A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
Sede Editorial: Zéfiro - Edições e Actividades Culturais, Apartado 21 (2711-953 Sintra). 
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Donde vimos, para onde vamos...

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Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

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terça-feira, 26 de janeiro de 2010

Ainda sobre Pascoaes

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José da Costa Macedo
A DOR HUMANA NA REVISTA A ÁGUIA SEGUNDO TEIXEIRA DE PASCOAES

O luar e a consciência representam movimentos reflexos, que bateram de encontro a qualquer barreira indestrutível e ao voltar para trás, nos mostram então o perfil macerado sangrando luz...

Várias considerações se poderão tecer acerca deste parágrafo.
1 - A equiparação do surgimento da consciência ao de um fenómeno físico como o luar.
2 - A interpretação trágica da causa próxima de ambos: Um impedimento intransponível a uma realidade dinâmica anterior que sem esse obstáculo seguiria o seu curso.
3 - As marcas dessa tragédia naquilo que a seguir surgiu.
4 - Passando agora para a consciência, ela é neste caso indesligável da dor e porventura da tristeza.
Daí podemos concluir que tudo quanto tenha a marca superior da consciência será igualmente conotado com a dor radical que lhe é inerente: a arte, a religião, a filosofia, as vivências profundas daqueles que sendo homens se adentram mais que os outros no seu intimo e finalmente até um grupo que viva intensamente a natureza da consciência. Nas poesias que foi publicando em A Águia, este carácter matricial da dor surge que se poderia concluir do texto citado. "... a tudo à terra e ao céu me sinto preso. Vejo que a dor é o laço que me prende. Por isso a dor é a única alegria" e em seguida o âmbito daquilo que se deve à dor alarga-se para todas as coisas: "a dor é a virgem mãe que criou tudo" já antes no soneto "os meus olhos dolorosos" o poeta refere-se "à virgem da agonia, a mãe piedosa e triste da alegria". Essa mãe piedosa e triste é chamada antes "tristeza criadora". Há nestes dois poemas duas afirmações acerca da relação dor/alegria: A dor é alegria. A tristeza é mãe da alegria. Tristeza aqui como criadora pode considerar-se igualmente a dor aplicada ao sentimento principal do poeta. Predomínio da dor nos dois casos. Com efeito, verifique-se o motivo por que o poeta-filósofo, diz que a dor é a "única alegria": não é porque o afaste das coisas mas porque o prende a elas, tornando-se assim como a expansiva alegria incompatível com o isolamento. Predomínio da dor, portanto mesmo segundo aquele juízo aparentemente identificativo onde não seria possível a inversão simples. Portanto, mesmo quando mais tarde formular duma forma mais complexa a ideia de saudade em que uma das sínteses é a da dor com a alegria, não se trata de dois elementos iguais ou ao mesmo nível, trata-se de criador a dor com a criada alegria. Predomínio da dor portanto mas encarado também por aquilo que dela derivou. Síntese de dois elementos espirituais, se bem que derivados um do outro, ao contrário do que acontece em todas as outras sínteses com que se define a saudade.
Com efeito, a dor humana é espiritual e espiritualizante: Amor carnal, espiritualizado pela dor, contraposto a creio que também em síntese, com amor espiritual materializado pelo desejo . O mesmo deve-se observar-se quando se trata de comparar o mesmo binómio com espírito-matéria, desejo-lembrança, treva-luz, vidamorte . A diferença entre dor e alegria não é mesma nem é promocional com as outras. Se de todas se pode dizer que se digladiam, este verbo tem sentidos muitos diferentes, admitindo que a lembrança seja espiritual perante o desejo como material. A dor aparece assim valorativamente como aquilo que para alem das sequelas dolorosas se sintetiza com a não dor à qual deu origem. Se assim não for, a dor acarreta o pesadelo de si mesma como eternidade, como se declara num dos mais profundos artigos escritos na revista A Águia: “O Tempo” . Assim a dor parece dilatar o pontual presente vivido por cada homem. Mas mesmo naquele presente que a dor não dilata o homem sente-se ligado à sua dor ou então "faz-se notar" pelo próprio nada de que é feito. Teixeira de Pascoaes silencia aqui aqueles casos em que o prazer intenso faz esquecer o tempo. Será porque o inclui no nada que morre ou porque nesse caso o tempo desaparece, passando-se só do termo da vivência a ter consciência da duração passada? A consciência do presente é usualmente conjugada com a dor. Mas também neste caso se descobre segundo o que é, segundo a estreiteza e a dureza do que é. Só a seguir isso que foi presente duro, ao tornar-se passado se transforma em imagem libertadora de cada um. Por isso diz T
Pascoaes, o homem sonha libertar-se do que é ligando-se ao que foi ou ao que à de ser: Dolorosa incompatibilidade entre o homem e o tempo e que o leva a fugir do tempo para o tempo: ao passado pela lembrança que Pascoaes considerou espiritual, o futuro pelo desejo que Pascoaes considerou corporal material. E a desagregação daquela síntese desejada por Pascoaes para definir a saudade. Notar-se que ele não diz que o desejo de um homem é libertar-se rumo ao passado e ao futuro mas sim é isso o seu sonho, como se a dinâmica do sonho leva-se à sua realização sem passar pelo desejo. Pascoaes acaba por conotar esta libertação do presente temporal com a libertação do corpo. Libertar-se do corpo e libertar-se do tempo? De facto, matar o presente ficando com passado e futuro é procurar no tempo o não tempo. É ou ficar entalado entre a eternidade e o possível ou sobrevoá-los. Tudo isto para evitar a simbiose do momento presente e da dor, ou melhor da vivência presente como vivência do presente rumo à vivência do passado e do futuro a partir de um presente que não se quer vivenciar como tal. Tudo isto não mergulhar na dor como tal. Daí a necessidade de a emparceirar ou de considera-la como um sentir matricial, segundo a sua própria essência e quando isso for possível. Poderia perguntar-se se este texto sobre o tempo que afinal é sobre dor e tempo não seria um outro filão para chegar ao afloramento do que é a saudade na sua dimensão trágica que parece esquecida nas grandes definições - descrições que da mesma são dadas em artigos anteriores. Dor ínsita à profundidade da consciência perante a sua temporalidade de que não consegue libertar-se. Dor que mesmo no âmbito do tempo, cria pesadelos de eternidade.
Conotando-se com isto e com este desejo de fuga trágica pode referir-se à recusa total de uma dor eterna. Com efeito há uma outra hipotética dor que é recusada quando isolada de qualquer outro elemento positivo, a dor infernal em que certas igrejas cristãs acreditam. Recusar que ao mesmo tempo pode considerar-se uma das manifestações de anticatolicismo radical outras vezes afirmado no decorrer das intervenções do autor n’ A Águia. Trata-se da interpretação daquilo que sucedeu após a morte de Jean Valjean segundo a narrativa de Victor Hugo na sua obra "Os miseráveis". Após aquela morte contra o romance que sobre Paris apareceu um anjo enorme de asas abertas. Segundo a interpretação de Pascoaes seria "O próprio Satã redimido e levado do Inferno da sua revolta à beatitude, à pacificação da sua vitória"... "Satã novamente eleito e consagrado pelo esforço e pela sua dor.” . Como base desta visão da dor, encontram-se perspectivas antropológicas, cosmológicas e até metafísicas. Há com efeito um dualismo no homem que não pode deixar de ser motivo de sofrimento. É o espírito e a matéria, o espiritual e o corporal, se bem que ambos com a mesma origem cosmológica. A matéria e o Espírito. Esta relação é conflituosa. "A origem do corpo ensombra a Alma" . "O homem pode sonhar como espírito mas só pode agir como animal" . Desgarramento trágico na própria constituição do homem: "Corporalmente estamos muito longe da origem, espiritualmente a distância é pequeníssima" . Trata-se da longínqua origem miticamente expressa (Da sombra da origem). Mas a origem próxima, várias vezes Pascoaes aponta-a como sendo a matéria. "Carne, sonho, pedra, flor, pertencem a reinos diferentes. São a mesma matéria mas em diversos graus de evolução cósmica" . "Matéria e pensamento são a mesma energia em diversos graus de evolução" . Há nisto um caminho do menos para o mais. "Creio que o espírito é a esperança atingida da matéria onde ela se organiza e completa em suprema harmonia que a si mesma se ouve e se compreende" .
Uma origem ainda mais próxima do que a matéria cria no homem a vivência de um drama. "A caricatura é o riso amarelo da alma perante a sua origem e destino: o macaco e a morte" . E agora passemos para a mais anterior origem metafísica relacionada com a passagem do uno ao múltiplo. "Foi Deus que a inventou [a caricatura] a fim de quebrar a infinita monotonia da identidade originária, o Mesmo, esse deserto sem limites. Quando os outros pulularam do mesmo..." criou-se aquilo que ele chamou "sorriso de ironia" dos constitutivos do universo numa espécie perspectiva pessimista da pluralidade. Mas é essa pluralidade na sua relação com a origem metafísica apontada que explica a desarmonia do homem, a dor sem esquecer nunca que esta é espiritual. Tal multiplicidade originou a dualidade dos elementos "que desenham um íntimo perfil contraditório" .
O próprio Deus diz Teixeira de Pascoaes, deveria arrepender-se de ter originado a pluralidade constituída por indivíduos diferentes entre si. A individualidade implica a dor, a individualidade ou mesmo a individuação posterior a um estado prévio em que os homens viveram (misteriosamente) sem individuação. Ou seja há dor porque há multiplicidade e individualidade. Nós viveríamos com efeito felizes e libertos nesse estado em que "a alma se tornou a nossa alma" . É a isso que Pascoaes chamou "perder o paraíso". Àquela quebra da unidade total como raiz primeira metafísica da dor, sucede dir-se-ia que como seu reflexo a falta de unificação ou exclusão dos elementos principais da totalidade: trata-se do pensamento. O pensamento acerca do universo cientificamente considerado faz parte desse mesmo universo, ignorá-lo conduz à tragédia como afirma acerca de Manuel Laranjeira: ele
caiu (e foi a sua desventura) numa terrível ilusão de recente origem cientifica. Contemplou o universo e a vida como isolados do seu pensamento... porque o pensamento humano é que contempla o universo... é a última forma superior da sua evolução. ...a tragédia humana, uma forma de dizer a dor humana, leva à invenção de Deus. "O indivíduo contemplando as suas fraquezas e misérias cria espiritualmente um indivíduo liberto dessas fraquezas e misérias, isto é, um Deus. "E a sua vida fica a ser "uma tendência constante para esse mundo superior que ele criou". O mesmo se dá com as sociedades . Assim relativamente à dor (ligada à imperfeição humana) não só Deus é referido como criação do homem ou quando é tratado como se existisse, é apontado como ligado especialmente à dor humana como se viu naquela referencia à quebra da unidade. Nunca Deus é referido como aquele ser que pode valer ao homem na sua dor. Se se quiser tomar como tratando realidade, as afirmações de Deus como origem sobrepor-se-iam sem a negar à referência à matéria como origem física de todas as realidades mesmo humanas.
Mas a referencia a Deus sempre que aparece também pode ser perspectivada como mito referencial explicativo à maneira de Platão. "Se Deus existisse, duvidaria perpetuamente da sua divindade." Diz referindo-se à humildade de Tolstoi . É perceptível aqui uma atitude agnóstica ou ateia.

Da dor colectiva
É a propósito da atribuição da primeira grande guerra a Guilherme II que diz:
1. A guerra tem uma origem superior ao homem: a espécie.
2. Atribui-la apenas à vontade do Kaiser deriva da falta de visão.
3. Mas logo a seguir lembra outras entidades inventadas pelo homem para lhes atribuir a causa da guerra.
4. É aí que afirma: tudo isto é a dor humana a iludir-se, a pintar de branco a sua noite... "Este poder que tem o homem de dourar a sua miséria foi-lhe dado pela natureza como o golpe de Graça a um condenado."
5. No contexto parece que a atribuição da guerra ao Kaiser é mais um caso desta dor humana a iludir-se, como se iludiu antes atribuindo tal desgraça às feiticeiras e à sibila. Assim, a dor inerente ao homem mas agora como parte de uma colectividade parece vinda de algo invencível: com efeito, a espécie é dita irmã gémea do destino pois que não é apontada uma solução ou uma superação . Lembra-se a seguir a subordinação necessária dos homens a grandes ideais como condição de enfrentar a dor e a morte. Mas esta subordinação a altos ideais geradores de heroísmo tanto existe na guerra ofensiva como na guerra defensiva. Tal como nas tragédias Gregas a dor humana é superada apenas pela dignidade do próprio sofrimento. Existe aqui mais uma indicação de uma nova fonte da dor humana diferente daquelas que foram anteriormente indicadas mas subordinada às mesmas ou melhor com origem nas mesmas. Apesar disso é a que mais pessimismo acarreta.
Outra é a dor derivada de certo ambiente cultural denunciado para poder ser superado. "Se auscultarmos o estado actual da alma humana, logo se percebe que ela sofre e é triste no meio duma civilização indiferente" . Mas essa tristeza é susceptível de ser superada quer a nível nacional quer a nível internacional. Pascoaes aponta o êxito das conferências de Bergson em Paris, pensando na transformação espiritual que tais conferências produziriam. Mas há uma dor colectiva comunitária humana que pode ser considerada estrutural ou quase estrutural. É o caso da "dor russa que é um dos maiores impérios da dor humana" . E muito mais estrutural parece o que se refere ao "Génio Lusitano", se conotarmos a dor com a tristeza. "...Génio Lusitano, esse templo de tristeza erguido nos ermos, com a saudade lá dentro, a orar a um Deus menino” . Já não se trata daquela tristeza antes referida e lamentada, trata-se da tristeza integrada. Sempre que se diz que a humanidade sofre que as nações sofrem, trata-se do sofrimento de cada um dos seus componentes, de cada homem. Teixeira de Pascoaes teve o cuidado de o dizer para que não se pensasse que a colectividade sofre, que ela sente, como se o todo fosse uma super pessoa constituída por pessoas: "o homem de carne e osso é o único homem que verdadeiramente sofre sobre a terra conforme disse na sua extraordinária obra Miguel de Unamuno . É cada homem que sofre atingido no íntimo de si mesmo na sua individualidade e naquilo que define semelhantemente aos outros homens. Ora, o ser humano é definido por Pascoaes mais como um ser que sonha do que pela racionalidade . Definido assim, vemo-lo mais exposto à dor. Esta afirmação do sonho como constitutivo do homem tinha sido precedida por outra que não pode deixar de ser considerada de nuance pessimista. O homem é um ser que mente. Desilusão portanto com a definição clássica de animal racional . No decorrer no que foi escrevendo na revista A Águia, Teixeira de Pascoaes nunca se referiu à maneira de harmonizar as duas definições. De qualquer maneira, há nestas definições o desfasamento entre si e a realidade: negar conscientemente a realidade ou viver do que ainda não é realidade: nos dois casos está o sofrimento. Há outras modalidades de dor que naturalmente derivam de forma muito mediada daquelas raízes apontadas, e que se diriam dramáticas mas não trágicas. Toda a dor que derive de carências mas que podem ser preenchidas. Distingui-las assim não significa desprezo por elas mas simpatia e esperança. Embora não seja um poema expresso em A Águia poderá ser aqui citado. Trata-se da dor "que muda em prazer um bocado de pão... dor que um cobertor pode bem destruir. Dor de quem almoça e janta muito mal.” . Este predomínio da dor desta mensagem de Pascoaes que percorre A Águia significa antes de tudo um apelo à profundidade, numa recusa de uma visão puramente fenoménica. Dor a superar mas a apagar, é ter presente para além de ela própria sem nela se sumir como única
estesia ou como resignação que esqueça a tentativa de a superar agregando-a. É o elemento espiritual que não pode ser isolado. Como diz no comentário ao livro de Job, ela pode tornar-se na luta da criação espiritual contra o criador material , o Poema da dor torna-se transfiguração permitindo a acção do espírito que por seu lado teve a mesma origem do corpo. Estamos longe do que poderíamos chamar uma visão dolorista. Dor individual, dor colectiva que em ultima analise é individual inserem-se afinal no estatuto do homem que fazendo parte de um todo é uma excepção nos constituintes desse todo. Parecendo realidade acabada, a natureza é constituída por elementos inacabados que nunca chegam individualmente ao acabamento de si mesmos. Na natureza diz o pensador "Tudo é esboço”. Ora, o esboço-homem graças ao seu poder espiritual criador passa a existência a ver se consegue concluir, completar a sua pessoa .
Declarou Teixeira de Pascoaes em disputa com António Sérgio que apreciava mais afirmar do que raciocinar. Apesar disso sabemos que a meditação também lhe orientou o pensamento e que este embora surgido da reflexão sobre certos casos imediatamente ligados ao universal formam um todo dinâmico, um pensamento criativo e em borbotões onde é possível encontrar a coerência.
Ter-se-á notado nesta exposição aqui feita fez-se recurso a escritos em prosa e em poesia. É que estes não podem ser separados daqueles apesar da diferença de exposição.