Wanna be somebodies
We're dead, we know just who we are
We are the nobodies
Wanna be somebodies
We're dead, we know just who we are
Marilyn Manson
Parafraseando Álvaro Ribeiro, uma língua não é um corpo dotado de razão mas sim uma razão animada: não é essencialmente um instrumento, embora possa (como tudo) ser instrumental, e instrumentalizada. Não é meio de expressão de uma comunidade de falantes que a anteceda: ela constitui os falantes em comunidade, exprimindo-se neles permanentemente muito para além daquilo que neles a razão superficial quis dizer ou ouvir.
A língua portuguesa foi sempre absorvendo palavras de outras línguas: quem se lembra ainda de que "pitoresco" já foi puro italiano, "biltre" já foi puro francês e "gótico" (mesmo o da Batalha) foi tão inglês como "ok"?
Mas não é disso que se trata agora.
Vem aí, leio, o Leviathan das línguas, a comunicação refeita do mundo do pós-babel: empurrados pelos ventos imparáveis da globalização, que dentro em breve valerão 100% do PIB mundial, há que... oh, vou continuar em inglês que é muito mais fácil: you have to become a major player. 'Cause money, you know, it's the stuff of the world. And sure you don't want to be a looser. Wanna be somebody? I love U.
As línguas contagiam-se umas às outras, leio, e por isso temos que levar a nossa língua à "competição global". É? Talvez então nos dêem uma medalha pela patusquíssima palavra "patusco" (ainda não a identifiquei em mais língua nenhuma). E quando o globish rular, saberemos que deixámos no mundo a nossa imorredoira brand.
A língua é uma razão animada, não é um agregado de nomes (faz lembrar a Pátria). E por isso o valor da língua não se mede pelo PIB, não se mede pelo número de "falantes". Longa vida ao islandês, honra eterna à nação apache: o meu império faz-se em vós. E no meu canto celta haverá sempre lugar para as cinzas dos guerreiros tombados: porque na minha língua é simples dizer a honra, e é simples dizer a saudade.
O globish terá palavras cosmopolitas, leio, e poderemos colocar palavras próprias nessa língua comum. E sim, palavras colocadas darão imenso jeito quando todos comermos sushi com chili e todas as cidades se chamaram New Dubai: em memória da diversidade dos homens. O globish é talvez uma inevitabilidade, e talvez se baste com a palavra sexo, que afinal é deus e sobre isso tenho lido aqui coisas de admirar. Mas a razão que o anima já não é mais do que a razão predadora dos sistemas cegos, do que a voracidade universal em que o reino da quantidade se exprime.
No reino dos mortos, que é a antecipada pátria dos zombies, todos se entenderão porque nada haverá a dizer; mas a minha aliança é com todos os que se detenham no mistério no florescimento das coisas, no passo nocturno da elevação ao Ser. A minha viagem é a da permanência.
E por isso eu digo que "patusco" define bem isto tudo, e que aqui, neste blog, chegaram o lugar e o momento de saber o que queremos, para onde nos conduzem e para onde queremos voar.
PS. É urgente que o acordo ortográfico recupere, já, o ph de "pharmacia": o globish assim o exigirá. Quem sois vós para contrariar o PIB?
5 comentários:
Caro Casimiro
Como escrevi abaixo, e para que não restem dúvidas, o texto do Carlos Magno (conhecido jornalista da nossa praça) é apenas "o último texto" que nos chegou. Não "a última palavra" sobre o futuro da Lusofonia...
Não vincula a Direcção da Revista. Por vontade expressa desta, aliás, a NOVA ÁGUIA assume-se como um "órgão plural", onde há lugar para as mais diversas perspectivas. Foi assim no primeiro número, é assim neste, será assim nos próximos. OK?
Abraço MIL
O Amigo Casimiro quando quer adoçar adoça bem, mas quando pica também pica valente. ;P
(E não estaria a falar de culinária. E ter um braço direito e um esquerdo é que é o natural... isto é, ser ambivalente é existir.)
casimiro ceivães: um abraço. como sempre.
"We are the nobodies"
Abraço Casimiro.
Enviar um comentário