VII - WASHINGTON
George Washington (1732-1799) foi o primeiro Presidente dos Estados Unidos da América, figura de tal modo marcante que houve na altura quem inclusive quisesse proclamá-lo “rei”. Na sua Biografia, Agostinho da Silva salienta a indelével marca democrática que Washington gravou na génese do seu país: “Washington não crê nos regimes da força, nem mesmo em momentos tão graves como aqueles que o país atravessa; um grande povo que soube lutar para ser livre tem também dentro de si as energias suficientes para se organizar e viver; é preciso auxiliá-lo, ensinar-lhe o caminho, aconselhá-lo, mas não obrigá-lo, impor-lhe uma direcção, submetê-lo pela força das armas; que autoridade teria ele, de resto, para falar em ordem, em respeito pelo governo, se fosse o primeiro a revoltar-se e a trair? O amor da pátria impunha-lhe uma atitude de guia, não os impulsos do tirano; se aqueles que o incitavam a proclamar-se rei empregassem a sua inteligência e os meios de que dispunham a exercer uma influência enérgica junto dos políticos, obrigando-os a um trabalho consciente, os males cessariam depressa; insistissem todos junto do Congresso, como ele o fazia, pelas medidas necessárias e os deputados teriam que obedecer ao movimento de opinião; era esta a única atitude prática e digna.”.
Ainda segundo Agostinho da Silva, essa foi, de resto, a marca maior de toda a sua carreira: “a calma e a imparcialidade davam-lhe mais força do que aos restantes os ímpetos oratórios e as apaixonadas disputas; todos os grupos o respeitavam e o sabiam independente, guiado apenas pelo interesse comum e pelo desejo de que as colónias se desenvolvessem o mais possível; os problemas de fomento económico e de melhoria de vida social preocupavam-no mais do que as discussões de política teórica em que às vezes se embrenhavam os representantes de condados; prendiam-no as estradas a construir, os canais a rasgar, os trabalhos de hidráulica agrícola, as linhas de transporte mais rápido para as mercadorias dos quinteiros, a organização de portos; encontrava o país como encontrara a sua herdade ao regressar da guerra; e toda a questão para ele estava em que se tinha de pôr ordem no que todos achavam em confusão e dispor racionalmente e com garantia de rendimento os recursos de que dispunham; não desanimava perante qualquer oposição: tratava o adversário com a consideração com que trataria um amigo e mantinha-se persistente na sua ideia, incansável em defendê-la, pronto sempre a exprimi-la de novo com a mesma serenidade e a mesma teimosia; quando ganhava, não tomava ares de triunfador, mas, como um bom ferreiro, dispunha logo o material novo que se tratava de trabalhar; se perdia, voltava ao combate na primeira ocasião, convicto de que havia de vencer.”.
Sempre fiel a essa marca[1], eis, segundo Agostinho, o legado de Washington para toda a Humanidade.
[1] Daí ainda, a título de exemplo, estas suas palavras: “A calma de Washington não cedeu perante os ataques; a tristeza com que deixara Mount Vernon e passara por entre as aclamações acentuou-se, talvez, no amargo descair dos cantos da boca e na velada melancolia do olhar não deixava, porém, de lhes fazer frente, disposto a empregar todos os seus recursos de persuasão e de tenacidade: embora reconhecesse que para um governo é de primacial importância dispor de uma opinião pública favorável, sabia também que os êxitos definitivos são de quem sabe desprezar os triunfos momentâneos; não tinha da natureza humana uma visão pessimista; o fundo do homem é bom e exerce-se na linha de bondade, sempre que o coloquem em meio que o solicite para o que é digno e puro; as perturbações que traz consigo um conjunto fortuito de circunstâncias não o impedem de, passados anos, reconhecer que se enganou e pôr acima de tudo o adversário que lhe despertou a fúria; esperaria também, certo de que a hora da justiça havia de soar; o importante era que se soubesse sempre conservar um caminho de honestidade, de lealdade, de prudência e de modéstia; ante o assalto externo, a sua maior preocupação devia ser a de assegurar a imperturbabilidade da sua alma, de a manter tão serena como quando o apoiavam”.
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