CRUZEIRO SEIXAS:
O ÚLTIMO SURREALISTA PORTUGUÊS
José Almeida
Foi a Fundação
Cupertino de Miranda – instituição que alberga o Centro
Português do Surrealismo, em Vila Nova de Famalicão –, que comunicou a morte de Cruzeiro
Seixas, falecido a 8 de Novembro de 2020, no Hospital Santa Maria, onde se
encontrava internado. Morreu sozinho, como tantos outros portugueses, hoje,
vítimas da “ditadura sanitária”, sem que o “país real”, situado para lá dos
salões, galerias, revistas, círculos culturais e museológicos o conhecessem em
todo o seu génio e grandeza artística.
O homem que
tantas vezes deixou transparecer o seu embaraço perante o Portugal actual e
que, nos últimos tempos, confessou pensar muitas vezes se valeria ainda a pena
viver, finalmente, partiu. Deixou-nos a apenas um mês de comemorar o centenário
do seu aniversário, que seria celebrado a 3 de Dezembro. Para trás ficou um
vasto legado artístico e poético, integrado no capítulo de ouro da arte
portuguesa do século XX, podendo ser apenas igualado, no campo do surrealismo,
por António Pedro que, tal como ele, foi simultaneamente pintor, ilustrador,
escultor e poeta. Criador multímodo, poliédrico e pluridisciplinar, Cruzeiro
Seixas perscrutou à sua maneira a alma portuguesa. Observador activo,
personalidade subversiva, foi um agente crítico e mordaz que soube causar o
espanto e fazer notícia, mais com o talento e uma distinta elegância do que com
o recurso fácil do escândalo. A sua irreverente personalidade deixará,
certamente, muitas saudades à cultura nacional.