A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
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Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

Donde vimos, para onde vamos...
Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

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segunda-feira, 25 de agosto de 2008

Cadernos de Agostinho da Silva (excertos)


TOLSTOI, A TERRA DE QUE PRECISA UM HOMEM (IV e V)

IV
Logo que chegaram à nova residência, pediu Pahóm que o admitissem na comuna de uma grande aldeia; tratou com os dirigentes e deram-lhe os documentos necessários; depois, concederam-lhe cinco talhões de terra para ele e para o filho, isto é, trezentos e setenta e cinco desiatines em campos diferentes, além do direito aos pastos comuns. Pahóm construiu as casas precisas e comprou gado; só de terra da comuna tinha ele três vezes mais do que dantes e toda ela era exce­lente para trigo; estava incomparavelmente melhor, com terra de cultivo e de pastagem, e podia ter as ca­beças de gado que quisesse.
A princípio, enquanto durou o trabalho de se esta­belecer, tudo satisfazia Pahóm, mas, quando se habituou, começou a pensar que ainda não tinha bastante terra; no primeiro ano, semeou trigo na terra da co­muna e obteve boa colheita; queria continuar a semear trigo, mas a terra não chegava e a que já tinha não servia porque, naquela região, era costume semear o trigo em terra virgem, durante um ou dois anos, depois deixar o campo de pousio, até se cobrir de novo de ervas de prado. Havia muitos que desejavam estas terras e não havia bastantes para todos, o que provo­cava conflitos; os mais ricos queriam-nas para semear trigo e os que eram pobres para as alugar a negocian­tes, de modo a terem dinheiro para pagar os impostos. Pahóm queria semear mais trigo e tomou uma terra de renda por um ano; semeou muito, teve boa co­lheita, mas a terra era longe da aldeia e o trigo tinha de ir de carro umas três léguas. Certo tempo depois, notou Pahóm que alguns camponeses viviam em her­dades não comunais e enriqueciam; pensou con­sigo: «Se eu pudesse comprar terra livre e arranjar casa, então é que as coisas me haviam de correr bem.»
A questão de comprar terra livre preocupava-o sempre; mas continuou durante três anos a arrendar campos e a cultivar trigo; os anos foram bons, as co­lheitas excelentes, começou a pôr dinheiro de lado. Podia ter continuado a viver assim, mas sentia-se can­sado de ter que arrendar terras de outros todos os anos ainda por cima disputando-as; mal aparecia uma terra boa todos os camponeses se precipitavam para a tomarem, de modo que, ou se andava ligeiro, ou se ficava sem nada. Ao terceiro ano, aconteceu que ele um negociante arrendaram juntos a uns camponeses uma pastagem; já a tinham amanhado quando se le­vantou qualquer disputa, os camponeses foram para o tribunal e todo o trabalho se perdeu. «Se fosse terra minha — pensou Pahóm— já eu era independente e não me via metido nestas maçadas.»
E começou a procurar terra de compra; encontrou um camponês que tinha adquirido uns quinhentos desiatines mas que, por causa de dificuldades, os queria vender barato; Pahóm regateou com o homem e assentaram por fim num preço de 1.500 rublos, me­tade a pronto, a outra metade a pagar depois. Tinham arrumado o negócio, quando se deteve em casa de Pahóm um comerciante que queria forragem para os cavalos; bebeu chá com Pahóm e travou-se conversa; o comerciante disse que voltava da terra dos Bashkirs, que era muito longe, e onde tinha comprado cinco mil desiatines de terra por 1.000 rublos. Pahóm fez-lhe mais perguntas e o negociante respondeu:
— Basta fazer-nos amigos dos chefes. Dei-lhes coisa de cem rublos de vestidos de seda e de tapetes, além duma caixa de chá, e mandei distribuir vinho por quem quisesse; e arranjei a terra a cinco kopeks
[1] o desiatine.
E, mostrando a Pahóm as escrituras, acres­centou :
— A terra é perto dum rio e toda ela virgem. Pahóm continuou a interrogá-lo e o homem res­pondeu:
— Há por lá mais terra do que aquela que se pode­ria percorrer num ano de marcha; e toda ela pertence aos Bashkirs. São como cordeirinhos e arranja-se a terra que se quer, quase de graça.
— «Bem — pensou Pahóm — para que hei-de eu, com os meus mil rublos, arranjar só os quinhentos desiatines e aguentar ainda por cima com uma dí­vida? Na outra terra compro eu dez vezes mais, e pelo mesmo dinheiro.»

V
Perguntou Pahóm de que maneira havia de ir lá ter e, logo que o negociante o deixou, preparou-se para empreender a viagem; ficou a mulher a tomar conta da casa e ele partiu com o criado; pararam numa cidade e compraram uma caixa de chá, vinho e outros presentes, conforme o conselho do negociante. Foram andando sempre até que, já percorridas mais de no­venta léguas, chegaram ao lugar em que os Bashkirs tinham levantado as suas tendas; era exactamente como o homem tinha dito: viviam nas estepes, junto dum rio, em tendas de feltro; não lavravam a terra, nem comiam pão; o gado e os cavalos andavam em rebanhos pelos pastos da estepe; os potros estavam peados atrás das tendas e duas vezes por dia lhes le­vavam as éguas; ordenhavam-nas e do leite faziam kumiss
[2]; eram as mulheres quem preparava o ku­miss e fazia queijo; quanto aos homens, passavam o seu tempo a beber kumiss e chá, a comer carneiro e a tocar gaitas de foles; eram gordanchudos e prazentei­ros e, durante todo o verão, nem pensavam em traba­lhar; eram ignorantes de todo, não sabiam falar russo, mas eram de boa qualidade.
Mal viram Pahóm, saíram das tendas e juntaram-se à volta do visitante; apareceu um intérprete e Pahóm disse-lhes que tinha vindo à procura de terra; os Bashkirs, segundo parecia, ficaram muito conten­tes; levaram Pahóm para uma das melhores tendas onde o fizeram sentar numas almofadas de penas pos­tas num tapete, sentando-se eles também à volta; de­ram-lhe chá e kumiss, mataram um carneiro para a refeição; Pahóm tirou os presentes do carro, dis­tribuiu pelos Bashkirs e dividiu também o chá; os Bashkirs ficaram encantados; conversaram muito uns com os outros e depois disseram ao intérprete que traduzisse:
O que eles estão a dizer é que gostaram de ti e que é nosso costume fazermos tudo o que podemos para agradar aos hóspedes e lhes pagar os presentes; tu destes presentes: tens que dizer agora que te agrada mais de tudo o que possuímos, para que to entre­guemos.
— O que me agrada mais — respondeu Pahóm — é a vossa terra. A nossa está cheia de gente e os campos já não dão; vocês têm muita e boa; nunca vi coisa assim.
O intérprete traduziu. Os Bashkirs falaram um bocado, sem que Pahóm compreendesse o que diziam; mas percebeu que estavam muito divertidos e viu que gritavam e se riam; depois calaram-se e olharam para Pahóm, enquanto o intérprete dizia:
— O que eles me mandam dizer é que, em troca dos teus presentes, te darão a terra que quiseres; é só apontá-la a dedo.
Os Bashkirs puseram-se outra vez a falar e discu­tiram; Pahóm perguntou o motivo da discussão e o intérprete respondeu que uns eram de opinião que não deviam resolver nada na ausência do chefe e outros que não havia necessidade de esperarem que voltasse.


[1] O kopek é a centésima parte do rublo.
[2] Leite fermentado.

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