A melhor definição de
metafísica que conhecemos é de José Marinho – nas suas palavras “por metafísica
designa-se não só e apenas o que está para além do físico, mas antes e
primordialmente o que lhe é íntimo e nele se supõe”. Apesar de ter sido
redigida numa obra sobre Leonardo Coimbra (“O Pensamento Filosófico de Leonardo
Coimbra: introdução ao seu estudo”, Porto,
Livraria Figueirinhas, 1945), essa definição aplica-se, por inteiro, ao
pensamento de Teixeira de Pascoaes.
Eis o que o próprio Marinho
reconhece ao falar, num outro texto, da “luz súbita que recebeu de Pascoaes” –
nas suas palavras: “Durante alguns anos, eu, como a muitos outros tem
acontecido em nossos dias, dentro e fora de Portugal, fui acusado de metafísico
e a acusação entendia-se neste sentido: de que eu, e outros, desatendíamos o
Tempo e o Homem para nos referirmos incessantemente à Eternidade, a Deus, ao
Absoluto. Pois bem, no momento em que assim me acusavam, eu fazia justamente o
caminho contrário”.
Como acrescenta: “Descobrira
que só é possível encontrar o sentido da Eternidade pelo aprofundamento do
sentido do Tempo e que Deus só se revela plenamente a quem cumpriu a sua
humanidade, descobrira que se o Absoluto, como firmemente creio, e o Poeta crê
comigo, está para além de toda a relação, é necessário viver e pensar a relação
plenamente para o sentido do Absoluto, passar da ideia abstracta, que é menos
ideia, para a ideia concreta, que é plenamente ideia./ Se vos falo desta
experiência é para vos tornar compreensível a luz súbita que recebi de
Pascoaes, e que veio, sob um certo aspecto, confirmar a iluminação gradual que
me veio do estudo da obra de Leonardo Coimbra”.
A esse respeito, Marinho não
poderia, com efeito, ter encontrado melhor Mestre. Em Pascoaes, o Absoluto é,
simultaneamente, o mais distante – o para além de toda a relação – e o mais
próximo – o verdadeiro ser de todo o ser. E por isso, como o próprio Marinho
reiteradamente referiu, foi, de facto, Pascoaes um “poeta da natureza”, um
“poeta cósmico”, “de mais amplo e abissal sentido cósmico”, um poeta
“panteísta”, sendo o seu panteísmo “produto duma comunhão íntima com os seres”
– nessa medida, um poeta “profundamente terrestre sem pertencer à terra”, um
“poeta materialista no sentido mais fundo do termo”.
Renato Epifânio