Como sabem estamos a uma dezena de dias do inicio das comemorações do IV Centenário do nascimento do Padre António Vieira.
Designadas por Ano Vieirino, numa iniciativa da Faculdade de Ciências Humanas da Universidade Católica Portuguesa em Lisboa e da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa, as comemorações terão a sua abertura oficial, num evento – Congresso Internacional - que ocupará todo o dia 6 de Fevereiro próximo, na Academia das Ciências de Lisboa.
O ano de 2008, será pois, ano de celebração do Jesuíta e da perpétua obra de uma figura ímpar da Cultura Portuguesa e Brasileira.
Grande pensador do Quinto Império, Quinto, porque segundo ele - na interpretação de Agostinho da Silva - não haveria Sexto, já que, acreditava que os males de Portugal tinham a ver com o comando, logo, como o seu Quinto era católico e por maioria de razão o seu comando entregue a Deus, não poderia haver sexto. Assim ficou até hoje e nem Pessoa nem Agostinho o alteraram.
Padre António Vieira, considerado um dos maiores prosadores da língua portuguesa, é um espírito complexo e vigoroso, paladino dos direitos humanos, patriota esforçado, utopista, visionário e politicamente realista. O padre António Vieira foi o sebastianista criador da ideia do Quinto Império, uma nova era sob a égide temporal de Portugal.
Virtuoso da língua portuguesa, arrastava multidões com os seus dialécticos sermões, obras dramáticas e calculadas com exactidão para que provocassem as reacções desejadas no público. (1)
Espanta-nos desde logo a sua personalidade multifacetada: o insigne orador, que mereceu o título de “O Crisóstomo Português”; o conselheiro real e diplomata a quem D. João IV gabava a “lábia”; o missionário imbuído de profunda religiosidade, o “Payassu” (“Padre Grande”), como o alcunharam os Índios.
Em todos os textos de feição visionária – sejam eles a História do Futuro, o Livro Anteprimeiro (prólogo explicativo daquela), as Esperanças de Portugal, a Clavis Prophetarum ou mesmo a Defesa Perante o Tribunal do Santo Ofício – se procura explicar o verdadeiro sentido das profecias de Bandarra, as quais, infalíveis em tantos pormenores, haviam também de o ser na consumação do Quinto Império: um império universal, totalizante, harmónico, onde coubessem todas as raças e todas as culturas, unidas espiritualmente num único reino cristão e católico. (2)
No seu livro “História do Futuro” de 1718, o Padre António Vieira expunha ser ele também mensageiro da loja branca e senhor do segredo divino, num misto de ocultismo e de cristianismo de sentimento sebástico de concepção ocultista e cristã do
Império das raças e sub-raças, com a esperança de que o Quinto Império anunciado para depois do segundo é o império espiritual português. É sua a sublimar frase: Para se avaliar a esperança, há-se de medir o futuro.
A “História do Futuro”, é um manancial de profecias ao profeta Daniel, intérprete do sonho de Nabucodonosor onde vai colher o fundamento do mito do Quinto Império e que o Padre António Vieira no sermão de acção de graças pelo nascimento do príncipe D. João assim descreve:
Nabucodonosor, aquele grande monarca, pôs-se uma noite a considerar se o seu império seria perpétuo, ou se depois dele sucederiam outros no mundo; e adormecendo com estes pensamentos viu aquela famosa estátua tantas vezes pregada nos púlpitos, cuja cabeça era de oiro, o peito de prata e o ventre de bronze, e daí até aos pés de ferro. Viu mais que uma pedra caída do alto, dando nos pés da estátua, a derrubava e fazia em pó, e a mesma pedra crescendo se aumentava e dilatava em um monte de tanta grandeza que enchia toda a terra. Este foi o sonho de que Nabucodonosor totalmente se esqueceu, até que o profeta Daniel lho trouxe outra vez à memória e lhe declarou a significação dele. A cabeça de oiro – diz Daniel – significa o primeiro império, que é o dos Assírios, a que hão-de suceder os Persas; o peito de prata significa o segundo império, que é o dos Persas, a que hão-de suceder os Gregos; o ventre de bronze significa o terceiro império, que é o dos Gregos, a que hão-de suceder os Romanos; o demais de ferro até os pés significa o quarto império, que é o dos Romanos, a que há-de suceder o da pedra, que derribou a estátua: porque ele é o último; e assim como a pedra se levantou à altura e se estendeu à grandeza de um monte que encheu todo o mundo, assim este império dominará o mesmo mundo, e será reconhecido e obedecido de todo ele. (3)
Na História do Futuro podemos ler o seguinte:
Tudo que abraça o mar, tudo que alumia o sol, tudo o que cobre, e rodeia o sol, será sujeito a este Quinto Império: não por nome ou título fantástico, como todos que até agora se chamaram impérios do mundo; senão por domínio, e sujeição verdadeira. Todos os reinos se unirão em um ceptro, todas as cabeças obedecerão a uma suprema cabeça, todas as coroas se rematarão em um só diadema, e esta será a peanha da cruz de Cristo. (4)
É este o império espiritual do padre António Vieira, implantado sob a Cruz e que, no rasto do sapateiro de Trancoso cujas profecias datavam de 1554, predizia o mito sebástico vinte e quatro anos antes da batalha de Alcácer Quibir.
Fontes:
1 – Dicionário de autores da língua portuguesa – Amigos do livro – Editores.
2 – Sermões escolhidos, Padre António Vieira - Biblioteca Ulisseia de Autores Portugueses.
3 – Estudo biográfico e crítico, Hernâni Cidade. Vol. I - Agência geral das colónias.
4 – História do Futuro - Oficina de António Pedrozo Garlam
Nota Posterior (14:45): Reparei agora, que as comemorações já estão referenciadas na coluna da esquerda deste blog, e que, Eduardo Lourenço e Manuel Ferreira Patrício, membros do Conselho de Direcção da NOVA ÁGUIA, usarão da palavra na sua abertura oficial.
2 comentários:
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Segundo Fernando Pessoa o lugar de cabeça do Quinto Império estava reservado a Portugal, como podemos ler no prefácio do “Quinto Império” obra de Augusto Ferreira Gomes em parceria com António Maria Pereira editado em 1934, em que Pessoa expõe a sua interpretação da profecia de Bandarra.
A esperança do quinto Império, tal qual em Portugal a sonhamos e concebemos, não se ajusta, por natureza, ao que a tradição figura como o sentido da interpretação dada por Daniel ao sonho de Nabucodonosor.
Nessa figuração tradicional, é este o seguimento dos impérios: o Primeiro é o da Babilónia, o Segundo o Medo-Persa, o Terceiro o da Grécia e o quarto o de Roma, ficando o Quinto, como sempre, duvidoso. Nesse esquema, porém, que é de impérios materiais, o último é plausivelmente entendido como sendo o Império de Inglaterra. Desse modo se interpreta naquele país; e creio que, nesse nível, se interpreta bem.
Não é assim no esquema português. Este, sendo espiritual, em vez de partir, como naquela tradição, do Império material de Babilónia, parte, antes, com a civilização em que vivemos, do império espiritual da Grécia, origem do que espiritualmente somos. E, sendo esse o Primeiro império, o Segundo é o de Roma, o Terceiro o da Cristandade, e o Quarto o da Europa – isto é, da Europa laica de depois da Renascença. Aqui o Quinto Império terá que ser outro que o inglês, porque terá que ser de outra ordem. Nós o atribuímos a Portugal, para quem o esperamos.
A chave está dada, clara e obscuramente, na primeira quadra do Terceiro Corpo das Profecias de Bandarra, entendendo-se que Bandarra é um nome colectivo, pelo qual se designa, não só o vidente de Trancoso, mas todos quantos viram, por seu exemplo, à mesma Luz. Este Terceiro Corpo não é, nem poderia ser, do Bandarra de Trancoso. Dizemos, contudo, que é do Bandarra.
A quadra é assim:
Em vós que haveis de ser quinto
Depois de morto o segundo,
Minhas profecias fundo
Nestas letras que VOS pinto.
Um autor que - apesar do seu catolicismo arreigado - é mais universalista do que parece e de cujo conhecimento tem estado afastado o mundo actual, e contra mim falo.
Esperemos que esta iniciativa dê fim a esta lacuna. Pela parte que me cabe, tentarei retomar o contacto com o autor e - nomeadamente - com a biografia de Lúcio de Azevedo que li e... esqueci, no passar do tempo...
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