Hoje, dia 6 de maio de 2009, os lobbies das empresas de telecomunicações (ISPs) estão de luto. A pressão de muitos cibernautas e o bom senso revelado à última hora pelos eurodeputados - nomeadamente pelo eurodeputados da Esquerda portuguesa que mudaram o sentido do voto à última hora - acabara, por fazer chumbar o "Pacote das Telecomunicações". A maioria dos eurodeputados concordaria que a alteração proposta iria de encontro aos direitos básicos dos cibernautas europeus.
O pacote incluía varias cláusulas altamente lesivas mas nem por isso tinha deixado de ser aprovado por todos os Estados-membros. A polémica clausula que permitia o corte do acesso à Internet, sem sequer haver a ordem de um juiz, bastando apenas que houvesse uma vaga e demasiado "interpretativa" "ameaça à segurança pública", isto é, o velho argumento do "terrorismo" reutilizado para reduzir as liberdades e direitos individuais.
Contudo, o pacote só não foi aprovado porque a maioria dos deputados não votou contra o Pacote, mas a favor de uma emenda ao mesmo que anularia a sua provisão mais polémica, precisamente aquela que possibilitava o corte de acesso sem aval judicial. Este "tecnicismo" levou ao chumbo do conjunto do pacote, já que este fora o produto de um acordo com o Conselho Europeu e agora terá que ser produzido novo acordo, já contendo a dita emenda.
Assim, ainda que o desejo de Sarkozy de cortar o acesso a quem quer que fosse suspeito de partilhar ficheiros protegidos por direitos de autor, sem autorização judicial tivesse sido negado, todo o resto do pacote permanece inalterado e após novo acordo com o Conselho de Ministros, regressará a plenário, sendo muito provavelmente aprovado! E entre este resto encontra-se o ponto central do Comunicado MIL Contra a divisão da Internet em "pacotes de serviços"!
Assim as pressões provenientes das empresas de telecomunicações, mas também da própria Comissão Barroso e do Conselho de Ministros que tinham alinhado docilmente com as primeiras e contra os interesses dos cidadãos europeus, foram por enquanto anuladas e o seu Pacote adiado... Os eurodeputados da ala esquerda do PE vão contudo apresentar uma serie de emendas provenientes de contactos de vários cidadãos. Boa parte destas referem-se à inclinação desreguladora (que toa bons resultados deu no setor financeiro...) do Pacote, reforçando estas emendas o conceito de "acesso à Internet" como um direito fundamental e protegido segundo tal e que os cibernautas não devem ser tratados como simples consumidores de um serviço comercial. A alternativa que era proposta pela Comissão permitia que as empresas dividissem o acesso em "pacotes de serviços" alegando "liberdade de escolha" e a "sã concorrência entre fornecedores", como se essa liberdade não existisse já, sem "pacotes" e sem que esse espartilhamento não levasse a uma nova cobrança por um acesso dividido que agora já existia, mas de forma gratuita.
Outro aspecto questionável entre as várias polémicas medidas deste "Pacote das Telecomunicações" é o reconhecimento às empresas da sua capacidade para prioritizar pacotes, isto é, para dar prioritizar a um dado de serviço sobre outro, por exemplo, tornar mais rápido a navegação na Web contra a visualização de filmes, o uso de clientes de BitTorrent ou VoIP, como o Skype. Estas medidas já são efetivamente conduzidas pela maioria dos operadores, por razoes "técnicas" mas de forma nunca assumida. Até agora, em que a Comissão deixa cair o conceito da "neutralidade de dados" e permite que os operadores decidam sozinhos o que é importante e o que não é, o que abre um perigoso precedente.
Contra este aspecto do Pacote (latente e não morto, recordemo-nos) o deputado Miguel Portas apresenta no seu site no PE uma das alterações propostas, segundo o princípio "de que os utilizadores finais devem poder aceder a - e distribuir - quaisquer conteúdos e utilizar quaisquer aplicações e/ou serviços de sua eleição, em conformidade com as disposições relevantes da legislação comunitária e com o direito substantivo e o direito processual nacionais." que anularia efetivamente a proposta divisão do acesso à Internet em pacotes de serviços.
A emenda proposta pelo PSE e pelo PPE/DE aclara ainda que "As medidas tomadas relativas ao acesso a ou à utilização de serviços e aplicações através de redes de comunicações electrónicas respeitarão os direitos e as liberdades fundamentais das pessoas singulares, inclusive no que diz respeito à privacidade, liberdade de expressão e ao acesso à informação e ao direito a um julgamento pronunciado por um tribunal independente e imparcial, estabelecido por lei e agindo nos termos de um processo equitativo, em conformidade com o artigo 6.° da Convenção Europeia para a Protecção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais." Sublinhamos aqui a "liberdade no acesso à informação" que se corretamente interpretada iria efetivamente impedir qualquer divisão do acesso em pacotes de serviços.
Desta feita, a pressão dos cibernautas foi determinante para o bloqueio deste Pacote, com todos os seus diversos aspectos negativos que incluía... Mas não foi (ainda) uma vitória. Longe disso. Os "lobos" da indústria continuam vigilantes e a Comissão Europeia e o Conselho de Ministros tiveram que engolir a emenda do corte de acesso sem mandato judicial, mas todo o resto irá regressar brevemente a Plenário no PE. Estejamos atentos e preparados para a próxima arremetida da "Europa dos Senhores" contra os seus cidadãos e a renovar toda a nossa pressão nas caixas de correio dos deputados europeus.
O "chumbo" expõe também a importância da existência de um órgão como o Parlamento Europeu - mais próximo dos cidadãos" que a solipsista e não-eleita Comissão Europeia que possa travar as suas cedências e compromissos com os grandes lobbies corporativos.
Fontes:
http://ultimahora.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1378935
http://www.miguelportas.net/blog/2009/05/05/internet-e-liberdade-em-debate-no-parlamento-europeu/
http://tek.sapo.pt/noticias/telecomunicacoes/corte_da_internet_compromete_pacote_das_telec_993090.html
8 comentários:
Bom trabalho, o teu, como sempre
Abraço
Concordo que se tenham que cerrar fileiras contra mais um ataque às liberdades, direitos e garantias do individuo. E uma luta que nao tem fim. No entanto é necessario termos cuidado com a mistura de ideais politicos (se é que ainda os ha) e questoes partidarias com aspectos que obrigam à independencia do pensamento nao sujeito a nenhum directorio. Por exemplo na questao do levantamento do sigilo bancario que este partido se bateu acerrimamente (aparentemente por questoes eleitoralistas), vai quanto a mim ser mais lesivo ao cidadao comum (que vera a sua vida completamente devassada e sem poder de facto para se defender em caso de injustiça) do que aqueles que a medida deveria pretensamente visar!
Por estes e outros motivos peço que o pensamento seja livre de todos e quaisqueres directorios, que seguem programas proprios e "estrangeiros" aos paises em que actua...
Clavis, grato por todo o trabalho (e, no que me diz respeito, à chamada de atenção para isto).
Mas se o problema do 'corte imposto sem um juiz' se explica por si mesmo, talvez devêssemnos insistir na explicação do que está em causa nos 'pacotes'... Aparentemente, as pessoas andam felizes com os MEOs, não?
Quanto ao partido em causa, temê-lo-ei mais quando o vir cheio de advogados epecialistas em direito fiscal e financeiro...
Quanto ao partido em causa, e sendo isso verdade (Casimiro), direi depois umas coisas. Embirro particularmente com o Bloco...
Bom trabalho, Rui.
Forte abraço.
Mais uma vez refiro que tal como a religião e espiritualidade, a partidocracia e o pensamento político não são a mesma coisa. Um pertence ao directório/instituição que ao longo da sua existência irá fugir inexoravelmente aos melhores princípios pelos quais foi criada; outra é aquilo que cada um sente, aquilo que cada um com as suas limitações consegue apreender da utópica Verdade.
Não esquecer que nós somos naturalmente de direita ou de esquerda consoante o momento histórico em que tomamos consciência de nós próprios (final da adolescência, a idade do contra e da irreverência) e que com o tempo mudamos de polaridade ou ficamos pelo chamado "centrismo". Assim aqueles que viveram a ditadura de direita na sua adolescência tornaram-se militantes de esquerda (mais ou menos voluntariosos e participativos) e que com o tempo harmonizaram essa irreverência tornando-se conservadores e passando para a direita. Aqueles que passaram pelos abusos do PREC (como conheci ontem um) na sua adolescência tornaram-se de direita (uma espécie de esquerda da esquerda...) e hoje curiosamente invertem esse movimento tornando-se ou "centristas" ou mesmo de esquerda. Para mim, que sou leigo nestas matérias a direita corresponde conceptualmente ao conservadorismo e à tradição mais imobilista e a esquerda à irreverência e à evolução disruptiva. Isto encaixa nas fases de crescimento do ser humano.
Agora os partidos políticos de ramificações internacionais (grupos de intervenção com directórios pan-nacionais), souberam ocupar os espaços que chamo mentais ou ideológicos, para fins particulares e que levam ao pensamento único, o do Directório.
Independentemente dos partidos em causa, todos eles são limitações (para não dizer perigosos aríetes atirados às massas com efeitos amplificadores... e que o diga Hitler, mestre na propaganda) à liberdade do pensamento e às Democracias Participativas. Por isso qualquer partido (muito menos os de esquerda para os quais Lusofonia é uma forma de Imperialismo escondido) é conceptualmente adverso em meu ver à liberdade de pensamento de projectos como o nosso.
Peço desculpa pela extensão do comentário e pelo facto de não estar directamente associado ao tema do artigo!
Caro Eurico, comentário interessantíssimo - concordo e discordo de muito.
A direita (uma certa direita) como 'esquerda da esquerda', comprendida esta frese de uma certa forma, só por si justificava um debate fascinante.
Um projecto como o nosso não se pode confundir com os vários tentáculos do pensamento único - mas não pode também deixar de reflectir seriamente sobre o tema que aqui traz. Eu tenho pena de que ele só seja aflorado aqui com luvas de cetim... Como mais dois temas, que são o do cristianismo (única religião aqui quase nunca referida) e o da 'moral' (leia-se os antigos 'costumes').
Ai que estamos a milhas do tema do post. Nisto, lusófonos até à medula. Não, não somos europeus...
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