A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
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Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

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Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

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sexta-feira, 19 de março de 2010

Para ler o resto, vai ter que esperar pelo nº 6 da NOVA ÁGUIA...

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Giambattista e Vico e Europa: Ciência da Lira e das Nações

RODRIGO SOBRAL CUNHA

Começamos por tomar emprestada ao autor da Scienza Nuova a imagem com que, na sua Vita, designa os Pensées de Pascal, lumi sparsi, que serão aqui uns tantos pontos de vista de alguns ilustres leitores europeus do platónico partenopeu, demasiadas vezes denominado obscuro.
Esse “homem misterioso” (como o designa Antero de Quental, em 1866), que teve, entre outros, o dom da profecia retrospectiva, não poderia talvez imaginar até que ponto o mal-entendido perseguiria a sua obra ao longo de mais de dois séculos e meio, ainda que não pouco da obscuridade desta, deliberada, tivesse em vista reproduzir o eco e os reflexos, entrecortados no claro-escuro do tempo, das cisões que as idades do homem assinalam sobre a terra.
Assim, era natural que fossem os philosophes iluministas a dicionarizá-lo como o “ilegível” e “confuso” professor de eloquência da Universidade de Nápoles, primeiro doutrinador anti-cartesiano, ao que então mais parecia importar, estranho inimigo da rationalité, autor ainda de uma teoria dos ciclos históricos, quando não o “fundador da filosofia da história”, que anteciparia em parte algumas “teorias” do romantismo, em parte outras do fundador do positivismo. E a pouco mais do que isto se resumem, da primeira metade do século XVIII a esta parte ainda, a generalidade dos verbetes sobre o filósofo italiano. Isto no tocante à superfície.
Todavia, ainda em 1841, o viajado Visconde de Sernancelhe José da Gama e Castro, colocava estas considerações aos pés de O Novo Príncipe:

“Entre os mais recomendáveis publicistas que escreveram pelos princípios do século de setecentos, há um quase de todo desconhecido, ainda entre os seus, porque a muita originalidade com que escreve o torna obscuro, e exige, para cabalmente compreendê-lo meditação e estudo. Chama-se João Baptista Vico. De todos os escritores de que até agora me tem chegado notícia, nenhum me parece haver tratado com tanto conhecimento de causa da origem das línguas, da formação das nações, e de muitos outros objectos não menos curiosos que interessantes.”

É à terceira leitura que, segundo Vico, se entra na Scienza Nuova, ainda que, por outro lado, o número de pontos de vista patentes nessa obra seja quase inexaurível. Jules Michelet, que desde 1824 apresentou o pensamento de Vico à Europa do século XIX, escreveu:

“No vasto sistema do fundador da metafísica da história, existe já, pelo menos em germe, todo o trabalho da moderna sabedoria. Como Wolf, disse ele que a Ilíada era o trabalho de um povo, seu trabalho erudito e última expressão, depois de muitos séculos de inspirada poesia. Como Creuzer e Görres, interpretou as figuras heróicas e divinas da história primitiva como ideias e símbolos. Antes de Montesquieu e Gans, mostrou como o direito surge dos costumes de um povo e representa fielmente cada etapa da sua história. O que Niebuhr encontraria após vastas pesquisas, foi adivinhado por Vico; ele restaurou a Roma dos patrícios e fez viver de novo as suas curiae e suas gentes. Certamente, se Pitágoras recordaria ter lutado sob as muralhas de Tróia numa vida anterior, esses ilustres germanos podiam ter lembrado haverem todos eles vivido anteriormente em Vico. Todos os gigantes do criticismo estão já contidos e sobra lugar, no pequeno pandemónio da Ciência Nova.”

Um dos jovens discípulos de Michelet, entre os muitos que por aqui encontrou o mestre humanista francês, Oliveira Martins, escreveria em 1872:

“Presidindo à descoberta da psicologia metafísica, feita pela filosofia alemã, presidindo à teoria da economia social, feita pela raça anglo-saxónica, presidindo à escola histórica, Vico aparece aos olhos do historiador como um destes espíritos gigantes e precursores que, pela própria força e liberdade, determinam e descobrem, indicam e registam, os caminhos diferentes que a humanidade tem de seguir dentro do ciclo que uma concepção determinada do todo ilumina.”

A apresentação de Vico ao século XX, coube ao admirável esforço do seu conterrâneo Benedetto Croce, promotor, desde 1904, dos studi vichiani, movendo o filósofo idealista italiano a ideia de se encontrar no pensamento de Vico o século XIX em gérmen.
Michelet escrevera: “A palavra da Scienza Nuova é esta: a humanidade é a sua própria obra.” E é talvez este mote do romantismo liberal do historiador da Revolução que define todo um ciclo hermenêutico, mais aparente, da obra do luminar napolitano e que, passando por Croce, vem até aos nossos dias.
Um juízo do autor da Teoria do Ser e da Verdade, juízo relativo ao Sistema dos Mitos Religiosos de Oliveira Martins, vale todavia para o referido ciclo hermenêutico:

“Não vê que os mitos assinalam, entre brumas, três idades: a divina, a cósmica, a simplesmente humana.”

Um século depois daquelas palavras de Oliveira Martins, atrás citadas, escrevia o filósofo lusitano:

“Se os portugueses tivessem sido atentos ao que ocorreu na Itália, após o profundo e pletórico Renascimento, particularmente com o pensamento de Vico e a meditação do tempo e da história, do mito e da simbólica na Scienza Nuova, os nossos próprios caminhos ter-se-iam esclarecido. Mas não é impossível hoje regressar ao ponto de meditação que dizemos crucial.”

Reiteradamente afirmou Vico que uma das principais descobertas da Scienza Nuova e aquela que precisamente a converte em ciência, é a de uma história ideal eterna percorrida no tempo pelas nações. Segundo ele, o “curso” efectuado por estas, de que Roma é caso paradigmático, compreende três diferentes tipos de tempo, como de naturezas, três espécies de costumes, como de direito natural, três Estados civis ou Repúblicas, três tipos de jurisprudência assistida por três diferentes espécies de autoridade, três tipos de razões e juízos e três diferentes formas de linguagem. De da idade histórica, a dos homens, é próprio o pensamento discursivo, estruturado por géneros inteligíveis ou abstractos, manifestos na racionalidade da filosofia e da ciência, já as outras duas idades fundamentam-se nos universais imaginativos ou fantásticos, que a lógica poética da Scienza Nuova, adunando-se à sapienza poetica, deixará entrever como o próprio do mito e da fábula. A arqueologia do génio partenopeu procurará demonstrar, com efeito, como à fábula, posterior ao mito, corresponde, de acordo com a remota tradição, a vera narratio, a fala de outrora, característica das formas primevas do ser e do saber, em cujo centro luz a sapiência poética. Esta, segundo Vico, é a chiave maestra da Scienza Nuova.
A Scienza Nuova de Giambattista Vico, que meditou “sobre os mistérios que as tríades de longe procuram significar e até exprimir” (Álvaro Ribeiro) , é assim obra de tripla dimensão hermenêutica, correspondente aos três níveis de leitura para que esse livro, a nosso ver, aponta. São estes, em primeiro lugar e para a época em que foi Vico chamado a viver, decerto ainda a nossa, o de uma antropologia humanista, o de uma ontologia nobiliárquica e o de uma teologia providencialista; esta, princípio e fim de toda a verdadeira scientia .
A alta concepção do modo como a vera tradição humanista – isto é: a scientia de rerum divinarum et humanarum – culmina na Scienza Nuova, para ser justamente atendida, deve ser identificada com o tipo de acção prudencial entregue às mentes heróicas, cuja vigilância procura cumprir os desígnios da providência, salvaguardando o sensus communis, ou sentido comunitário, para bem da humanitas, de acordo com a vis veri da heroica sapientia.

(...)