Luís G. Soto & Miguel M. Quintanar
Dois séculos, 10 anos
Há na filosofia política internacional contemporânea um debate sobre o republicanismo em termos não desconhecidos na tradição política espanhola —ou quiçá melhor dito hispana— dos dois últimos séculos. Podemos datar —convencionalmente, miticamente— a sua origem nas Cortes de Cádis, reunidas em 1810, e a Constituição —monárquica, mas liberal— fruto do seu trabalho promulgada em 1812.
Desde essas datas a hoje vão duzentos anos, e neles podemos contabilizar, somando-os, apenas —e como máximo— 10 anos de república em Espanha.
Republicanismo, republicanos
Desde há mais de duzentos anos, três ideias do republicanismo, então procedentes da Revolução Francesa de 1789, são discutidas e reelaboradas na teoria e a prática políticas: a liberdade, a igualdade e a fraternidade. As três conhecem um desenvolvimento profuso espargido em diferentes correntes políticas, que se entrecruzam, nem sempre em harmonia ou em sintonia, senão com frequência divergindo entre elas. E pugnam, desde então e antes, com variados conservadorismos, tradicionalismos, etc.
Liberais, progressistas, anarquistas e socialistas são as formas —entre outras— que vão adoptando essas correntes —partidos, organizações, movimentos— que tomam por eixo a liberdade, a igualdade e a fraternidade (ou solidariedade).
Diferenças entre os republicanos
O que os diferencia, de início e ao longo do séc. XIX, não é tanto uma especialização —a escolha preferente de um desses valores: por exemplo, a liberdade— como a maneira de entender a conjunção desses três valores republicanos. Ainda no primeiro terço do séc. XX, em que o processo de fissão é um facto consumado, as diferenças entre as esquerdas liberais e os socialistas e os anarquistas podem ser formuladas como uma questão de hierarquia e compreensão desses valores, mas não de exclusão de algum deles.
Uma outra diferença, e importante, é que uns —liberais, progressistas— nascem em torno ao poder político —o estado e o governo, do qual por vezes participam— e outros —socialistas, anarquistas— originam-se por fora do poder político, no seio da sociedade, em torno ao trabalho. Estes não só não participam do governo e o estado senão que ficam excluídos deles longo tempo (socialistas) ou de raiz e por sempre (anarquistas), mas constituem um poder social.
Na prática, as forças de matriz republicana rara vez convergem na acção política e/ou social: discorrem por separado e entram em concorrência, desenvolvem-se afastando-se e debilitam-se enfrentando-se. Mesmo quando convergem é rara vez sob a forma da república.