"Ora, do lado dos ingleses [no Parlamentarismo Liberal] era um pensamento ou uma atitude em que se casavam empirismo e cepticismo; um assegurava a primacialidade da experiência e o tenteio na vida pública, a utilidade vital do compromisso; o outro punha como possível serem tão verdadeiras os falsas quanto as minhas as ideias do adversário; concorriam os dois para que o parlamentarismo aparecesse como um sistema viável e lógico. Mas, do lado dos portugueses não há empirismo de espécie alguma, como não há cepticismo; o português funciona como um feixe de convicções; é a fé que o move; e a experiência, que é naturalmente diferente de empirismo; apenas o confirma na sua fé; porque, se não confirmasse, o português de nenhum jeito reformaria o seu sistema de convicções: preferiria abandonar-se e morrer."
página 68/69
Agostinho da Silva: “Ensaios sobre Cultura e Literatura Portuguesa e Brasileira I; Âncora Editora
1. Este segmento ilustra bem as diferenças entre a alma inglesa (e germânica, por extrapolação) e a portuguesa (e mediterrânica, por essência). Se os herdeiros dos bárbaros germânicos do Norte se distinguem pelo empirismo e cepticismo que fez deles bons matemáticos e excelente filósofos, o espírito português, escasseia o puro empirismo, e aquele que se afirma como tal não passa realmente de "pragmatismo" ou Seguidismo aplicado. O português é um Homem de Fé, seja ela qual fôr. O mesmo fervor que servia os lusitanos e célticos na adoração de Endovélico e Ataegina, perpetuou-se na "mais católica das Nações Cristãs" durante a Expansão, bem mais motivada pelo Espírito de Cruzada e pela Religião do que muitos materialistas e economicistas de hoje gostariam de acreditar...
2. Sendo um Homem de Fé, o português não pode viver de forma plena e feliz no mundo cinzento do norte da Europa. As tentativas de transplantar para Portugal os modelos nórdicos de Desenvolvimento falharão sempre porque não existe aqui o terreno mental fértil para que essas plantas que tão bem se desenvolvem a Norte se dêem bem a Sul...
2 comentários:
Tambem nao sou nada a favor de transplantar os modelos "Nordicos" de desenvolvimento para as nossas terras ensolaradas. No entanto, sou completamente a favor de mantermos as nossas mentes abertas para o muito que os "barbaros altos e louros" tem para nos ensinar, especialmente no que diz respeito ao nao-elitismo, nao-classismo, promocao de uma verdadeira igualdade de oportunidades de acesso ao conforto material e crescimento pessoal, tao necessarios para que a verdadeira fina flor do genero humano venha ao de cima, e, acima de tudo, RESPEITO na interacao entre pessoas e entre estas e as instituicoes. Todas estas condicoes sao fundamentais para o pleno desenvolvimento do potencial humano e a emergencia da verdadeira fina flor da Humanidade. Condicoes que estao muito em falta em Portugal, que ha seculos que teima em reproduzir elites de nome e de conta bancaria, penduradas nas tetas murchas de um estado esclerosado e reprodutor de privilegios, desigualdades e favoritismos.
Há que seguir uma caminho do meio entre a divinização de nós e a diabolização dos outros, entre o apego ao nosso e a aversão ao alheio, embora se compreenda que por vezes, como medida hábil e estratégica, se recorra a isso como antídoto à desequilibrada divinização dos outros e diabolização de si. Os portugueses oscilam pendularmentre entre estas duas formas emocionais que pode assumir a ilusão de haver "nós" e "outros". Há que nos curarmos de vez disto, não só portugueses, mas todos os humanos e demais consciências: não por motivos morais, filosóficos ou religiosos, mas simplesmente porque nada disto tem a ver com a realidade.
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