A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
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Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

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Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

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segunda-feira, 29 de junho de 2009

O fim do homem neste mundo é libertar-se a si, libertando os outros seres

"Porque o desfecho e remate do homem não é gozar, repita-se. Se o mundo não existe para que o homem o saiba, odioso seria fantasiar que o universo continua subsistindo para que o desfrute o homem. Este erro antropocêntrico é a imoralíssima moral dos filósofos evolucionistas [...].

O fim do homem neste mundo é libertar-se a si, libertando os outros seres.[...]

A moral religiosa é falsa, porque é a moral do indivíduo. A moral filosófica, à maneira materialista, positivista, evolucionista, livre-pensante, é falsa, porque exclui os animais. A moral ascética é falsa, porque exclui as coisas.
O ascetismo e o abandono são falsos, porque importariam ou a salvação pessoal ou, tão só, a sectarista. A não resistência ao mal é falsa, porque, precisamente, eliminar o mal é o fim do homem, único e supremo.
Não foi Tolstoi. Quem encontrou a palavra do enigma foi o poeta alemão Novalis. Novalis escreveu que: - o fim do Homem é ajudar a evolução da Natureza. Esta palavra vai até o fundo do fundo do abismo. Nunca nenhuma assim sublime brotou de lábios inspirados. O fim do Homem é ajudar a evolução da Natureza.
Como? Trabalhando, para saber, a fim de poder. E, podendo, cumpre-lhe esquecer-se, não acreditando, como até aqui, que a decifração dos mistérios é para que sua curiosidade se satisfaça; para que, redundantemente, seus prazeres aumentem. O homem tem de dar contas do supremo dever que lhe incumbe, o dever para com a natureza inteira. Libertando-se a si, libertando os seus irmãos de espécie, ele contribuirá já para a grande libertação universal"

- Sampaio Bruno, A Ideia de Deus, Porto, Lello & Irmão, 1902, pp.468-470.

16 comentários:

Paulo Borges disse...

Bruno antecipa em quase um século a crítica radical do especismo, que é hoje uma das principais questões ético-filosóficas do nosso tempo. Depois do racismo e do sexismo, o especismo é o grande adversário a abater para a evolução humana e o progresso da civilização.

Veja-se o debate que segue no Público on line de hoje sobre o Partido Pelos Animais, sobre o qual saiu uma notícia na edição impressa.

Renato Epifânio disse...

Não penso que o "especismo" seja equiparável ao racismo ou ao sexismo. Aliás, foi em nome do "especismo" ("há apenas uma espécie humana") que se "acabou" com o sexismo e o racismo...

Que essa perspectiva "igualitarista cósmica" esteja na moda, isso é verdade. Mas isso não faz dela verdadeira...

Ela acompanha, apenas, o colapso de todas as perspectivas hierarquizantes, o que filosoficamente não me pareça que possa ser simplesmente exaltado. Há um reverso em tudo isto, bem deplorável...

Casimiro Ceivães disse...

Este texto do Bruno é exactamente 'especista', e a leitura que o Paulo só é desculpável pelo entusiasmo. Bruno não defende que a "libertação da Natureza" seja tarefa dos esquilos ou dos picapaus, mas sim do Homem. E isto significa que o Homem tem, no conjunto dos seres criados, um papel distinto do dos outros seres. Confundir isto com a crítica à permissão de crueldade gratuita aos animais, e confundir compaixão com igualdade é coisa que o pensamento cristão-ocidental ultrapassou há dois mil anos (deus não é igual ao homem, e tem compaixão por ele).

Que o fim do homem não é 'gozar', eis o que, na Idade Média, seria uma afirmação surpreendente: tão evidente que era. Como todo o pensamento do séc. XIX, trata-se apenas do mal-estar da modernidade, e não mais do que isso...

Casimiro Ceivães disse...

"o grande adversário a abater para a evolução humana e o progresso da civilização" - isto sim, parece que estou a ouvir Vitor Hugo ;)

Ariana Lusitana disse...

Quem é que se lembra do autor de uma história em que um homem que odiava as cores pintava tudo de branco?

Paulo Borges disse...

Mas não estou, aqui e noutros lugares, farto de dizer que o homem tem um papel distinto e até superior ao dos outros seres? Somente esse papel não é o de os explorar, oprimir e instrumentalizar, mas de os libertar, conforme bem aponta Bruno. Agora se o não fizer, como o não está a fazer, torna-se inferior e cai mais baixo na hierarquia dos valores. Quem mais pode e menos faz vale menos do que todos os demais.

O branco contém todas as cores.

Já agora leiam "Libertação Animal", de Peter Singer, e depois falem comigo. Duvido que se possa considerar culto, hoje em dia, quem ignorar as realidades e questões ali levantadas.

Casimiro Ceivães disse...

Paulo, calma :)

1. O livro do Peter Singer é muito bom, faz pensar, e também recomendo a sua leitura. Tal como a 'Ética Prática'. Acrescentaria o Alasdair MacIntyre, 'Rational Dependent Animals', o Frans de Waals 'The Ape and the Sushi Master', e o fascinante "The Sexual Politics of Meal - A Feminist-Vegetarian Critical Theory" de Carol Adams. E como literatura, "As vidas dos animais", do Nobel Coetzee (esse talvez o mais brilhante, na parte da discussão com o 'poeta').

2. Todos partem (e se quedam) numa concepção estritamente biológica do homem que eu não aceito - mas não será por isso que não os discutiremos.

3. A tese do velho Bruno, mais do que antecipadora do 'trans-especismo' (ofereço-lhe este neologismo) não é mais do que eco da ocidentalíssima Gnose - a 'libertação' da Natureza/Criação das 'trevas' em que um oculto Demiurgo a colocou, como castigo, labirinto ou caminho de iniciação. Nada que a teologia cristã não conheça ou reconheça, sendo apenas mais discreta na forma de o exprimir - mas basta ler o agora ignorado P.e Teillard de Chardin, que tanto influenciou os pensadores europeus de meados do séc. XX. E basta atentar no Bruno e no seu apelo a uma moral que inclua 'as coisas'.

4. Já agora, a crítica à 'moral religiosa' falha o alvo (na parte em que se dirige ao catolicismo) pois não tem em conta a economia da Comunhão dos Santos, que não respeita ao indivíduo. Assim, falhará o alvo a moral (hipócrita) de um ateu que adira exteriormente a uma moral 'católica' em nome de valores 'terrenos'. Como scedeu em tão larga medida nos sécs. descristianizados, XVIII e XIX.

5. Continuo a não ver respondida a questão essencial, que é da relação entre os fins últimos do homem e a sua acção colectiva - o também velho problema da relação entre a Cidade de Deus e a dos Homens. Conheço povos, e o Paulo também conhecerá, em que um clero místico conviveu serenamente com um povo faminto e iletrado - especialmente no Oriente. Como julgar essas situações?

6. E voltamos ao Bruno: decifração de que 'mistérios'? Não certamente os da natureza no sentido do Bacon e do Hobbes. A quem 'prestar contas'? Não certamente ao 'Supremo Ente' da pseudogeometria racionalista-maçónica... A quem, em Bruno?

7. O resto é apenas a fascinante questão da alma dos animais, e do mundo verdadeiro por etrás dos véus.

8. Em qualquer caso, plenissimamente de acordo com os aspectos 'políticos' suscitados pelo apelo a um olhar 'ético' (que pena ter-se perdido a belíssima palavra 'compassivo') para com os animais, os 'bichinhos' do Frei Agostinho da Cruz... Teremos mesmo que levar os problemas económico-sociais a sério, e de uma vez por todas. Sem fraseados, apelos a frases de sábios e a razões transcendentes. Espero que aquilo que nos move (ao MIL, que é um movimento - não à Nova Águia, que o não é) seja isso mesmo.

PS. Fiquei especialmente fascinado com as 'non-leather Doc Martens" da filha do Peter Singer...

Casimiro Ceivães disse...

Quanto ao branco:

A salsicha também contém (quase) todos os animais. Isso não basta.

Ariana Lusitana disse...

O fim do homem neste mundo é uma pazada de cal na cara.

Ariana Lusitana disse...

E eu acho que quem não souber cavar nunca será culto...

Paulo Borges disse...

Casimiro, não encontro tempo para responder a todas as suas questões, que agradeço. Só diria que o especismo - cujo esquema mental é o mesmo do racismo e do sexismo - é o resultado do obscurecimento da nossa consciência, que vê espécies onde no fundo as não há. Mesmo admitindo um Deus criador, coisa a meu ver completamente ilógica, não vejo porque havia de criar um universo hierarquizado, com seres superiores e inferiores, sendo uns destinados a servir e a garantir a sobrevivência dos outros. Por isso gosto muito de Orígenes, o único criacionista com sentido: como diz no "Peri Archon", um Deus-Espírito-Amor só poderia criar espíritos em perfeita igualdade. Foi o esfriamento do amor que ligava esses seres à sua fonte que fez de uns anjos, de outros homens, de outros animais, de outros demónios (Leonardo Coimbra diz o mesmo, nalgumas passagens...). No fundo, a forma que cada ser vai tendo, em contínua metamorfose, não depende de Deus, mas de si. Claro que a ortodoxia baniu isto: de outro modo, o cristianismo aceitaria hoje a chamada "reencarnação" e teríamos uma humanidade mais auto-responsável, sem a perversão de imaginar uma providência divina, social ou estatal para se desculpar de todas as suas fraquezas e mediocridades.

Eu não separo fins últimos e finalidades terrenas. Isso é uma invenção cristã que não me atrapalha. O único sentido do mundo e da sua organização social, económica e política é facilitar o mais possível que dele e de nós nos libertemos, vendo-o e vendo-nos tal qual somos: ilusões em carne viva. Enquanto isso não acontece, e tendo em conta que nem todos se querem libertar, o que é ético é assegurar que se cumpra o único interesse comum a todos os seres sensíveis: reduzir o sofrimento e aumentar o bem-estar, sem discriminação de indivíduos, sexos, povos, pátrias e espécies.
O resto são tretas.

Renato Epifânio disse...

Apenas mais umas achas para a fogueira:

1. Só uma visão hierárquica do Universo integra e preserva (e daí o erro de todos os igualitarismos).

2. A questão do Bruno, como o Casimiro bem salientou, parte de outras premissas: o "horror da existência", a "culpa de haver nascido", etc. Daí a obsessão com a libertação (ontológica). Pela minha parte (cada um falará por si), não sinto culpa de ter nascido e gosto de existir: logo, não quero ser "libertado".

3. Quanto ao igualitarismo entre "todos os seres sensíveis", essa é também uma visão na prática insustentável:
a) não se pode, por exemplo, pôr no mesmo plano o cão do vizinho ou a mosca que no outro dia o Obama matou em directo...
b) e, mesma na "natureza", dá-se muitas vezes o caso do homem ter de matar para preservar o equilíbrio ecológico...

Paulo Borges disse...

1. A visão hierárquica do universo só integra e preserva o que imagina haver a integrar e preservar.

2. Ninguém se quer libertar enquanto tudo corre bem. Espero que nunca tenhas de te querer libertar, embora no fundo isso não me pareça ser o melhor para ti.

3. Quanto à relativização prática da igualdade de interesses fundamentais dos seres, o próprio Peter Singer reconhece que ela por vezes é exigida, mas apenas quando não há alternativa. Os seus livros dão exemplos e discutem os critérios.

Casimiro Ceivães disse...

"...universo hierarquizado, com seres superiores e inferiores, sendo uns destinados a servir e a garantir a sobrevivência dos outros"

Ah, é esta noção de hierarquia o ponto centralíssimo a debater.

Como qualquer teólogo cristão explicará, nós não servimos os anjos.

Comecemos por nos libertar da "relação (dialéctica? - deixo-vos isto, oh filósofos) senhor-escravo", já que de libertação se trata aqui...

Muito há a aprender com as noções da ciência mais moderna de "entangled hierarchy", "hiérarchie enchevêtrée" (não me ocorre a tradução portuguesa). "Servus servorum Dei", o topo.

Paulo Borges disse...

Referia-me à suposta relação entre homens e animais. Agora, no que entendo ser uma verdadeira visão cristã do mundo, pouco praticada, não há qualquer hierarquia ontológica ou cratológica (de poder) entre os seres. É Deus que em primeira e última instância os serve a todos, no acto comum, simples, contínuo e eterno de lhes doar o ser, por mais que a onticidade dos seres difira.

É uma visão intelectualmente interessante, mas apenas isso.

Casimiro Ceivães disse...

Questões demasiado elevadas para nós, como diria o Tomé Natanael...

É difícil que uma visão cristã do mundo se mantenha isso mesmo (ou seja, que não seja uma subversão mascarada de visão) se não distinguir a redenção de cada homem da redenção da Criação... mas, em ambas, o Mistério, que deve ser contemplado ou vivido, mas não esventrado, ainda que especulativamente...

PS. Será herança de judeus talmudistas? Já não somos capazes de discutir nem a linha do Tua sem entrar neste tema! Qual 'obsessão com a identidade nacional', qual carapuça... é muito mais grave :)