A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
Sede Editorial: Zéfiro - Edições e Actividades Culturais, Apartado 21 (2711-953 Sintra). 
Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

Donde vimos, para onde vamos...
Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

Onde temos ido: Mapiáguio (locais de lançamentos da NOVA ÁGUIA)

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terça-feira, 16 de setembro de 2008

Lusofonia


Pelo sonho é que vamos,
Comovidos e mudos.
Chegamos? Não chegamos?
Haja ou não frutos,
Pelo Sonho é que vamos.

Basta a fé no que temos.
Basta a esperança naquilo
Que talvez não teremos.
Basta que a alma demos,
Com a mesma alegria,
ao que é do dia-a-dia.

Chegamos? Não chegamos?

-Partimos. Vamos. Somos.

Sebastião da Gama
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São Meus Estes Rios

São meus estes rios
que buscam caminho
rastejando entre luar e silêncio,
sombra e madrugada,
até ao seu fim marítimo.

A minha alma está neles,
líquida e sonora
como a água entre o quissange das pedras,
o anoitecer nas fontes.

Tenho rios vermelhos e quentes
na minha dimensão física,
rios remotos, remotos como eu.

Manuel Lima
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O último poema


Assim eu quereria o meu último poema.
Que fosse terno dizendo as coisas mais simples e menos intencionais
Que fosse ardente como um soluço sem lágrimas
Que tivesse a beleza das flores quase sem perfume
A pureza da chama em que se consomem os diamantes mais límpidos
A paixão dos suicidas que se matam sem explicação.

Manuel Bandeira
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Hoje volto a ter alunos.

É um dia muito feliz para mim.

Mais logo vou poder entrar nas salas de aula repletas. E o Ministério da Educação está cada vez mais pródigo ao satisfazer-me o desejo de ter alunos, este ano vou ter mais alunos por turma do que jamais tive. O que significa que as condições de ensino nas nossas escolas estão cada vez melhores, graças ao visionarismo deste reinante socratismo com que se nos embelezam os telejornais.

Na escola sou um guerrilheiro. Procuro cativar os alunos para que se vivam. O que tem efeitos perversos. Mas namorar o amanhã é uma coisa muito estranha.

E também o é não chumbar alunos. Nas minhas turmas quase não há negativas. Por mais que eu tente. E Deus sabe como eu tento. Não sou, portanto, um bom professor.

Mas também ninguém sabe como é que eu entro na sala de aula. Não saberei viver se souber que nunca mais entrarei numa sala de aula. Como poderei, então, experienciar o infinito?

Mas hoje volto a ter alunos e vou poder apresentar-lhe uma ficha, logo na primeira aula:

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A vida vivida

Esta é a história de um homem a quem eu definiria como um pesquisador.

Um pesquisador é alguém que busca; não necessariamente alguém que encontra. Tão-pouco é alguém que, necessariamente, saiba o que anda a buscar. É simplesmente alguém para quem a vida é uma busca.

Um dia, o pesquisador sentiu que devia ir até à cidade de Kamir. Tinha aprendido a respeitar rigorosamente aquelas sensações que vinham de um lugar desconhecido. Por isso deixou tudo e partiu.

Depois de dois dias de marcha pelos caminhos empoeirados, avistou, ao longe, Kamir. Um pouco antes de chegar à povoação, chamou-lhe vivamente a atenção uma colina à direita da azinhaga. Estava atapetada de um verde maravilhoso e tinha uma grande quantidade de árvores, pássaros e flores encantadoras. Estava inteiramente rodeado por um pequeno muro de madeira brilhante.

Uma portazinha de bronze convidava-o a entrar.

Sentiu logo que o povoado lhe fugia da memória e sucumbiu à tentação de descansar por um momento naquele lugar.

O pesquisador ultrapassou o portal e começou a caminhar lentamente por entre as pedras brancas que estavam dispostas ao acaso entre as árvores.

Deixou que os seus olhos se pousassem como borboletas em cada pormenor daquele paraíso multicolor.

Os seus olhos eram os de um pesquisador, e foi talvez por isso que descobriu aquela inscrição sobre uma das pedras:


Abdul Tareg, viveu 8 anos, 5 meses, 2 semanas e 3 dias.


Ficou um pouco surpreendido ao dar-se conta de que aquela pedra não era simplesmente uma pedra: era uma lápide.

Sentiu pena ao pensar que um menino de tão tenra idade estava enterrado naquele lugar.

Olhando à sua volta, o homem deu-se conta de que a pedra ao lado também tinha uma inscrição. Aproximou-se para a ler. Dizia:


Yamir Kalib, viveu 5 anos, 8 meses e 3 semanas.


O pesquisador sentiu-se terrivelmente comovido.

Aquele lindo lugar era um cemitério, e cada pedra era uma campa. Começou a ler as lápides uma por uma.

Todas tinham inscrições semelhantes: um nome e o tempo exacto de vida do morto.

Mas o que o enleou de espanto foi comprovar que aquele que tinha vivido mais tempo mal ultrapassava os onze anos... Paralisado por uma dor terrível, sentou-se e pôs-se a chorar.O encarregado do cemitério passava por ali e aproximou-se. Observou-o a chorar durante algum tempo em silêncio e perguntou-lhe se chorava por algum familiar.

- Não, não é por nenhum familiar - disse o pesquisador. - Que se passa nesta povoação? Que coisa tão terrível acontece nesta cidade? Porque é que há tantas crianças mortas enterradas neste lugar? Qual é a maldição horrível que pesa sobre estas pessoas, que as obrigou a construir um cemitério de crianças?

O ancião sorriu e disse:

-O senhor pode tranquilizar-se. Não existe uma tal maldição. O que acontece é que temos um costume antigo. Vou-lho contar:

«Quando um jovem completa quinze anos, os seus pais oferecem-lhe um livrete como este que tenho aqui, para que o pendure ao pescoço. É tradição entre nós que, a partir desse momento, de cada vez que alguém desfrute intensamente de alguma coisa, abra o livrete e anote nele:

À esquerda, o que foi desfrutado.

A direita, quanto tempo durou o prazer.

Conheceu a sua noiva e enamorou-se dela. Quanto tempo durou essa paixão enorme e o prazer de a conhecer? Uma semana? Duas? Três semanas e meia...?

E depois, a emoção do primeiro beijo, o prazer maravilhoso do primeiro beijo... Quanto durou? O minuto e meio do beijo? Dois dias? Uma semana?

E a gestação e o nascimento do primeiro filho...? E as bodas dos amigos?

E a viagem mais desejada?

E o encontro com o irmão que regressa de um país longínquo?

Quanto tempo durou o desfrutar destas situações?

Horas? Dias?

Assim, vamos anotando no livrete cada momento quer desfrutamos… Cada momento.

Quando alguém morre é nosso costume abrir o seu livrete e somar o tempo em que sentiu prazer, para o escrever sobre a sua campa.

Porque é esse quanto a nós o único e verdadeiro TEMPO VIVIDO».”

|Jorge Bucay, Contos para pensar.

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|Actividades:

1 - O que significa viver? Podemos afirmar que grande parte da nossa vida não tem sentido? Justifique

a sua resposta com base numa interpretação do texto.

2 - O que podemos fazer para alargarmos os períodos (mais) significativos da nossa vida? Justifique a sua resposta tendo em conta os obstáculos que poderemos ter que enfrentar.

3 - Procure 3 períodos da sua vida que possam contribuir, de forma positiva, para a contabilidade da

sua VIDA VIVIDA.

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É claro que isto está muito simplificado. Assenta num hedonismo muito limitado.

Mas eu vou escarafunchar.

Vou tentar chegar junto dos alunos, de cada aluno, para mostrar que na vida não temos que ser umas bestas, mesmo que sadias. Temos, simplesmente, que viver. E isso não comporta nada de trágico ou de dramático.

E vou dizer-lhes que quando amarem, que amem. E que nunca tenham medo da vida. E que vivam como quem vem ao mundo para viver.

E que tomem a sua vida como a mais digna de ser vivida.

E que não tenham medo do futuro. O futuro já cá está. Cada homem é do futuro. Por isso não há nada a ganhar ou a perder, basta que ninguém se perca a tentar ganhar o que é pouco, porque o que é importante não se ganha, não se disputa, não se procura.

Vou dizer-lhes que sou maluco e que esqueçam depressa as minhas coisas. Estou ali só porque preciso de dinheiro para a bucha e tenho que gastar o tempo com uma série de coisas que estão no programa. E que aprendam com essa experiência a nunca gastarem o seu tempo. É triste termos que gastar o nosso tempo. Mas é óbvio que sou mesmo maluco e não acredito em nada disto, mas isso não o digo.

Também não lhes vou dizer o quanto estou feliz por voltar a ter alunos. Não quero assustar os meus futuros mestres. Há sempre alguns no meio daquela turba. Nunca o saberão, mas serão um clarão a brilhar na minha vida. É claro que todos são importantes, mas alguns alunos levam-nos longe.

Como os asperguianos que tive uma vez numa turma. Tidos como atrasados mentais pelos outros professores, foram as pessoas que mais me marcaram até hoje. Mostraram-me o que é a fortaleza, uma vez que para lhes dar positiva tive que enfrentar os poderosos da escola. E isso obrigou-me a levar a minha vida a sério e a não ter medo de amar, de me fazer ao mar, haja o que houver aí. Haja o que houver.

Certa vez, confrontei uma aluna com o facto estranhíssimo de ter 17 à minha disciplina, quando tinha negativa a todas as outras. O que criou uma atmosfera estranha no conselho de turma. Ela respondeu-me, com lágrimas nos olhos: “aqui eu conto”. Triste sociedade que ainda tem escolas.

Este ano vou fazer pior.






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