Paradigma de uma cultura do “entre” em face de uma cultura do -“ente”
Especula-se muitíssimo, e creio que com razão (por vezes até fazendo pouco uso dela), sobre a adopção de uma mudança de paradigma que permita conceptualizar a vida humana no planeta tendo em vista uma perspectiva que rasure os termos comparativos, baseados nas diferenças e identidades dos povos, geradores de uma enganosa cultura de supremacias de todo o tipo: de raiz cultural, étnica, religiosa, política, económica, ou outra, com toda a sorte de divisões que daí resultam e que constituem, em si e na sua disseminação, autênticos obstáculos ao verdadeiro diálogo e respeito que, não sendo tão novo quanto isso, ainda não foram adoptados pela maioria dos homens integrados nesse conceito, também posto em questão, actualmente: o de povo e povos.
Assinale-se desde já que a maturidade cultural, a que agora nos queremos referir, de uma cultura liberta do paradigma assente nas diferenças, não está distribuída uniformemente, nem sequer como tomada de consciência da caducidade de outros paradigmas, em todos os homens e em todas as sociedades e povos. Como bem sabemos. Os mecanismos que dividem, subjugam e limitam a tomada de consciência destes novos modos de compreender a vida, existem no sentido de criar barreiras a esta mesma tomada de consciência, na medida em que “lêem” e divulgam, distorcendo e manipulando, a relação entre o homem e a natureza, criando barreiras a uma clara apreensão do real e dessa mesma natureza, conceito longe de estar esgotado em todas as suas vertentes e relações.
O que se sabe é que não sabemos que “justiça” é essa que faz com que ainda não tenhamos todos colapsado: homens, bichos e plantas. O que ela (natureza) seja está fora do âmbito do que aqui queremos pensar.
Do mesmo modo, o conceito de povo está demasiado ligado a nação e estado para deles ser desligado, por isso o não queremos aqui usar. O conjunto dos povos é algo que deve ser, igualmente, fonte de questionamento. Nada deve ficar de pé! É preciso “baralhar e tornar a dar”. Importante é saber que paradigma é esse ou são esses que põem em causa de forma tão inteira, rasgando a direito, ou não, os antigos paradigmas que governaram a acção dos homens.
Ora é preciso perguntar: o que querem, verdadeiramente, os que se empenham nestas especulações? O que querem é, porventura, uma cultura nova que, a pouco e pouco, saiba ver o homem não como uma parte de um todo designado de povo, sociedade, ou outra designação, mas antes o Homem elevado ao seu expoente máximo de produtor de cultura que se esforça em tornar verdadeiramente humano (nele incluindo a centelha de divino), o sub-humano que tantas vezes somos. O que verdadeiramente sonham esses homens é a utopia de uma “cultura entre”, nisso supondo a distância que permite ver, estabelecer pontes, para permitir o olhar imparcial, branco como a neve, como diria o poeta. O olhar insituado onde somos menos um “eu” e mais um “entre”. Uma visão na esteira de homens como Agostinho da Silva, que desse paradigma deu exemplo.
Para isso há que mudar muito! Mudar é, pois, a palavra-chave. Palavra com tradições, como se sabe, também. Há que aprender a ver, agora com o olhar compassivo, com o olhar amoroso. Há que considerar a mudança não como vinda de fora, há que haver espaço para uma permeabilidade amorosa, comum a todos. O paradigma anterior resultava de uma acção que vinha do homem para o Real. Dizia-se: “mudar a vida”, “mudar a sociedade”, “mudar o mundo”, procurando inocentar o homem e culpar a ”sociedade” dos males que moravam no seu coração. Nada disso hoje tem sentido. A direcção deste pensamento mudou radicalmente. O homem já não é esse animal, “chefe”, “senhor”, deus dos outros animais. Uma espécie de deus menor, investido de moldar o mundo à sua imagem e semelhança. O homem não é desligado do Real, por isso também não deve ser este a mudar o homem. O real (a natureza incluída), deixou de usar apenas o modelo de: “façamos como o que vemos fazer na Natureza”. O Homem não pode esquecer que, mais do que um ente, é um “entre”. O que o homem deve entender é que entre ele e o mundo: tudo o que, no fundo, está nele e aparenta estar fora dele, para que ambos existam, tem que haver uma relação, uma comunicação, um diálogo permanentemente actualizado. Uma ponte, em suma, que é intrínseca à condição humana, mas que o homem se tem esforçado por esquecer, na sua ganância de se ganhar. Perdendo-se de si e do que é verdadeiramente essencial para si e para o Outro. O homem tem que compreender que as diversidades unem, tornam uno, não dividem.
É preciso ganhar a consciência de que o homem é um “animal plural”. Nesse sentido o homem não é desligado. É um todo, perante um todo, ou seja, o homem torna-se todo no todo.
Julga o homem que desembaraçando-se do que lhe faz mal, ou seja, do que aparentemente divide: o outro, a outra cultura, a outra natureza, a outra razão, a outra sensibilidade, em suma, libertando-se do que é diferente de si (e que apenas por isso o ofende e lhe desagrada) só assim é feliz. Que engano enorme! O homem não tem que persistir nesta cultura de morte. A felicidade não é algo que esteja fora e que tenha que ser alcançado, captado e dominado. A felicidade está no homem e não fora dele. A felicidade situa-se entre os diversos que o homem é. Esta é talvez uma cultura que importa encontrar nesse diálogo que todos temos que ter, connosco, de onde levantamos os andaimes para a construção da ponte que a todos e a tudo una a tudo e em todas as direcções, tal como a luz. Sejamos, pois, hoje, os “anjos do Real” futuro.
Especula-se muitíssimo, e creio que com razão (por vezes até fazendo pouco uso dela), sobre a adopção de uma mudança de paradigma que permita conceptualizar a vida humana no planeta tendo em vista uma perspectiva que rasure os termos comparativos, baseados nas diferenças e identidades dos povos, geradores de uma enganosa cultura de supremacias de todo o tipo: de raiz cultural, étnica, religiosa, política, económica, ou outra, com toda a sorte de divisões que daí resultam e que constituem, em si e na sua disseminação, autênticos obstáculos ao verdadeiro diálogo e respeito que, não sendo tão novo quanto isso, ainda não foram adoptados pela maioria dos homens integrados nesse conceito, também posto em questão, actualmente: o de povo e povos.
Assinale-se desde já que a maturidade cultural, a que agora nos queremos referir, de uma cultura liberta do paradigma assente nas diferenças, não está distribuída uniformemente, nem sequer como tomada de consciência da caducidade de outros paradigmas, em todos os homens e em todas as sociedades e povos. Como bem sabemos. Os mecanismos que dividem, subjugam e limitam a tomada de consciência destes novos modos de compreender a vida, existem no sentido de criar barreiras a esta mesma tomada de consciência, na medida em que “lêem” e divulgam, distorcendo e manipulando, a relação entre o homem e a natureza, criando barreiras a uma clara apreensão do real e dessa mesma natureza, conceito longe de estar esgotado em todas as suas vertentes e relações.
O que se sabe é que não sabemos que “justiça” é essa que faz com que ainda não tenhamos todos colapsado: homens, bichos e plantas. O que ela (natureza) seja está fora do âmbito do que aqui queremos pensar.
Do mesmo modo, o conceito de povo está demasiado ligado a nação e estado para deles ser desligado, por isso o não queremos aqui usar. O conjunto dos povos é algo que deve ser, igualmente, fonte de questionamento. Nada deve ficar de pé! É preciso “baralhar e tornar a dar”. Importante é saber que paradigma é esse ou são esses que põem em causa de forma tão inteira, rasgando a direito, ou não, os antigos paradigmas que governaram a acção dos homens.
Ora é preciso perguntar: o que querem, verdadeiramente, os que se empenham nestas especulações? O que querem é, porventura, uma cultura nova que, a pouco e pouco, saiba ver o homem não como uma parte de um todo designado de povo, sociedade, ou outra designação, mas antes o Homem elevado ao seu expoente máximo de produtor de cultura que se esforça em tornar verdadeiramente humano (nele incluindo a centelha de divino), o sub-humano que tantas vezes somos. O que verdadeiramente sonham esses homens é a utopia de uma “cultura entre”, nisso supondo a distância que permite ver, estabelecer pontes, para permitir o olhar imparcial, branco como a neve, como diria o poeta. O olhar insituado onde somos menos um “eu” e mais um “entre”. Uma visão na esteira de homens como Agostinho da Silva, que desse paradigma deu exemplo.
Para isso há que mudar muito! Mudar é, pois, a palavra-chave. Palavra com tradições, como se sabe, também. Há que aprender a ver, agora com o olhar compassivo, com o olhar amoroso. Há que considerar a mudança não como vinda de fora, há que haver espaço para uma permeabilidade amorosa, comum a todos. O paradigma anterior resultava de uma acção que vinha do homem para o Real. Dizia-se: “mudar a vida”, “mudar a sociedade”, “mudar o mundo”, procurando inocentar o homem e culpar a ”sociedade” dos males que moravam no seu coração. Nada disso hoje tem sentido. A direcção deste pensamento mudou radicalmente. O homem já não é esse animal, “chefe”, “senhor”, deus dos outros animais. Uma espécie de deus menor, investido de moldar o mundo à sua imagem e semelhança. O homem não é desligado do Real, por isso também não deve ser este a mudar o homem. O real (a natureza incluída), deixou de usar apenas o modelo de: “façamos como o que vemos fazer na Natureza”. O Homem não pode esquecer que, mais do que um ente, é um “entre”. O que o homem deve entender é que entre ele e o mundo: tudo o que, no fundo, está nele e aparenta estar fora dele, para que ambos existam, tem que haver uma relação, uma comunicação, um diálogo permanentemente actualizado. Uma ponte, em suma, que é intrínseca à condição humana, mas que o homem se tem esforçado por esquecer, na sua ganância de se ganhar. Perdendo-se de si e do que é verdadeiramente essencial para si e para o Outro. O homem tem que compreender que as diversidades unem, tornam uno, não dividem.
É preciso ganhar a consciência de que o homem é um “animal plural”. Nesse sentido o homem não é desligado. É um todo, perante um todo, ou seja, o homem torna-se todo no todo.
Julga o homem que desembaraçando-se do que lhe faz mal, ou seja, do que aparentemente divide: o outro, a outra cultura, a outra natureza, a outra razão, a outra sensibilidade, em suma, libertando-se do que é diferente de si (e que apenas por isso o ofende e lhe desagrada) só assim é feliz. Que engano enorme! O homem não tem que persistir nesta cultura de morte. A felicidade não é algo que esteja fora e que tenha que ser alcançado, captado e dominado. A felicidade está no homem e não fora dele. A felicidade situa-se entre os diversos que o homem é. Esta é talvez uma cultura que importa encontrar nesse diálogo que todos temos que ter, connosco, de onde levantamos os andaimes para a construção da ponte que a todos e a tudo una a tudo e em todas as direcções, tal como a luz. Sejamos, pois, hoje, os “anjos do Real” futuro.
Publicado por Maria Sarmento em:
arevistaentre.blogspot.com
Sem comentários:
Enviar um comentário