirou a criação do Instituto Internacional da Língua Portuguesa, em grande parte devido à percepção do Presidente José Sarney, atento às intervenções e discussões dessa matéria.
Tinha presente que a responsabilidade pela língua incumbia à Academia Brasileira de Letras, tal como em Portugal incumbe à Academia das Ciências.
Mas não faltaram observações de experientes das relações internacionais, e certamente nem todos com a mesma vivência das academias, no sentido de que os novos Estados de língua oficial portuguesa, que também deveram ao brasileiro embaixador Aparecido de Oliveira a criação da CPLP, não tinham nem a tradição, nem as vocações e recursos que os levassem a adoptar tal modelo.
O Instituto Internacional da Língua Portuguesa foi criado como centro de encontro entre iguais, para, identificando os interesses comuns, convergirem nas políticas destinadas a servir esses interesses, salvaguardando o instrumento insubstituível que é a língua.
Não parece ter acontecido que a inspiração do Instituto Internacional da Língua Portuguesa tenha sido revisitada, mas também não parece que o critério que orientou a sua criação deva ser ignorado.
Texto publicado no Diário de Notícias
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