A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
Sede Editorial: Zéfiro - Edições e Actividades Culturais, Apartado 21 (2711-953 Sintra). 
Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

Donde vimos, para onde vamos...
Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

Onde temos ido: Mapiáguio (locais de lançamentos da NOVA ÁGUIA)

Albufeira, Alcáçovas, Alcochete, Alcoutim, Alhos Vedros, Aljezur, Aljustrel, Allariz (Galiza), Almada, Almodôvar, Alverca, Amadora, Amarante, Angra do Heroísmo, Arraiolos, Assomada (Cabo Verde), Aveiro, Azeitão, Baía (Brasil), Bairro Português de Malaca (Malásia), Barcelos, Batalha, Beja, Belmonte, Belo Horizonte (Brasil), Bissau (Guiné), Bombarral, Braga, Bragança, Brasília (Brasil), Cacém, Caldas da Rainha, Caneças, Campinas (Brasil), Carnide, Cascais, Castro Marim, Castro Verde, Chaves, Cidade Velha (Cabo Verde), Coimbra, Coruche, Díli (Timor), Elvas, Ericeira, Espinho, Estremoz, Évora, Faial, Famalicão, Faro, Felgueiras, Figueira da Foz, Freixo de Espada à Cinta, Fortaleza (Brasil), Guarda, Guimarães, Idanha-a-Nova, João Pessoa (Brasil), Juiz de Fora (Brasil), Lagoa, Lagos, Leiria, Lisboa, Loulé, Loures, Luanda (Angola), Mafra, Mangualde, Marco de Canavezes, Mem Martins, Messines, Mindelo (Cabo Verde), Mira, Mirandela, Montargil, Montijo, Murtosa, Nazaré, Nova Iorque (EUA), Odivelas, Oeiras, Olhão, Ourense (Galiza), Ovar, Pangim (Goa), Pinhel, Pisa (Itália), Ponte de Sor, Pontevedra (Galiza), Portalegre, Portimão, Porto, Praia (Cabo Verde), Queluz, Recife (Brasil), Redondo, Régua, Rio de Janeiro (Brasil), Rio Maior, Sabugal, Sacavém, Sagres, Santarém, Santiago de Compostela (Galiza), São Brás de Alportel, São João da Madeira, São João d’El Rei (Brasil), São Paulo (Brasil), Seixal, Sesimbra, Setúbal, Silves, Sintra, Tavira, Teresina (Brasil), Tomar, Torres Novas, Torres Vedras, Trofa, Turim (Itália), Viana do Castelo, Vigo (Galiza), Vila do Bispo, Vila Meã, Vila Nova de Cerveira, Vila Nova de Foz Côa, Vila Nova de São Bento, Vila Real, Vila Real de Santo António e Vila Viçosa.
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terça-feira, 15 de junho de 2010

Debate público com o Dr. Fernando Nobre sobre ecologia, direitos dos animais, consumo de carne e fome no mundo



O Dr. Fernando Nobre, enquanto candidato à Presidência da República, exporá as suas posições sobre a questão ecológica, os direitos dos animais, o consumo de carne e a fome no mundo, num debate público que terá lugar no dia 24 de Junho, 5ª feira, às 18.30, no Anfiteatro IV da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa.

O moderador será Paulo Borges e a organização é da revista Cultura ENTRE Culturas, com o apoio do Movimento Outro Portugal (Manifesto Refundar Portugal) e do Partido Pelos Animais. Serão dirigidos convites aos demais candidatos para debater as mesmas questões.

A revista Cultura ENTRE Culturas agradece ao Dr. Fernando Nobre haver aceitado o convite para debater publicamente estas questões, de crucial importância no momento actual.

A revista, dedicada ao diálogo intercultural e ao despertar da consciência cívica para as grandes questões mundiais, estará à venda no evento.

quarta-feira, 9 de junho de 2010

Um excelente texto da investigadora e artista Ilda Castro, da Comissão Coordenadora do Movimento Outro Portugal



. A ARTE NA ERA DO PORQUINHO BABE .
. JARDIM DE INVERNO DO TEATRO MUNICIPAL DE SÃO LUIZ . LISBOA .
. 7 DE JUNHO 2010 .

TODOS DIFERENTES TODOS ESPECIAIS

Mental Noise, 2010, 23´- filme de Ilsa D´Orzac

Em 1919, D.W.Griffith realizou Broken Blossoms (O Lírio Quebrado), filme que relata uma história de violência do “mais forte” sobre o “mais fraco”, de um “homem” sobre uma “mulher”, de um “pai” sobre uma “filha”. O século XVIII viu surgir três movimentos: o abolicionismo, o feminismo e a luta pela defesa dos direitos dos animais. Estes movimentos têm em comum a defesa dos direitos de seres que sentem e sobre os quais era, e em muitos casos ainda é, impunemente infligido sofrimento. A violência de um animal humano sobre outro animal humano, de um homem sobre uma mulher ou de um animal humano sobre um animal não humano, pertencem ao mesmo domínio mental. Mental Noise, de Ilsa D´Orzac, é sobre essa relação e dedicado a todos os seres sencientes. Por essa razão pede emprestado imagens de Broken Blossoms e toma Lilian Gish como representação dos seres sencientes maltratados, humanos e não humanos, que precisam de ser defendidos por todos nós. Em 1772, a ideóloga e intervencionista inglesa Mary Wollstonecraft, publicou o primeiro tratado reivindicativo de liberdade e igualdade, não apenas entre homens mas também para as mulheres e para os animais, contestando a violência nas suas várias formas de expressão: contra raças, sexo, condição económica, infância, animais e contra a Natureza. Passaram duzentos e trinta e oito anos e se olharmos à nossa volta… o que dizer dos vitelos torturados impiedosamente para que a sua carne permaneça tenra para os humanos? E de todos os outros casos, na alimentação, na experimentação, na moda, na vida quotidiana? Constatamos uma profunda regressão no que respeita a esta matéria.

Mas a defesa dos direitos dos animais não humanos não significa que os que a praticam sejam apaixonados por esses animais como quem é apaixonado por Ferrari´s ou pelos novos gadjets informáticos, ou similares. Podem ser ou não ser. Mas são, isso sim, conscientes de que o lugar que ocupam na existência e no planeta é partilhado em condições idênticas e não em arrogante supremacia atribuída pela razão. O que essa defesa manifesta é respeito pelo Vivo e reconhecimento da ignorância apensa às prerrogativas da superioridade mecanicista. Daí resulta que os que defendem os direitos dos animais também defendem os direitos dos vegetais e os direitos dos minerais. Defendem a Natureza e a natureza cosmobiológica de todos os seres, a sua incluída.

O respeito pelos outros animais é assim o primeiro grau e o ponto de partida para uma mudança de paradigma tendente a um novo entendimento e prática da Vida. Quando mais essa percepção for na sua abrangência assimilada, maior será o desenvolvimento de outras percepções sobre a existência no planeta Terra e a sua inter-relação cosmobiológica. Percepções que os sistemas orientados pelos interesses económicos e pelo lucro pretenderam e com sucesso, ilidir.

Inúmeros mal-entendidos emergem acerca do sofrimento imposto a estes seres sencientes. Por exemplo, a ideia de que é necessário comer diariamente proteínas animais. Incrível pretensão, não só porque do ponto de vista nutricional tanto funcionam as proteínas animais como as vegetais, mas também porque intenta fazer crer que ao longo da história da espécie humana os sujeitos sempre tiveram essa prática e – de não somenos importância – essa possibilidade. Obviamente é falso. Essa possibilidade passou a existir apenas desde que a produção agro-pecária em massa foi instituída, ou seja, recentemente. Outro mal-entendido é a ideia de que os animais não humanos sempre existiram para o prazer e gáudio dos humanos, qualquer que seja a forma que esse gáudio e prazer assumam. Ora, também é falso. O paradigma mecanicista assim o advoga mas o cartesianismo surgiu no século XVII, há apenas trezentos anos portanto. O que a documentação histórica confirma é que sempre existiu a defesa do entendimento oposto. Já Pitágoras (552-496 a.C.) recusava consumir carne de animais ou estar sequer próximo dos que os caçavam e matavam, e o imperador indiano Asoka (274-232 a.C.) instituiu explicitamente no seu longo e feliz reinado, a não realização de sacrifícios de sangue e a provisão de tratamentos médicos, de poços e de árvores para benefício de humanos e de animais não humanos! Outro forte mal-entendido é o famoso repto de que é integrante da natureza humana a necessidade de domínio e subjugação da Natureza e dos mais fracos, nomeadamente os outros humanos. Ainda hoje, e apesar de todas as démarches para que tal não seja possível, existem comunidades onde esse princípio não só não é praticado como é repudiado. Mas sobretudo, deveria ser do conhecimento público que a ideia generalizada de competição no universo provém de Herbert Spencer (1820-1903), autor da expressão "sobrevivência do mais apto", que pura e simplesmente a retirou do discurso económico e a implantou como prótese, no pensamento darwinista. E infelizmente graças a interesses de uns e desatenções de outros, instituiu-se como verdade o que verdadeiro não é.

Alguns pensam que esta vontade de respeito pelos animais e pela natureza é uma moda ou aberração de alguns sujeitos pós-modernos. Quanto estão enganados! Ao longo da história e em todas as épocas sucedem-se os exemplos na filosofia, na legislação, nas artes, na ciência, nas academias, de mulheres e homens que se manifestaram no espaço público e privado na luta pela defesa dos seres sencientes, incluso os animais não humanos. Em 1789, quando em Portugal (e suas colónias na Índia) e em França, os escravos negros estavam a ser libertados, nos territórios britânicos e colónias portuguesas na América e Àfrica continuavam a ser escravizados, Jeremy Bentham afirmou sobre as outras espécies animais “a questão não é saber se podem pensar ou falar, mas saber se podem sofrer!”. Atestando quanto temos sido e estamos também enganados em relação às práticas da Idade Média, é bom partilhar algo já publicado mas muito pouco assimilado. Durante a Idade Média, entre o século XIII e o século XVIII, os cinco séculos mais recentes na confluência com a instituição do pensamento mecanicista e capitalista, realizaram-se na Europa os Processos dos Animais. Em que consistiam esses processos? Consistiam na outorgação de representação jurídica legal aos interesses de animais não humanos, inconvenientes, que interferiam com o lucro e a economia das práticas agrícolas. Porque nesses tempos, os humanos não se arrogavam o direito de simplesmente abusar ou aniquilar os outros animais e sabiam que

“Tudo o que existe, existe em Deus, e sem Deus nada pode existir nem ser concebido” Espinosa

Respeitemos a Vida e o que nela Vive.

Ilda Teresa Castro
(investigadora)

POR UMA MUDANÇA DE PARADIGMA, TODOS DIFERENTES TODOS ESPECIAIS

Não deite fora este texto, guarde-o, leia-o e passe-o a outra pessoa. Todos somos especiais.

terça-feira, 9 de fevereiro de 2010

Hoje, 18 h, Jornada em prol dos Direitos dos Animais e do Bem do Planeta



Hoje, 3ª feira, dia 9, pelas 18 h, será exibido no Anfiteatro III da Faculdade de Letras da Universidade de Lisboa o documentário "Meat the Truth - Uma Verdade Mais Do Que Inconveniente", que mostra o impacto da indústria da carne sobre o aquecimento global e o sofrimento dos animais. Uma verdade encoberta pela nossa ignorância e pelos grandes interesses económicos que devastam a vida e o planeta.

No final haverá um debate, moderado pela Drª Maria João Coutinho, com a presença de Pedro Sena, do Partido Pelos Animais, e de Paulo Daniel, da Associação Vegetariana Portuguesa.

Vejam e reflictam por vocês mesmos. A entrada é livre.

Eu estarei em directo na SIC Mulher, entre as 19 e as 20 h, para falar dos Direitos dos Animais, em representação do Partido pelos Animais, junto com Miguel Moutinho, da Associação Animal, e o actor Heitor Lourenço.

"Este livro é contra a tirania dos animais humanos sobre os não-humanos. Esta tirania provocou e provoca ainda hoje dor e sofrimento só comparáveis àqueles resultantes de séculos de tirania dos humanos brancos sobre os humanos negros. A luta contra esta tirania é uma luta tão importante como qualquer das causas morais e sociais que foram defendidas em anos recentes" - Peter Singer, Libertação Animal, Prefácio à edição de 1975, Porto, Via Óptima, 2008, 2ª edição, p.I.

sexta-feira, 4 de setembro de 2009

202 Campos Elíseos?

Uma nota cordial aos defensores dos direitos dos animais.

202 Campos Elíseos. Talvez alguém ainda se lembre: a morada parisiense do Jacinto de "A cidade e as serras", e deixo a cada um a interpretação do simbolismo deste endereço: pois os Campos Elíseos não são mais do que a terra paradisíaca e perfeita dos antigos gregos, um pouco como a em tempos tão falada neste blog Ilha dos Amores camoniana; e o número 202, na sua simetria e dualidade, poderia ser o pretexto para (mais) uma reflexão sobre a força e a ilusória completude da dualidade e da polarização. Número curiosíssimo, o 202 (ah, e o subtil Eça adivinhou-o na alvorada do terrível século 20), número curiosíssimo sim: 2-0-2, ou a dualidade como asa e amparo de um Nada central.

Mas aqui, como disse Camões e aprendi eu à minha custa já, matéria perigosa neste blog...

Uma vénia à direcção da Águia, que me permite escrever aqui. Mas não é ao Eça nem ao fascinante simbolismo dos números que venho chamar a atenção daqueles a quem dedico este post.

202 - e por isso a minha nota - é também o número de um importantíssimo artigo do Código Civil ao qual um texto aqui publicado há dias pelo Paulo Borges se referia (o link AQUI ); e nele está, pelos vistos, um dos alvos a abater e um dos bastiões do inimigo.

Vejamos as coisas mais de perto. No artigo 202 não se fala de animais, e não é necessário alterar-lhe um iota para que um chimpanzé deixe de poder ser dissecado em experiências 'médicas', um golfinho deixe de poder ser abatido impunemente ou um elefante de circo deixe de poder ter a vergonhosa condição de elefante de circo. E também não é por causa do que lá está hoje escrito que essas coisas acontecem todos os dias, e que todos os dias a maior parte de nós se ri alarvemente delas. Se os ministérios o andam a analisar à lupa, andam a perder o seu e o nosso tempo.

O artigo 202 não contém mais do que uma afirmação importada da filosofia. Diz isto (no seu número 1): "Diz-se coisa tudo aquilo que pode ser objecto de relações jurídicas". À boa maneira do que tem sido a filosofia europeia dos moderninhos (outra vénia ao Descartes, ao Kant e à Revolução Francesa), uma frase que tem que ser traduzida para os não-iniciados.
E diz também (no seu número 2): "Consideram-se, porém, fora do comércio todas as coisas que não podem ser objecto de direitos privados, tais como (...) as que são, por sua natureza, insusceptíveis de apropriação individual.".

Mais nada diz, nem precisa; de chimpanzés, elefantes ou borboletas, nem rasto. Então?

Com esta regra, como é que as coisas são ensinadas a um estudante de direito (futuro juíz, futuro advogado ou - ai de nós - futuro político)?

É dito ao estudante, como se fosse coisa assente, que no mundo em que vivemos - ensinaram-nos os filósofos - há sujeitos e há objectos. Os sujeitos relacionam-se uns com os outros, e relacionam-se uns com os outros a propósito de objectos. Quando essas relações interessam ao direito (por exemplo, a relação de amizade não interessa ao direito), a relação é, como o nome indica, jurídica. E portanto está aqui uma grelha de interpretação do mundo: sujeitos, objectos, relações. Através dessa grelha a Lei falará, e dará o seu a seu dono.

Diz-se depois outra coisa, e aqui começam as subtis armadilhas: os sujeitos são pessoas, e os objectos são coisas. E - dualidade - não há terceira via.

Talvez alguém reconheça esta linguagem filosófica na discussão sobre o estatuto jurídico do feto e do embrião humanos... se o estudante aplicar esta grelha de leitura a um escravo, concluirá que ele, porque pode ser vendido - e a venda é o protótipo da relação jurídica moderna, isso qualquer estudante de direito já percebeu - é o objecto da relação entre Pedro, comprador, e Paulo, vendedor. E assim Pedro e Paulo são evidentemente pessoas (e sujeitos) e o escravo obviamente uma coisa (e um objecto).

Como sabem, a escravatura é proibida por lei. Eu e os meus leitores não corremos, teoricamente ao menos, o risco de ser comprados por Pedro, vendidos por Paulo. Mas não é o artigo 202 do Código Civil que nos protege, e não é preciso mudá-lo para nos protegermos mais. Este artigo não diz que coisas há, mas o que são elas.

"coisa é tudo aquilo que pode ser objecto de relações". Deixo aos filósofos, que abundam por aqui, a questão: é ou foi na verdade isto dito pelos vossos ilustres confrades da filosofia europeia? Se foi, foram acertados ao dizê-la, sábios ao dizê-la? Não sou filósofo, e não saberia responder. Mas sou jurista, e portanto sou rigorosamente prático - qualidade mais rara que dentes numa avestruz. E quanto ao artigo 202 do Código Civil e à rede de conceitos que ele pressupõe, digo que, como grelha de leitura, isto basta-nos e serve-nos: isto, ou seja, um mundo em que nada mais há do que sujeitos, objectos e relações. Ajuda-nos muito a simplificar a análise de uma compra e venda, de um arrendamento, de um casamento, da adopção de uma criança. É uma grelha de leitura formal, não uma hierarquização material das coisas. E não nos diz, precisamente por ser formal e não material, se uma criança norueguesa e loira ou um gato surrado e vadio são sujeitos, coisas ou relações, se podem ser vendidos ou adoptados, se podem passear no jardim de Paulo ou ser esquartejados por Pedro. Mas, reparem: ajuda-nos a simplificar. Como tudo o que é próprio do discurso moderno, que é o discurso do capitalismo.

Apoiada nestes conceitos formais, a lei também diz - noutros locais - que coisas há, que pessoas há. E aqui é que estamos no centro dos problemas. A lei moderna, claro, apenas aceita como pessoas os seres humanos vivos, e entidades de criação humana como a Associação Agostinho da Silva (a que nós juristas chamamos 'entidades colectivas'). Não aceita que um gato o seja, não aceita que o meu cadáver o seja, não aceita que a mais bonita das pedras do mundo o seja. Eu tenho direitos e exerço-os, a Associação Agostinho da Silva tem direitos e exerce-os. O gato, o meu cadáver e a pedra... ah.

Mas o gato pode ser vendido e a pedra pode ser moída. Já o meu cadáver, que não será uma pessoa, não poderá ser vendido nem esquartejado por Pedro ou Paulo. Estará mais defendido pela lei do que um gato vivo. Se perguntarmos, numa escola de direito, porque é que um cadáver é protegido, responder-nos-ão com uma conversa atrapalhada sobre dignidade, ética, respeito, filosofia, religião e consenso social. E dirão apressadamente não passa pela cabeça de ninguém que as coisas pudessem ser de outro modo. Que estranha propriedade tem essa coisa que é o cadáver?

A palavra propriedade é uma palavra muito estranha. Quer dizer o que é próprio, e quer dizer o que é possuído. E possuir é próprio do capitalismo moderno, ao contrário do 202 não há aqui coincidência nenhuma. Deixámos de ver o que é próprio e apropriado às coisas para melhor nos podermos apropriar delas - e através delas dos outros, porque no mundo tantas coisas são relações. O cadáver é das poucas coisas em que continuamos a ver a diferença. Não é apropriado que um cadáver humano seja apropriado. Mas isso não faz dele pessoa, nem sujeito. Faz dele apenas uma coisa que pode dormir tranquila, ao contrário de tantos animais vivos.

202 Campos Elíseos, 202 Código Civil. São estranhas as dualidades, e a mais astuta de todas é a que tem o Nada no centro. Não gosto da modernidadezinha e sou fiel à tradição: sei de experiência feita que o mundo é múltiplo, floração do ser e labirinto que o espírito vence. Não sei o que dirão os ministérios, os peritos, os técnicos, sem dúvida legião; não sei em que transformarão o artigo simples do Código que aqui comentei. Tenho vergonha de ver um elefante escravizado a um circo. E aos defensores e amigos dos animais queria dizer que parem um pouco a considerar esta coincidência e esta simbologia de que aqui falei. 202 Campos Elíseos, e a casa do Jacinto em Paris não pôde ser mais do que o inferno de um paraíso invertido. Há muitas ilhas no mar. Tenham cuidado com o que disserem nesta discussão com a lei, porque o que disserem pode ser valioso, e pode ser pena desperdiçar argumentos e falhar o alvo. Não aceitem como se fosse coisa evidente que o mundo está ao contrário e que portanto basta inverter tudo. Tenham cuidado com a dualidade que se esconde no Tudo e no seu Nada, porque é a mais difícil de discernir. No mundo há pessoas e coisas, não creio que a dissolução disso seja solução. Uma coisa pode ser tranquila, o artigo 202 está muito bem. Basta que as coisas sejam tratadas com a dignidade que lhes é própria, para que não seja apropriado apropriá-las a todas de igual forma. Mas isso só será possível num mundo em que os únicos números não sejam o Nada e o seu Dois. Em que nem todos os campos tenham que ser Elíseos sob pena de serem o inferno.

quinta-feira, 20 de agosto de 2009

Um Partido Inteiro - Entrevista sobre o Partido Pelos Animais dada à Animalia.pt, revista semanal online

Partido Pelos Animais: Realidade ou Utopia?

O projecto é muito real e conta já com o apoio de muitos voluntários e de várias figuras públicas, nacionais e internacionais, nomeadamente de Sua Santidade o Dalai Lama. Para já a recolha de 7500 assinaturas de cidadãos eleitores é essencial para formalizar a inscrição do partido junto do Tribunal Constitucional, mas Paulo Borges, membro da Comissão Coordenadora do Partido Pelos Animais (PPA), faz uma projecção das actividades do mesmo e explica, especialmente aos mais cépticos, a viabilidade de uma ideia que surgiu da amizade entre pessoas... E animais.

- Como é que surgiu a ideia de formar um novo partido e de o relacionar tão intimamente com os animais?

Algumas das pessoas que estão neste momento na Comissão Coordenadora do Partido Pelos Animais foram-se conhecendo no decurso de petições apresentadas por cada um de nós. O António Santos, que é o actual Presidente da Associação Desenvolvimento Natura, fez uma petição contra o uso de peles pela estilista Fátima Lopes nas suas criações. O Pedro Oliveira fez uma petição contra o massacre dos golfinhos no Japão, que já juntou cerca de 1.300.000 assinaturas. Eu lancei uma petição não directamente relacionada com os animais, mas contra a opressão que sofrem os tibetanos, por altura dos Jogos Olímpicos do ano passado. Enfim, conhecemo-nos basicamente por apoiarmos as petições uns dos outros e acabámos por constatar que talvez fosse importante, em termos de estratégia, criar um partido político que fosse a voz de todos os que (particulares e associações) defendem os direitos dos animais e a protecção do ambiente. E que defendesse também um outro paradigma mental que consideramos ser importante no início deste 3º milénio: as pessoas têm de mudar a forma como se relacionam com a natureza e com os seres vivos, incluindo o próprio Homem. Este partido não pretende de forma alguma ser monotemático. A ênfase que damos aos direitos dos animais deve-se ao facto de estes serem, regra geral, os mais desprotegidos.

- Consideram então que, dentro dos partidos que existem actualmente no nosso país, os direitos dos animais não são considerados?

As nossas petições tiveram o apoio de pessoas de todo o leque partidário português. O que constatámos foi que, apesar de a protecção dos direitos dos animais estar contemplada nos programas de alguns partidos, nomeadamente do Partido Ecologista “Os Verdes” e do Bloco de Esquerda, na prática muito pouco ou quase nada tem sido feito pelos mesmos em prol dos animais. Mesmo quando aparece, a causa animal está sempre muito diluída noutros assuntos considerados mais importantes. Daí a necessidade de tornar esta questão num alvo central. Não que consideremos que esteja sempre acima de outros interesses, nomeadamente os dos homens, mas achamos ser necessário um partido que tenha em igual consideração os interesses dos animais humanos e não humanos.

Partimos do princípio de que todos os seres vivos têm o mesmo interesse fundamental: viverem a experiência do prazer, do bem-estar ou da felicidade e evitarem a dor. O que pretendemos é que haja uma sociedade orientada e organizada para que possamos, nós, todos os seres sencientes, atingir o mais possível este objectivo.

- Na prática, em que se distinguirão as acções do Partido Pelos Animais daqueles já existentes?

Isso está neste momento a ser alvo de discussão entre todos nós e é precoce desenvolver esse assunto, já que estamos a reunir especialistas nas diversas áreas para estabelecermos um programa com objectivos muito concretos. De qualquer modo, o fundamental é consagrar na Constituição da República Portuguesa o direito de todos os seres sencientes à vida e ao bem-estar. A partir daí serão possíveis alterações jurídicas de fundo, que criminalizem os maus tratos e os atentados à vida dos animais. A par de uma campanha pedagógica, há muita coisa a mudar para acabar com os autênticos campos de concentração para animais da pecuária intensiva, bem como no modo de serem transportados, na desnecessária experimentação científica de que são vítimas, nas condições miseráveis em que se encontram em muitos canis municipais. Há que considerar crime abandonar os animais de companhia. Há que reduzir e suprimir o uso das peles no vestuário. Há que reduzir as taxas que incidem sobre os produtos de origem vegetal e biológica e promover a divulgação de alternativas alimentares vegan-vegetarianas. As consultas e os medicamentos veterinários devem ser comparticipados e dedutíveis no IRS. A esterilização dos animais domésticos deve ser gratuita e deve-se pôr fim à massiva eutanásia de animais saudáveis. E, obviamente, há que acabar com a utilização dos animais em circos, bem como com as touradas.

Em termos da natureza e do ambiente há também que promover um real desenvolvimento sustentável, ensaiar e progressivamente privilegiar modelos de desenvolvimento alternativos, que preservem a diversidade cultural, biológica e ecoregional. Deve-se substituir quanto possível as energias não-renováveis (petróleo, carvão, gás natural, energia nuclear) por energias renováveis e alternativas (solar, eólica, hidráulica, marmotriz, etc.), superando a vulnerabilidade e as dependências de uma economia baseada no petróleo e nos hidrocarbonetos.

Um problema planetário é o do aquecimento global, que pode ter como uma das principais causas todo o processo implicado na produção de carne. Considerando a desflorestação para pastos, o consumo de água e os custos não compensados de tudo isso, torna-se evidente que, além de ser uma violência injustificável para os animais, a alimentação carnívora não é um bom negócio para o homem, em termos ambientais, económicos e de saúde. Todos perdemos, em troca do lucro egoísta dos grandes produtores. É essencial que as pessoas tomem consciência desta realidade.
Por outro lado, há que fiscalizar o cumprimento da legislação existente, embora limitada, o que se torna mais premente no que respeita aos animais. Sabemos que muitas denúncias feitas ao SEPNA (GNR) não têm qualquer consequência, por insuficiente motivação e eficácia das autoridades policiais e jurídicas. Há uma cultura da impunidade quando se trata de ofensas a um animal. Temos de lutar por uma melhor integração dos animais na nossa sociedade, visando o seu bem-estar e, consequentemente, o nosso.

- Consideram-se um partido de extrema-esquerda, esquerda, centro... Ou esta classificação já caiu em desuso?

Não somos um partido extremista, nem nos podemos situar na direita, no centro ou na esquerda, categorias cada vez mais anacrónicas. Somos um partido inteiro, que pretende que se estabeleça um equilíbrio para que todos, e não apenas alguns, possam atingir os objectivos que nos tornam felizes, sem prejudicar os outros seres vivos.

Gostava de salientar que um dos princípios do partido é a não-violência, não só física mas também verbal e mental. Não pretendemos afirmar-nos pela negativa. Não vamos lutar contra os outros partidos. Gostávamos inclusivamente de contribuir para que estes incluíssem na sua agenda política a causa do ambiente e dos animais e fazer algo de concreto por ela. Se isso lhes trouxer votos tanto melhor, desde que os problemas nestas áreas sejam de facto resolvidos. O que nos importa acima de tudo é que estas causas e tudo o que com elas se relaciona se tornem cada vez mais presentes nas referências da população portuguesa, que integrem a sua ordem de valores. Nesse sentido sabemos que temos muito trabalho pela frente, sobretudo de carácter cultural e pedagógico. Temos de formar as mentalidades e as sensibilidades para verem as coisas de outra forma. Precisamos essencialmente de passar informação às pessoas, já que acreditamos que é a ignorância de grande parte da população em relação a estes assuntos, e não o facto de as pessoas serem intrinsecamente más ou cruéis, que as faz desconsiderar que estão a lidar com seres vivos que são sencientes e que não se justifica tratá-los como coisas. Para isto não são necessárias acções espectaculares ou provocatórias, mas sim uma postura o mais responsável, científica e construtiva possível.

- Porquê começar este projecto agora?

Por um lado aconteceu que se constituiu um excelente grupo de trabalho com objectivos comuns. Por outro lado, começámos a constatar que a ideia gerava muito entusiasmo entre as pessoas a quem a expúnhamos. Sentimos ainda que existe actualmente um grande descrédito em relação aos partidos existentes, quer em relação àqueles que têm estado alternadamente no poder, quer aos que têm estado sistematicamente na oposição. Isto revela-se pelo crescente número de abstenções e pelo crescente número de votos em branco. Ou seja, há muitas pessoas que se dão ao trabalho de ir votar, reconhecem que é um direito e um dever, mas não conseguem optar por um partido que as represente. Para estas e para os abstencionistas talvez seja necessário um partido novo que tenha objectivos diferentes daqueles que existem actualmente. Estamos a chegar a um momento crítico em que há o esgotamento de um determinado paradigma mental e civilizacional, que tem obviamente uma expressão social, política e económica. É um tempo que está a chegar ao seu fim, já que nos arriscamos inclusivamente a um colapso violento das estruturas dominantes e temos de arranjar alternativas a este panorama.

- Que dimensão pensa que pode atingir o PPA?

Isso é para nós neste momento uma incógnita, embora tenhamos as melhores expectativas. Sentimos que é um projecto muito recente e ambicioso, em que um elemento algo inédito e até excêntrico pode cativar um grande público, que habitualmente se auto-exclui da política, e reverter a nosso favor. Podemos ser uma alternativa para aquelas pessoas que não se revêem em nenhum dos partidos que existem actualmente, nem no “sistema” dominante. Podemos motivá-las e sensibilizá-las com a nossa proposta, que consideramos ser a única que não se integra no actual sistema. Assim, estamos convencidos que podemos atingir e mobilizar muita gente, embora a intenção deste projecto não seja de todo a busca do poder pelo poder. Se assim fosse ter-nos-íamos inscrito num dos grandes partidos, aqueles que deixam sempre tudo na mesma. A nossa motivação não é essa. Claro que o nosso grande objectivo, a partir do momento em que concorramos às eleições, será ter representação no Parlamento. Não prevemos qual o nível que esta possa atingir, mas o importante é estarmos presentes e dar voz aos que a não têm.