Um projecto interessante: a busca do(s) rosto(s) da globalização. Da autoria do fotógrafo sul-africano Mike Mike. Apresentado no site: www.faceoftomorrow.com. Lá podemos encontrar estudos sobre o "rosto do futuro" de três cidades lusófonas: Lisboa, S. Paulo e Rio de Janeiro. Estes estudos são elaborados a partir duma série de fotografias tiradas em locais públicos de cada uma das cidades, de forma a mostrar o resultado fisonómico do "caldeirão étnico" que cada uma dessas cidades representa.
É significativo o facto do artista provir de um dos países que melhor corporificou o racismo de Estado, para além da Alemanha nazi, o Estado de Israel (os relatórios sobre as atrocidades cometidas na recente campanha em Gaza estão para além do macabro) e a Austrália (que usou até há bem pouco tempo tabelas de identificação racial, chamemos-lhe assim, importadas da Alemanha nazi para servirem de base à admissão de imigrantes. O tom de pele era um dos factores de discriminação que, por irónico que possa parecer, levou à rejeição de muitos imigrantes portugueses. Ironia da história, então, o problema do buraco do ozono nas latitudes austrais). A lista de Estados que elevaram a biopolítica à sua quase expressão máxima, infelizmente, não se fica por aqui.
Ora o processo de globalização parece estar a delir as fronteiras desta fantasmagoria antropológica que ceifou, talvez contando muito por baixo, mais de um bilião de vidas no último século. O Holocausto insere-se num oceano muito vasto feito do sangue resultante do fratricídio que é, inegavelmente, a imagem de marca do século XX, o século caínico por excelência.
E o que dizer do século XXI, essa abstracção da mitomania histórica que, assente no progresso das tecnologias da informação e da comunicação,nos é apresentado como o alvor duma nova era? Mas sê-lo-á mesmo? Não estará o cenário do mundo globalizado, sob o diáfano manto da imagética associada ao anti-mitema macluaniano da "aldeia global", a dissimular, a esconder, uma ainda maior hecatombe humanitária que nenhuma edénica esperança debitada mediaticamente, à hora certa, Urbi et Orbi, ou qualquer outra investida do "Bem", consegue delir ou erradicar da carne e das vidas dos seres humanos sacrificados, sem apelo nem piedade, simplesmente porque as suas vidas perderam, ou nunca adquiriram, qualquer valor de uso para o mega-capital que hoje impera sobre o mundo.
O Império do ilusionismo axiológico, um abcesso moral pejado de valores (nunca se "valorizou" mais os valores como hoje em dia, mas talvez nunca se tenha vivido uma tamanha septicemia axiológica, o mundo antes chamado "civilizado" agoniza com esta hipertrofia das normas normalizadoras), valores esses em muitos casos incompossíveis, mas, não obstante, forçados a uma massificação agregadora, que passa pela aparente dissonância do preservativo em relação à preservação de certos sistemas morais, afirmados sob o signo da busca duma assepsia que, na verdade, é só virtual.
No fundo, a globalização instaura uma boa consciência planetária, assente num colossal conjunto de mecanismos de dissuasão que impede o acesso das massas, chamemos-lhes assim, à consciência desta situação antropológica em que hoje vivemos. Mesmo das massas "ilustradas", bem entendido.
A procura do "rosto" da globalização inscreve-se neste panorama idiossincrático: a simbologia do rosto está indelevelmente ligada à categoria metafísica da identidade na sua relação com os movimentos espirituais de apropriação e, também, da práxis da diferença (que se estende da conceptualização e da expressão idiomática e actuacional ao nível das instâncias linguísticas até ao domínio da acção, não esquecendo a película, digamos, fotossensível, das atitudes que, de facto, constitui a antecâmara da constituição das crenças).
Este projecto do "rosto do amanhã" parece plasmar a erosão das diferenças para instaurar uma identidade, paraláxica, insuportável no concreto da vida, mas suficientemente sustentável em termos semiósicos: instaura sentido, mesmo que parasitário e alienante.
E o carácter imotivado da intenção estética que preside a este projecto, contrariamente ao que poderia parecer, está de acordo com esta vasta onda do supra-sentido que alastra pelo mundo. Há muito de imotivado nestes processos a que chamamos globalização, mesmo a Crise: o jogo por excelência do mega-capitalismo, o seu garante de sustentabilidade. Cria a ilusão de que os governos, agora, governam mais, uma vez que intervêm nos sistemas bancários e estão activamente em busca duma nova estrutura normativa para o sistema financeiro global, finalmente "moralizável", "domesticável", sob a vontade "soberana" dos Estados, alguns deles, os mais "poderosos", conglomerados em comanditas, completamemente desconexas com o Direito Internacional, dos "G8", ou dos "G20" ou de qualquer outra quimera histórica que se lembrem de inventar, talvez plasmada dos Conselhos europeus ou de qualquer outra aberração da Europa que hoje temos.
Pura ilusão: este novo afã regulador é o casulo que dará guarida à crisálida do que nascerá daquilo a que tenho chamado aqui "mega-capital". Enfim, veremos a mercantilização do horizonte espiritual pela tomada do poder que resta aos Estados, transformados em sistema de transformação de resíduos da actividade das mega-corporações (para lidar com o desemprego, a educação dos novos "servos" do sistema, a saúde desses servos e dos "inúteis" que consomem recursos através do sistema de pensões que deveriam estar ao serviço deste Império capitalista amoral). A soberania dissociada da cidadania, esta transformada apenas numa alegação identitária sem poder "real", mero pretexto para a legitimação da mais opressora das tiranias.
O rosto expurgado de fisionomia, exposto sob o auspício duma identidade virtual, hiper-real, no sentido em que Baudrillard emprega estes termos, a insignificância da significação que se esgota no processo mesmo de purificação sémica, essa mesma que exorciza o monstro que, em cada rosto significativo, espreita e, na sua oclusão significante, mostra o inumano que, dentro da subjectividade racionalizada do homem ocidental, é a inapropriável excedência do ser que se deseja errante e descontínuo, obrigado pela neurose da ordem e da normalidade a ser um e o mesmo, ainda quando a alteridade o tomou de assalto e o fez transbordar as fronteiras da sua couraça egótica, esse exosqueleto que nos permite a sobrevivência social.
Mas esta busca da nova identidade que subjaz às cidades do mundo globalizado, elas próprias um resumo do mundo, um mo(n)struário da diversidade, tem alguns aspectos dignos de reflexão. Não há uma proximidade semântica entre a palavra "fronte" e a palavra "fronteira"? Embora o termo "fronteira" evoque, de imediato, o "confronto" territorial e toda a semântica histórica da invasão e da guerra entre de enxurrada no horizonte de qualquer discussão ou reflexão em torno dos limites fronteiriços, faz sentido colocar a questão de saber se os conglomerados sócio-culturais em que hoje se constrói a sociedade, em termos práxicos, o viver-com e em relação-a outros, podem elevar-se em termos espirituais a ponto de considerarmos que ganham uma fisionomia e se, em certos momentos históricos, essa fisionomia pode entre-expressar-se nos rostos de cada um dos indivíduos em inter-relação. Ou seja, poderá o rosto elevar-se a categoria política e espiritual? Levinas explora a dimensão ético-metafísica do rosto, assumindo-o como o horizonte de presentificação do Infinito, o derradeiro espaço da verdadeira confrontação: o encontro, que se dá no reconheciemento e na auto-descoberta no e através do outro, na sua alteridade identificante. Poderá, indo mais longe, considerar-se o rosto como o centro duma diacosmese verdadeiramente transfiguradora da persona que hoje incarnamos e do mundo ao qual pertencemos, agora, neste arrabalde da História em que os (des)situamos?
Por outras palavras: é possível a Frátria? ou, afundando-nos semanticamente na tematização de Eudoro de Souza em torno do termo 'diacosmese': é possível assumirmos o divino em nós, na nossa ékstasis existencial, na transbordância do Íntimo na parousia do Encontro?
E isso pode ser pensado sob a luz (e aqui entra a lusofonia) duma cidadania plena, em que a fonte da legitimidade e da soberania seja cada homem, elevado à condição de senhor de si e do mundo, cada homem, seja qual for a sua origem étnica e geográfica, respeitado na sua condição de impassível de ser subjugado a um poder maior do que a sua própria vontade. Uma sociedade assente na criatividade e na elevação de cada homem ao pleno usufruto de si próprio. Uma sociedade não mais refém das fantasmagorias que transformaram a História no logradouro da miséria e da morte encaradas como forças cegas e indomáveis.
A actual exportação de prisioneiros de Guantánamo deve fazer-nos pensar no que se procura legitimar com esse gesto de terrorismo político: quem merece um tratamento assim? Talvez nem o pior dos terroristas. Pode este gesto, aparentemente liberal e prenunciador duma nova forma de fazer política, legitimar a mostruosidade que constitui a criação desse espaço de detenção no limbo da actual ordem jurídica mundial? Conseguirímos olhar nos olhos esses homens e suportarímos a nossa refracção especular nos seus olhos?
Poderá o rosto, ou a fisionomia, substituir o conceito de fronteira? Poderão os homens abolir a escravatura identitária em que se têm encerrado e que foi responsável por quase todas as guerras até hoje?
Cabe aqui a citação dum excerto luminoso dum sermão de Padre António Vieira: "Tempos houve, em que os demónios falavam, e o mundo os ouvia; mas depois que ouviu os políticos, ainda é pior o mundo"(sermão do SS. sacramento, 1645).
Uma política de rosto humano... deve começar aqui, no local onde vivemos, na forma como assumimos eticamente a relação com os outros, recusando qualquer forma de discriminação e de diminuição do que há de insubjugável em cada ser humano. Talvez se consiga elevar a política a um estatuto espiritual, o da uni-diversidade e do reconhecimento de que o que torna os povos verdadeiras unidades com sentido antropológico é eles constituírem-se como espaços de inter-relação fraterna, abertos a todos e a cada ser humano, assumindo a cultura como o que verdadeiramente une os homens e os coloca no centro da vida política, a vida que vai além dos constrangimentos da geografia e da biologia.
E este pode ser, também , o caminho da dissolução da ilusão antropolátrica. Isto porque os animais também têm rosto, se bem que o seu seja um rosto total, sem dissimulação e sem que se assuma como a efígie do interesse e da voracidade anuladora do outro. Um rosto imune à inveja.
É significativo o facto do artista provir de um dos países que melhor corporificou o racismo de Estado, para além da Alemanha nazi, o Estado de Israel (os relatórios sobre as atrocidades cometidas na recente campanha em Gaza estão para além do macabro) e a Austrália (que usou até há bem pouco tempo tabelas de identificação racial, chamemos-lhe assim, importadas da Alemanha nazi para servirem de base à admissão de imigrantes. O tom de pele era um dos factores de discriminação que, por irónico que possa parecer, levou à rejeição de muitos imigrantes portugueses. Ironia da história, então, o problema do buraco do ozono nas latitudes austrais). A lista de Estados que elevaram a biopolítica à sua quase expressão máxima, infelizmente, não se fica por aqui.
Ora o processo de globalização parece estar a delir as fronteiras desta fantasmagoria antropológica que ceifou, talvez contando muito por baixo, mais de um bilião de vidas no último século. O Holocausto insere-se num oceano muito vasto feito do sangue resultante do fratricídio que é, inegavelmente, a imagem de marca do século XX, o século caínico por excelência.
E o que dizer do século XXI, essa abstracção da mitomania histórica que, assente no progresso das tecnologias da informação e da comunicação,nos é apresentado como o alvor duma nova era? Mas sê-lo-á mesmo? Não estará o cenário do mundo globalizado, sob o diáfano manto da imagética associada ao anti-mitema macluaniano da "aldeia global", a dissimular, a esconder, uma ainda maior hecatombe humanitária que nenhuma edénica esperança debitada mediaticamente, à hora certa, Urbi et Orbi, ou qualquer outra investida do "Bem", consegue delir ou erradicar da carne e das vidas dos seres humanos sacrificados, sem apelo nem piedade, simplesmente porque as suas vidas perderam, ou nunca adquiriram, qualquer valor de uso para o mega-capital que hoje impera sobre o mundo.
O Império do ilusionismo axiológico, um abcesso moral pejado de valores (nunca se "valorizou" mais os valores como hoje em dia, mas talvez nunca se tenha vivido uma tamanha septicemia axiológica, o mundo antes chamado "civilizado" agoniza com esta hipertrofia das normas normalizadoras), valores esses em muitos casos incompossíveis, mas, não obstante, forçados a uma massificação agregadora, que passa pela aparente dissonância do preservativo em relação à preservação de certos sistemas morais, afirmados sob o signo da busca duma assepsia que, na verdade, é só virtual.
No fundo, a globalização instaura uma boa consciência planetária, assente num colossal conjunto de mecanismos de dissuasão que impede o acesso das massas, chamemos-lhes assim, à consciência desta situação antropológica em que hoje vivemos. Mesmo das massas "ilustradas", bem entendido.
A procura do "rosto" da globalização inscreve-se neste panorama idiossincrático: a simbologia do rosto está indelevelmente ligada à categoria metafísica da identidade na sua relação com os movimentos espirituais de apropriação e, também, da práxis da diferença (que se estende da conceptualização e da expressão idiomática e actuacional ao nível das instâncias linguísticas até ao domínio da acção, não esquecendo a película, digamos, fotossensível, das atitudes que, de facto, constitui a antecâmara da constituição das crenças).
Este projecto do "rosto do amanhã" parece plasmar a erosão das diferenças para instaurar uma identidade, paraláxica, insuportável no concreto da vida, mas suficientemente sustentável em termos semiósicos: instaura sentido, mesmo que parasitário e alienante.
E o carácter imotivado da intenção estética que preside a este projecto, contrariamente ao que poderia parecer, está de acordo com esta vasta onda do supra-sentido que alastra pelo mundo. Há muito de imotivado nestes processos a que chamamos globalização, mesmo a Crise: o jogo por excelência do mega-capitalismo, o seu garante de sustentabilidade. Cria a ilusão de que os governos, agora, governam mais, uma vez que intervêm nos sistemas bancários e estão activamente em busca duma nova estrutura normativa para o sistema financeiro global, finalmente "moralizável", "domesticável", sob a vontade "soberana" dos Estados, alguns deles, os mais "poderosos", conglomerados em comanditas, completamemente desconexas com o Direito Internacional, dos "G8", ou dos "G20" ou de qualquer outra quimera histórica que se lembrem de inventar, talvez plasmada dos Conselhos europeus ou de qualquer outra aberração da Europa que hoje temos.
Pura ilusão: este novo afã regulador é o casulo que dará guarida à crisálida do que nascerá daquilo a que tenho chamado aqui "mega-capital". Enfim, veremos a mercantilização do horizonte espiritual pela tomada do poder que resta aos Estados, transformados em sistema de transformação de resíduos da actividade das mega-corporações (para lidar com o desemprego, a educação dos novos "servos" do sistema, a saúde desses servos e dos "inúteis" que consomem recursos através do sistema de pensões que deveriam estar ao serviço deste Império capitalista amoral). A soberania dissociada da cidadania, esta transformada apenas numa alegação identitária sem poder "real", mero pretexto para a legitimação da mais opressora das tiranias.
O rosto expurgado de fisionomia, exposto sob o auspício duma identidade virtual, hiper-real, no sentido em que Baudrillard emprega estes termos, a insignificância da significação que se esgota no processo mesmo de purificação sémica, essa mesma que exorciza o monstro que, em cada rosto significativo, espreita e, na sua oclusão significante, mostra o inumano que, dentro da subjectividade racionalizada do homem ocidental, é a inapropriável excedência do ser que se deseja errante e descontínuo, obrigado pela neurose da ordem e da normalidade a ser um e o mesmo, ainda quando a alteridade o tomou de assalto e o fez transbordar as fronteiras da sua couraça egótica, esse exosqueleto que nos permite a sobrevivência social.
Mas esta busca da nova identidade que subjaz às cidades do mundo globalizado, elas próprias um resumo do mundo, um mo(n)struário da diversidade, tem alguns aspectos dignos de reflexão. Não há uma proximidade semântica entre a palavra "fronte" e a palavra "fronteira"? Embora o termo "fronteira" evoque, de imediato, o "confronto" territorial e toda a semântica histórica da invasão e da guerra entre de enxurrada no horizonte de qualquer discussão ou reflexão em torno dos limites fronteiriços, faz sentido colocar a questão de saber se os conglomerados sócio-culturais em que hoje se constrói a sociedade, em termos práxicos, o viver-com e em relação-a outros, podem elevar-se em termos espirituais a ponto de considerarmos que ganham uma fisionomia e se, em certos momentos históricos, essa fisionomia pode entre-expressar-se nos rostos de cada um dos indivíduos em inter-relação. Ou seja, poderá o rosto elevar-se a categoria política e espiritual? Levinas explora a dimensão ético-metafísica do rosto, assumindo-o como o horizonte de presentificação do Infinito, o derradeiro espaço da verdadeira confrontação: o encontro, que se dá no reconheciemento e na auto-descoberta no e através do outro, na sua alteridade identificante. Poderá, indo mais longe, considerar-se o rosto como o centro duma diacosmese verdadeiramente transfiguradora da persona que hoje incarnamos e do mundo ao qual pertencemos, agora, neste arrabalde da História em que os (des)situamos?
Por outras palavras: é possível a Frátria? ou, afundando-nos semanticamente na tematização de Eudoro de Souza em torno do termo 'diacosmese': é possível assumirmos o divino em nós, na nossa ékstasis existencial, na transbordância do Íntimo na parousia do Encontro?
E isso pode ser pensado sob a luz (e aqui entra a lusofonia) duma cidadania plena, em que a fonte da legitimidade e da soberania seja cada homem, elevado à condição de senhor de si e do mundo, cada homem, seja qual for a sua origem étnica e geográfica, respeitado na sua condição de impassível de ser subjugado a um poder maior do que a sua própria vontade. Uma sociedade assente na criatividade e na elevação de cada homem ao pleno usufruto de si próprio. Uma sociedade não mais refém das fantasmagorias que transformaram a História no logradouro da miséria e da morte encaradas como forças cegas e indomáveis.
A actual exportação de prisioneiros de Guantánamo deve fazer-nos pensar no que se procura legitimar com esse gesto de terrorismo político: quem merece um tratamento assim? Talvez nem o pior dos terroristas. Pode este gesto, aparentemente liberal e prenunciador duma nova forma de fazer política, legitimar a mostruosidade que constitui a criação desse espaço de detenção no limbo da actual ordem jurídica mundial? Conseguirímos olhar nos olhos esses homens e suportarímos a nossa refracção especular nos seus olhos?
Poderá o rosto, ou a fisionomia, substituir o conceito de fronteira? Poderão os homens abolir a escravatura identitária em que se têm encerrado e que foi responsável por quase todas as guerras até hoje?
Cabe aqui a citação dum excerto luminoso dum sermão de Padre António Vieira: "Tempos houve, em que os demónios falavam, e o mundo os ouvia; mas depois que ouviu os políticos, ainda é pior o mundo"(sermão do SS. sacramento, 1645).
Uma política de rosto humano... deve começar aqui, no local onde vivemos, na forma como assumimos eticamente a relação com os outros, recusando qualquer forma de discriminação e de diminuição do que há de insubjugável em cada ser humano. Talvez se consiga elevar a política a um estatuto espiritual, o da uni-diversidade e do reconhecimento de que o que torna os povos verdadeiras unidades com sentido antropológico é eles constituírem-se como espaços de inter-relação fraterna, abertos a todos e a cada ser humano, assumindo a cultura como o que verdadeiramente une os homens e os coloca no centro da vida política, a vida que vai além dos constrangimentos da geografia e da biologia.
E este pode ser, também , o caminho da dissolução da ilusão antropolátrica. Isto porque os animais também têm rosto, se bem que o seu seja um rosto total, sem dissimulação e sem que se assuma como a efígie do interesse e da voracidade anuladora do outro. Um rosto imune à inveja.
2 comentários:
o rosto do dia depois da globalização
Paulo, bem vindo de volta. As tuas intervencoes valem ouro.
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