A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
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Donde vimos, para onde vamos...

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segunda-feira, 22 de dezembro de 2008

O nosso presente de Natal: um texto de Dalila Pereira da Costa...

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Religião Pré-Histórica*

Contemplemos esta religião, tal como nos surge nas suas imagens[1] na margem esquerda do rio Douro, no Vale do Côa, gravadas durante o Paleolítico Superior, em toda sua verdade, grandeza e solenidade; “arte da luz”, contemporânea da “arte das trevas”, da gruta do Escoural em Montemor-o-Novo.
Vale do Côa, apresentando-se como exemplo capital desta religião, não só na perspectiva nacional, mas ainda e sobretudo na perspectiva internacional, como religião cultuando a animalidade na sua divindade, perante a humanidade na sua profanidade: então como sociedade da caçadores-recolectores, seus humildes adoradores.
Para nós hoje nesta actualidade, uma total reconversão de perspectiva (no círculo de conhecimento: de quantos graus beirando a impossibilidade) será necessário praticar numa nossa contemplação destas imagens sagradas. Pois esta religião existiu em tempos remotos, quando os homens viviam unidos aos animais numa unidade agora para nós desconhecida; e ainda e sobretudo na qual não existia superioridade sua em relação aos animais, mas sim inferioridade: Homens já nossos semelhantes antropologicamente, como homo sapiens sapiens: então seus humildes adoradores num culto prestado.
Nesta remota liturgia, e tão longamente traçada nestas margens durienses, as imagens dos animais, como ícones, são as preponderantes, apresentando-se em tamanho grande e realismo rigoroso, perante essas outras dos homens (quando existem), como secundárias, de proporções diminutas e só esquemáticas, excepto quando da representação do sacerdote, o xamã, como eleito intermediário entre a força do divino e o humano.
Assim, nessa contemplação actual desta fascinante liturgia do Vale do Côa, urgirá uma inversão de planos após milénios, praticada pelos homens; planos tanto ontológicos e gnoseológicos, mormente do foro psicológico, como tendo em conta todos os esquemas praticados por nós até à actualidade.
Houve os tempos do paganismo, houve muito depois a verdade declarada e doada do cristianismo, o homem criado à imagem do Criador; após o teocentrismo da Idade Média, o antropocentrismo do Renascimento e no séc. XIX, Comte divinizando a humanidade; longo caminho no Ocidente de distanciação da humanidade perante a animalidade. O franciscanismo vindo como uma forma de cristianização do paganismo numa aproximação dos homens perante os animais.
Outro problema, e central, que se porá, é a existência indissolúvel nesses tempos arcaicos, da arte e da religião, como verdade declarada; e todo estranha a qualquer e possível concepção aplicada por nós a esses tempos, da arte pela arte. Porque o que então existiu seria uma arte de essência e utilização mágico-religiosa, impregnando todos esses solenes santuários dedicados ao culto dos animais, como ícones do sagrado: Altamira, Lascaux, Niaux, Parpallo (Valência), Escoural, Vale do Côa…
Religião que e já desde então terá ao longo de seu ritual um centro criador e justificador superior: o sacrifício.
E que assim permanecerá desde as origens primeiras da humanidade, na história das religiões, até à actualidade; sob as diferentes formas de sua progressão e mutações. Sacrifício trazendo em si necessariamente todo o terror do Mistério na sua revelação derradeira, como numinoso, o que está para além de todo o apreensível pelo pensamento racional humano: misterium tremendum (R. Otto).
Será o que se anuncia ou suspeita somente, e abertamente se declara nesses cenários do Vale do Côa, quando um animal se mostra ferido pelo caçador, ou já caindo no abismo da morte: tal as imagens das páginas 139 e 137.
Mistério em toda sua força terrível, presidido pelo xamã, sempre presente com seus animais auxiliares, ave ou cavalo, a eles identificado em momentos extáticos de vida-morte. Tal a possível figura antropomórfica de cavalo na gruta do Escoural.
E em supremo terror, o xamã na gruta de Lascaux, como suprema dramatização: ao fundo do poço um bisonte morrendo, suas entranhas espalhadas e assistido necessariamente no seu sacrifício pelo xamã: porque num momento de vida-morte. A captura e morte do animal pelo caçador no Vale do Côa não pode ser vista hoje por nós na nossa concepção de todo dessacralizada, reduzida ao mero acto quotidiano de alimentação, pois que ultrapassando-o, no seu próprio nível transcendente do sagrado.
Note-se ainda que, no sacrifício, há uma participação, usufruição presente da divindade do animal morto, de carácter místico, como ágape-festa: usufruição presente da divindade do animal morto pelo caçador. Na liturgia do Vale do Côa, este profundo sentido será agora por nós inatingível. Os milénios que nos separam do Paleolítico superior (40 000-8 000 a. C.) serão por nós inultrapassáveis pela nossa consciência.
Nem mesmo atingível será por nossa consciência o mais importante que constituirá o fundo do testemunho desses homens nossos semelhantes, como remoto caçadores: o sentimento de estado de criatura em relação à divindade dos animais.
Eis o que constituirá um dos aspectos do sagrado da liturgia que agora e ainda por nós se poderá contemplar nas suas imagens do Vale do Côa, como religião da Pré‑História.
Será legítimo que a possamos denominar, a esta liturgia, um hino à animalidade?
E ainda outra pergunta haverá, então e fazendo parte da história das religiões: o culto aos mortos, vindo já da época do homem de Neandertal (Paleolítico médio), e culto persistindo intocável até à nossa actualidade, como um dos mais profundos da humanidade – está já primitivamente formulado e referido também aos animais? Esta será a pergunta mais perturbante que se poderá formular acerca da religião Pré-Histórica.


Porto, 28-11-2008

Dalila Pereira da Costa

[1] António Martinho Baptista, No tempo sem tempo: a arte dos caçadores paleolíticos do Vale do Côa: com uma perspectiva dos ciclos rupestres pós-glaciares, Vale do Côa, Parque Arqueológico, 1999.

* Texto a ser publicado no 3º número da NOVA ÁGUIA.

1 comentário:

José Pires F. disse...

Aproveito então, este excelente texto da Dalila, para desejar um maravilhoso Natal para quem é de Natal. Um Natal de retemperação.
E, se tiveres de correr por algo, que seja pelo amor e sua eterna força, pela raiz vibrante da paixão que desagua nas palavras que estão dentro de ti, pela alegria de um coração a dançar, pelas pessoas que te gostam de ver rir, pelo doce de um beijo, pela saudade daquele abraço que te forra a memória e escorre qual rio, pela paz de uma paisagem de mil cores no meio do nada, por uma lágrima da lua, o perfume da rosa ou a cor do mundo que se dá, que se revela na sua verdade com um sorriso de esperança.

Para 2009, faço votos para que te consigas livrar daquelas acções de desmedida e mentirosa tendência que ninguém quer, que saibas rir quando te falarem da fereza da competitividade, que não te chegue aquele vendaval que dá pelo nome de crise e fabrica demónios de carência, que passes ao lado dos downsizing de fronte alheada e vaga e tenhas mesa farta e um pote de ouro no recôndito do teu lar, que nunca conheças a sanhuda face do outsourcing ou a dos recibos verdes e, finalmente, que as reduções de custos e a maldade milenta das habilidades sinergéticas, as leve o ermo vento como sombras do passado.

Longa vida à Nova Águia.