A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
Sede Editorial: Zéfiro - Edições e Actividades Culturais, Apartado 21 (2711-953 Sintra). 
Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

Donde vimos, para onde vamos...
Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

Onde temos ido: Mapiáguio (locais de lançamentos da NOVA ÁGUIA)

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sábado, 14 de novembro de 2009

Texto que nos chegou...

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Cogitações de um universitário (da última década do século XX) para quem a(s) Universidade(s) nada contribuíram para o encontro com o pensamento português

Em tempo de evocação ao movimento da Renascença Portuguesa, apraz-me tecer breves considerações acerca do pensamento especulativo a que deu origem e ao desprezo a que durante décadas o mesmo foi votado pelos portugueses. Desdém este que se deve à indiferença a que os nossos intelectuais e a nossa Universidade o condenaram. E se a Universidade desprezava por completo estes movimentos e o pensamento daqueles que os encabeçavam, como poderiam ser difundidos os seus ideais pelo resto da população pouco culta e totalmente iletrada?
É claro que os renascentes também não fizeram tudo para evitar polémicas e cisões desnecessárias, tendo, entre todos, responsabilidades efectivas para o facto de o Movimento não ter tido a longevidade que prometia. Convém não esquecer as dissenções na sua origem que levaram a curto prazo ao aparecimento de outras associações similares.
É inquestionável a qualidade daqueles que deram forma ao movimento da Renascença Portuguesa entre os anos de 1910 e 1932. A revista A Águia (1910-1932), durante vinte e dois anos, foi o seu principal órgão oficial, a que se juntou o boletim A Vida Portuguesa (1912-1915) e a efémera publicação Princípio (1930). Teixeira de Pascoaes, Mário Beirão, Leonardo Coimbra, Jaime Cortesão, Raul Proença, António Sérgio, Manuel Laranjeira, Agostinho da Silva, entre tantos outros, de uma maneira ou de outra, foram dando alma ao projecto.
Não sei o que seria a vida literária nos primeiros anos do século XX, mas sei que a multidão de analfabetos que invadia o país, dava a estes movimentos uma fraca visibilidade, mesmo nas duas ou três maiores cidades em que tinham sede.
Estes eram grupos híbridos de intelectuais e artistas em que, uns tinham vida universitária e outros não; uns ocupavam lugares públicos de destaque, outros não. Uns, como na altura era possível, viviam materialmente desafogados, dedicando todo o tempo à criação, outros viviam com muitas dificuldades materiais.
As publicações que eram os órgãos de difusão dos seus propósitos serviam para, num tempo de edição muito difícil, dar a conhecer ao público culto a obra produzida por aqueles que neles militavam.
Nesta ambiência a Renascença Portuguesa cumpriu os seus objectivos. A sua importância para a publicação da obra original pode ser conferida no escrito de António Sérgio intitulado “Sobre a minha colaboração na obra da Renascença Portuguesa”, Portucale, 3ª série, vol. I, nº 3 (1955), onde reconhece ter usado a Renascença e a sua revista A Águia para se dar a conhecer e ver facilitado o seu desejo de fundar o Movimento “concorrente” da Seara Nova, facto que veio a ocorrer no ano de 1921.
Quando consultamos os órgãos de difusão do ideário renascente vemos o seu conteúdo preenchido essencialmente por pensamento original. Mesmo quando se trata de pensamento especulativo de análise ao pensamento de um dado autor, nunca se fica pela mera hermenêutica do mesmo, apontando, aquele que escreve para o divulgar, uma posição crítica original reveladora do seu próprio pensamento, não se preocupando com a mera análise interpretativa que subjaz ao trabalho científico.
Alfredo Ribeiro dos Santos em A Renascença Portuguesa, um movimento cultural portuense (1990) e Paulo Samuel em A Renascença Portuguesa - um perfil documental (1991), elencam a participação plural, as reacções e contra reacções, à linha de pensamento que o Movimento foi produzindo. Também Manuel Ferreira Patrício em “O problema da educação na Renascença Portuguesa” (2002) e Pinharanda Gomes em A ‘Escola Portuense’. Uma introdução histórico-filosófica (2006) estabelecem marcos fundamentais da génese e evolução da plêiade de pensadores que das maneiras mais dispares foram formados nos ideias da Renascença Portuguesa e alimentaram com o seu pensamento e acção algumas figuras gradas que vieram a dar corpo ao ensino ministrado nessa fascinante (ao que os testemunhos indicam) primeira Faculdade de Letras da Universidade do Porto.

Os representantes destas associações vagueavam de tertúlia em tertúlia e como algumas delas decorriam em locais públicos de certeza que seriam tidos entre as pessoas comuns como extravagantes que pouco contribuíam para o progresso de Portugal. E como muitos deles se envolviam nas disputas políticas em épocas de grande agitação social, com maior desconfiança seriam olhados.
O clima de inveja e maledicência permanente que reinava entre pares também não abonaria a uma boa imagem junto das classes populares mais esclarecidas.
Certo é que o legado que nos deixaram é de valor inquestionável, como certo é, que diversas gerações de portugueses, foram educadas no desconhecimento absoluto destes movimentos e da sua importância no lançamento de autores/criadores importantes do panorama português. As universidades, onde era e continua a ser suposto formar as elites portuguesas, ministravam (e ainda ministram) um ensino estrangeirado, ensinando cultura portuguesa e pensamento português com o recurso a autores e correntes estrangeiras. Os seus alunos saíam de lá como entravam: no desconhecimento absoluto da existência e do valor do pensamento português, pois ninguém lho dava a conhecer, nem sequer em pequenas menções. Daqueles que encarnaram o espírito da Renascença sob o influxo de Leonardo Coimbra na primeira Faculdade de Letras do Porto e que foram muitos, só uma pequeníssima minoria veio a leccionar no ensino superior, como é o caso de Delfim Santos. Note-se, por exemplo, que a longa e acesa polémica alimentada entre António Sérgio e Santana Dionísio sobre o valor especulativo da obra de Leonardo Coimbra decorreu totalmente fora do circuito universitário. E outros casos poderiam ser invocados.
Neste clima quem alimentava viva a chama do pensamento português eram as tertúlias e outros pequenos meios de reunião, discussão e publicação de um ideário completamente posto de parte pelas elites que nos governavam e por aqueles que tinham a missão política de elencar o que era ou não era digno de ser ensinado ao povo português nas instituições de ensino tuteladas pelo Estado.
Desta forma, aproveitando a crise da Universidade depressa se gerou em Portugal, por parte daqueles que alimentavam estes movimentos, um ódio cerrado a esta vetusta instituição, apelando ao seu fecho definitivo, tirando, dessa forma, o ónus do seu funcionamento da despesa pública que consumia. Maneira de pensar comum a movimentos contestatários de outros países. Esta radicalidade advinha do seu convencimento de que elas para nada serviam à difusão e conhecimento de um pensamento originariamente português.
Da maior importância, contudo, é o facto de a Renascença Portuguesa se ter centrado na realidade nacional, tentando os seus elementos propor e reflectir um ideário pátrio que pretendiam que fosse de complementaridade entre a razão e o sentir, o pensar e o intuir, fugindo ao crescente cientismo e positivismo para que o mundo civilizado e Portugal com ele, iam caminhando. Com esta maneira de proceder tentavam combater o pensamento hegemónico e dominante que pretendia anular as particularidades e as maneiras próprias de sentir e pensar de cada Nação.
A Renascença Portuguesa tem o condão de ser um Movimento que se opôs, apesar de todos os constrangimentos, a um pensamento massificante e alienante da condição humana. O sentir nacional, mesmo após as dissidências, ficaria marcado, de uma maneira ou de outra, naqueles que aí militaram como é patente na obra de Fernando Pessoa, António Sérgio, Jaime Cortesão…

Mais recentemente temos que realçar de forma positiva o esforço de uma nova geração de universitários que introduziram nas academias onde prestam os seus serviços o pensamento português, elevando o seu estudo a níveis nunca antes vistos, derrubando tabus e dando a conhecer todas as suas potencialidades.
Nesta demanda marca lugar de destaque o Centro Regional do Porto da Universidade Católica que através do seu Centro de Estudos do Pensamento Português tem promovido, sobretudo sobre as correntes e os autores que fizeram do Porto a base da sua aprendizagem e do seu trabalho, encontros científicos de alto nível muito participados e abrangentes, reflectindo a origem e a continuidade do pensamento que estes movimentos geraram. Tem também procedido à edição crítica da obra de dois dos vultos da ‘Escola Portuense’: Sampaio Bruno e Leonardo Coimbra. Outras universidades estatais têm vindo a pôr um enfoque especial no pensamento português, felizmente. Esperemos que este investimento não se deva a nenhuma circunstância particular, mas sim a uma verdadeira intenção de, definitivamente, elevar o pensamento português ao lugar que de pleno direito deve ocupar dentro das respectivas academias.
O preconceito que ainda existe em relação a alguns investigadores do pensamento português de quem a obra deliberadamente se diz desconhecer, colocando-os num esquecimento empobrecedor, denota que apesar de mudarem os tempos, os vícios tendem a manter-se. Por outro lado, há uma tendência a aparecerem, nos mais diversos fóruns, sempre os mesmos intérpretes a falar sobre o que quer que seja, o que leva a um enfraquecimento da reflexão pelo estilo repetitivo e pouco criativo de interpretação proporcionada.

A Nova Águia surgida em 2008 assume-se devedora da gesta renascente ao lado de outros movimentos como a Nova Renascença sedeado no Porto e capitaneado durante anos pelo já falecido professor José Augusto Seabra. É claro que houve outros exemplos de iniciativa individual que insistiram em dar a conhecer a excelência desse ideário que se propagou na obra daqueles que estiveram na sua fundação. É o caso de Santana Dionísio em cujo labor esse tributo aparece frequentemente associado à exposição e defesa do pensamento de Leonardo Coimbra, que durante anos tão mal compreendido e apreciado foi entre os intelectuais do seu povo. Precisamente ele que nunca se inibiu de propor uma matriz portuguesa para o pensamento e a especulação que se ia fazendo entre nós.
A Nova Águia criou algumas expectativas e tem mostrado grande capacidade para atender à participação de todos aqueles que estão interessados em pensar Portugal, ou melhor, a grande comunidade lusófona. Esperemos que assim continue pois o progresso do pensamento e a afirmação das ideias só se pode fazer com o recurso ao contraditório. A Águia, órgão oficial da Renascença Portuguesa também privilegiou a crítica e divulgou os opositores do seu ideário. Entre as controvérsias que acolheu está a que opôs Pascoaes e António Sérgio sobre o saudosismo, compilada por P. Gomes em Teixeira de Pascoaes, A saudade e o saudosismo (1988).

É verdade que os tempos que correm têm sido mais propícios ao interesse pelo pensamento nacional. As universidades já o acolhem, pelo menos no patamar da evocação, pois os currículos continuam a ser fortemente estrangeirados.
Também a sociedade de agora é mais esclarecida e não sente tanto a rejeição pura e simples do que é português. Esse esclarecimento tem levado a uma maior autonomia do pensamento, derrubando a tendência que havia de seguir as opiniões tidas como boas de dois ou três intérpretes que se auto-consideravam como especialistas na matéria.
Há, também, um maior apoio, local e nacional, à investigação sobre temas de matriz exclusivamente portuguesa. Estamos contudo vários patamares abaixo daquilo que se passa nos países ditos civilizados. Basta dizer que os portugueses se envergonham de não saberem outro idioma, nomeadamente a língua franca que actualmente é o Inglês, enquanto que alemães, russos, noruegueses, suecos… mesmo que dominem o inglês, falam e têm orgulho nas suas línguas nacionais que também não são de fácil apreensão.
Alguns eruditos que tendo feito carreira no estrangeiro, de uma maneira ou de outra, escolheram alimentar-se e alimentarem o pensamento português também têm contribuído para pôr o pensamento português na ordem do dia. É o caso do ensaísta Eduardo Lourenço que não se importou de trazer para a sua análise e crítica, temas como a saudade, que são muito depreciados pelo grosso da comunidade dos nossos pensadores, embrenhados ainda num pensamento fortemente racionalista e positivista.
Continua a haver um clima tenso entre as correntes do pensamento português e aqueles que se intitulam de seus legítimos representantes. Os que estão fora das universidades reúnem-se por afinidades em torno de pequenos grupos pensando, em muitos casos, que são os únicos herdeiros da tradição portuguesa e por isso abrem várias guerras àqueles que por não pensarem como eles, no seu entendimento, não têm legitimidade de falar em nome da tradição especulativa portuguesa. Todos estes grupos continuam a resistir ao trabalho realizado nas academias, denegrindo-o com frequência, apesar do valor que mostrar possuir. Parece que se acham portadores de uma verdade absoluta e por isso excluem todos aqueles que não concordarem com os seus princípios de análise e crítica.
Por outro lado, as universidades criaram as suas linhas de investigação e por questões de mentalidade e alguma sobranceria não acolhem no seu seio aqueles que não lhes pertencem de pleno direito. Em Portugal o autodidatismo e a obra de investigação e reflexão realizada fora das universidades, é por esta comunidade muitas vezes combatida e quase sempre ignorada.
É tempo, então, de a Nova Águia e outros movimentos afins se juntarem para acrescentar, em vez de se separarem para diminuir. Todos aqueles que estão dispostos a pensar a portugalidade e a lusofonia, quer sejam portadores de uma visão mais racional ou mais espiritual, têm de colaborar entre si, porque a procura da unidade supõe a complementaridade e não a exclusão. Quem se propõe pensar Portugal contribui com a sua parcela para contrariar a constatação de Fernando Pessoa ao reparar que depois de os portugueses terem construído um Império, continua a faltar que se cumpra Portugal. Aparentemente a obra mais simples, continua inacabada…
É então chegada a hora de todos os portugueses interessados no mesmo ideário unirem esforços para juntar o seu trabalho ao labor de todos os outros que perseguem os mesmos objectivos, mesmo que as intercepções possam parecer impossíveis. É este o maior desafio para as novas gerações de portugueses: acrescentar para completar em vez de excluir para fragmentar.
Assim todos o queiramos, assim todos o conseguiremos!

Artur Manso