DA MEMÓRIA… JOSÉ LANÇA-COELHO
Aqui estou no meu monte alentejano, rodeado de sobreiros e oliveiras, passando o Verão. Já não posso dizer as férias, porque, felizmente, reformei-me do ensino há dois anos. Assim, vou consumindo os dias com leitura (muita), escrita (alguma) e banhos de piscina. Ao fim da tarde, quando as temperaturas de quarenta e tal graus se começam a dissipar, ajudo, apressadamente, a minha mulher na rega do jardim e do pomar, pois é a hora dos mosquitos dos arrozais começarem a picar.
O monte é a minha torre de marfim, retiro espiritual trazido para o universo das Letras pelo filósofo francês Montaigne. Inauguro anualmente a época balnear nos feriados do 25 de Abril ou no 1º de Maio e, depois, sempre que posso, faço duzentos quilómetros para me exilar voluntariamente, entremeando as leituras e a escrita com os banhos semi-quentes, pois a água da piscina é raro o dia que não atinge os 30ºC.
Desde que me aposentei que, entre outras coisas, comecei a numerar os livros que leio, para, no final do ano, ter a noção exacta da quantidade de livros que li. Assim, sei que, em 2008, li 59 livros e em finais de Agosto, tinha lido 39; em 2009, estes dois números, respectivamente, eram 60 e 41; e, neste Verão de 2010, vou com 35 livros lidos. Claro que, o número de livros lidos depende, entre muitas coisas, da quantidade de páginas de cada um. E depois, há sempre os livros eleitos, aqueles que se demarcam subjectivamente dos outros, de acordo com o gosto e sensibilidade do leitor. Isto para além da releitura de clássicos que são do meu total agrado como, Pessoa, Eça e Torga, entre outros.
Em 2008, os livros que mais me disseram foram:
“Boa Noite Senhor Soares” de Mário Cláudio; “Os Pilares da Terra” de Ken Follett; “O Jogo do Anjo” de Carlos Ruis Zafon;
em 2009, os eleitos foram “A Ministra” de Miguel Real; “Nove Mil Passos” de Pedro Almeida Vieira, e, “Mão Direita do Diabo” de Denis Mcshade.
Em 2010, quando estão decorridos oito meses do ano, tenho já como eleitas as seguintes obras:
“Gráfico de Vendas com Orquídea” de Dinis Machado; “Fúria Divina” de José Rodrigues dos Santos; “Carta de Sócrates ao seu vergonhoso amante Alcibíades” de Miguel Real, e, ”Ir à Índia sem Abandonar Portugal” de Agostinho da Silva.
Permitam-me algumas palavras sobre a razão da minha escolha para o actual ano:
embora o livro de Dinis Machado tenha saído há algum tempo só agora tive oportunidade de o ler, Machado revela-se cada vez mais uma voz sui generis na nossa literatura, quem leu “O que diz Molero” sabe bem a que me refiro;
José Rodrigues dos Santos dá neste seu livro uma dimensão do perigo que a Al-Qaeda e Bin Laden representam para o Ocidente;
a obra de Miguel Real é uma reedição, nele o autor dá-nos um Sócrates com uma dimensão a que não estamos habituados e por isso, surpreendente, privilegiando o físico em troco do racional;
finalmente, Agostinho da Silva é uma revelação com as suas teorias sobre a idade da reforma, para além de outras problemáticas relacionadas com a História e a Literatura portuguesas, onde pontificam Pessoa, Camões, Vieira, Camilo, Sérgio, Magalhães Lima, Sampaio Bruno, Teixeira Rego, Leonardo, Junqueiro, Espinosa, D. Dinis, Infante D. Henrique, D. João II e outros.