– Podíamos, por exemplo, ter uma palavra – Soltubro. E todos saberíamos que se falava do sol de outubro. E outra – Neblizembrorte. Sim, as neblinas frias do Norte. E outra, e outra ainda. Uma para cada coisa do mundo, com os computadores era muito fácil, já viu? Tudo palavras novinhas, não havia esta coisa de em Moçambique se escrever de um modo e no Brasil se dizer de um outro, já agora nenhuma palavra podia ter um C antes de um T. De nenhuma se ia poder dizer que na origem era cristã (que horror, a inquisição), nem machista, nem satanista, essas coisas que não interessam. Ficava tudo muito mais simples, mais arrumado, mais lógico. Encontrava-se tudo no google num instante, facilitava imenso os contactos, os negócios. Por acaso parece que já há uma lei. Mas voltando ao que interessa, brasilusangotroliopresa: não se vê logo que é a empresa do brasilusangotroliovestidor? O que é um brasilusangotroliovestidor, mas você vive na lua?! Não se vê logo que é um investidor que usa o know-how português para investir dinheiro do petróleo angolano no Brasil? Complicado pois, são precisas tantas palavras, vê? Assim só usávamos uma, igualzinha no Rio e em Lisboa. Já viu as alterações climáticas? Agora não se pode desperdiçar papel, olhe só a quantidade que se gasta na poesia, vem um e diz "no meu coração há rosas mortas", e outro vem e diz "escuta a altiva solidão do corvo". Uma confusão, tem que haver uma lei, não acha? E depois quem quiser diz: "mortirosacor" ou diz "corvisolitivacuta" e todos sabem e chega muito bem. E dar essas coisas de poesias a menores de 18 anos acho mal, depois não lhes apetece estudar gestão e começam a pôr piercings na língua ou lá o que é. Tem que haver uma lei. Também, os brasilusangotroliovestidores não podem estar a pagar impostos para sustentar os inutiletasaniapérios, o quê? Oh, esqueci-me, os poetas inúteis que têm a mania dos impérios. Estas coisas da língua não podem andar ao deus-dará. A língua vale muito, ainda no outro dia o ministro disse que o Pessoa vale mais do que a PT. Você já entrou no negócio das eólicas? Já viu as alterações climáticas? Ah, está mais virado para o sector do turismo. Pois, nessa praia fazia-se uma urbanização de luxo. O pior é que há uma lei.
A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português".
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sexta-feira, 8 de agosto de 2008
Soltubro
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3 comentários:
Tio 2dão:
És um gênio! Nunca vi tanto neologismo junto...JAJAJAJAJAJA!
Esse é o grande charme da língua: recriar.
O que mais ingrato acho, caríssimo, é que pouca gente te entenda... :)
Está fenomenal, Casimiro.
Tens uma imaginação diabólica:)
"Estas coisas da língua não podem andar ao deus-dará."
Pois não, há que regulamentar tudinho...:))))
Beijinhos.
P.S. Se calhar o Klatuu tem razão:(
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