A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português". 
Sede Editorial: Zéfiro - Edições e Actividades Culturais, Apartado 21 (2711-953 Sintra). 
Sede Institucional: MIL - Movimento Internacional Lusófono, Palácio da Independência, Largo de São Domingos, nº 11 (1150-320 Lisboa). 
Contactos: novaaguia@gmail.com ; 967044286. 

Donde vimos, para onde vamos...

Donde vimos, para onde vamos...
Ângelo Alves, in "A Corrente Idealistico-gnóstica do pensamento português contemporâneo".

Manuel Ferreira Patrício, in "A Vida como Projecto. Na senda de Ortega e Gasset".

Onde temos ido: Mapiáguio (locais de lançamentos da NOVA ÁGUIA)

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segunda-feira, 15 de setembro de 2008

Passar para onde?

Narciso

Dentro de mim me quis eu ver. Tremia,
Dobrado em dois sobre o meu próprio poço...
Ah, que terrível face e que arcabouço
Este meu corpo lânguido escondia!

Ó boca tumular, cerrada e fria,
Cujo silêncio esfíngico bem ouço!
Ó lindos olhos sôfregos, de moço,
Numa fronte a suar melancolia!

Assim me desejei nestas imagens.
Meus poemas requintados e selvagens,
O meu Desejo os sulca de vermelho:

Que eu vivo à espera dessa noite estranha,
Noite de amor em que me goze e tenha,
...Lá no fundo do poço em que me espelho!

Sabedoria

Desde que tudo me cansa,
Comecei eu a viver.
Comecei a viver sem esperança...
E venha a morte quando
Deus quiser.

Dantes, ou muito ou pouco,
Sempre esperara:
Às vezes, tanto, que o meu sonho louco
Voava das estrelas à mais rara;
Outras, tão pouco,
Que ninguém mais com tal se conformara.

Hoje, é que nada espero.
Para quê, esperar?
Sei que já nada é meu senão se o não tiver;
Se quero, é só enquanto apenas quero;
Só de longe, e secreto, é que inda posso amar. . .
E venha a morte quando Deus quiser.

Mas, com isto, que têm as estrelas?
Continuam brilhando, altas e belas.

José Régio
_____________

Seria bom que a vida trouxesse um roteiro. Até se poderia imaginar um dispositivo a implantar na caixa craniana de cada recém-nascido, com um GPS e uns mapas de laurear. Acho que a coisa poderia resultar.
Depois era só viver que a vida seria conduzida, bem conduzida, para um qualquer lugar de eleição.
Assim, também, com a Ilha dos Amores.
Ia-se por ali, depois por acolá. Chegando lá, onde alguns eleitos sabem onde fica o portal de entrada, entrar-se-ia lá dentro. E pronto.
O problema é que há distâncias que não são percorríveis porque o que elas medeiam não é distante.
A Índia dos navegantes estava dentro deles. Iam à procura do que a sua imaginação e o seu desejo lhes apresentava como o desejável. A Ilha dos Amores só se lhes franqueia quando eles se libertam dessa Índia que eles viam como distante e com olhos de procurar o distante, mas incapazes de ver com distanciamento.
Não tem que haver um antes e um depois.
E a vida não é uma feira da ladra onde os egos vendem as suas tralhas.
Primeiro temos que nos resolver, depois aparecem as soluções.
E isso só pode acontecer se tivermos em mente que só chegamos ao mais alto não rebaixando ninguém, dentro ou fora de nós. Nem desligando-nos da concretude. Porque é nessa radicação que nos encontramos e recriamos os espaços dos encontros decisivos. E não resisto a continuar o meu diálogo com o Aprendiz Agostinho:

«Amor à vida no tempo
corra bem ou corra mal
dá a força de voar
ao que seja intemporal.
»

E sem esquecer a lição de Padre António Vieira quando se dirige aos peixer voadores:


“Dizei-me, voadores, não vos fez Deus para peixes? Pois porque vos meteis a ser aves? O mar fê-lo Deus para vós, e o ar para elas. Contentai-vos com o mar e com nadar, e não queirais voar, pois sois peixes. Se acaso vos não conheceis, olhai para as vossas espinhas e para as vossas escamas, e conhecereis que não sois aves, senão peixes, e ainda entre os peixes não dos melhores. Dir-me-eis, voador, que vos deu Deus maiores barbatanas que aos outros de vosso tamanho. Pois que tivestes maiores barbatanas, por isso haveis de fazer das barbatanas asas? Mas ainda mal, porque tantas vezes vos desengana o vosso castigo. Quisestes ser melhor que os outros peixes, por isso sois mais mofino que todos. Aos outros peixes do alto mata-os o anzol ou a fisga, a vós sem fisga nem anzol, mata-vos a vossa presunção e o vosso capricho. Vai o navio navegando e o marinheiro dormindo, e o voador toca na vela ou na corda, e cai palpitando. Aos outros peixes mata-os a fome e engana-os a isca; ao voador mata-o a vaidade de voar, e a sua isca é o vento. Quanto melhor lhe fora mergulhar por baixo da quilha e viver, que voar por cima das antenas e cair morto.”
Padre António Vieira, Sermão de Santo António aos Peixes.


Não podemos esquecer-nos do nosso elemento. Porque a elevação consegue-se assumindo a fundura. E não esquecendo que a cada homem é dado o que lhe é necessário para fazer um caminho, para se transformar, para se transportar para dimensões cada vez mais subtis e plenas. Mas sem deixar o seu elemento, sem se deixar dirigir por acenos extrínsecos. E sem recusar a autêntica concórdia que só pode ocorrer entre espíritos insumissos, avessos ao servilismo, e amantes da liberdade.
Errar faz parte da errância, mas esta não comporta erro:


«Como é que será entrar
no céu em dia que espero
sem que deixe de pecar
na terra a que tanto quero.
»


“Pecar na terra”, não significará, nestas palavras de Agostinho da Silva, um desbragamento ou uma vida alheia à ética. É claro que há aí uma recusa do moralismo, da tacanhez de quem se julga sem mácula, mas também há um assumir da imperfeição como o horizonte onde se joga o jogo da excelência. Digo “jogo”, sem qualquer sombra de puerilidade ou de infantilismo de querer ser condutor dos outros ou mestre da razão alheia. “Jogo” no sentido da recusa dum “jugo”, no sentido, enfim, do compromisso com a vida, antes de mais. Pois só bem vivos entramos no céu. E não falo aqui do céu da boca.
Daí não devermos esquecer que o Amor conduz-se, conduz-nos, à Sabedoria:


«É ciência subir os Himalaias
e criar matemática sem fim
mas é cultura vê-la poesia
e ter os Himalaias dentro em mim.
»



Aí, sim, a verdadeira elevação. O mundo não precisa de profetas que se esganiçam a apontar defeitos nos outros, a propagandear a sua razão e o seu mérito. Nós não precisamos de meninos a fazer de conta. Precisamos de nos ver bem lá no fundo, bem lá dentro de nós, onde precisamos de moldar um rosto conversável e nutrir uma alma que seja capaz de se elevar, sem confundir as barbatanas com asas, ou as asas com barbatanas, porque também há este erro, talvez pior que o outro.
E há sempre um poder maior. Chamemos-lhe Destino, Acaso, o que for. Algo joga connosco quando não nos jogamos fora. Algo que não devemos subestimar nem devemos usar como razão para nos sobre-estimarmos. Algo que torna a nossa realidade transcendente. Ascendente, sem alijar o peso dos apelos da fundura. E sem nos insularmos na nossa trama egótica:


«Não verás em mapa algum
rumo das ilhas de amor
aguarda que a deusa queira
te mostrar o seu favor
»



E que Deusa? Cada um terá a Sua. E se A merecer e quando A merecer. Não antes. E não vale a pena forçar, é algo que se conquista sem esforço, o favor da Deusa. Mesmo que pareça um desfavor, posto que nada tem que ser, se falarmos da nossa mais abrupta e mais rasgada realidade.

«Naquela Ilha dos Amores
que sonhou Camões outrora
só entra e fica liberto
quem lá viva desde agora
»

6 comentários:

Paulo Borges disse...

Excelente texto, como habitualmente. Realço o "desde agora". A verdadeira mediação é o i-mediato re-conhecimento de que já e desde sempre se é isso mesmo que se busca! A verdadeira mediação cumpre-se na sua instantânea anulação. Mas aqui estamos a falar da experiência espiritual individual, em que a libertação é subitamente possível. A questão é conciliar isso com o tempo - e o atraso - das mediações históricas e colectivas, onde tudo é mais lento e susceptível de se enquistar no círculo vicioso da mera luta pela sobrevivência e pela auto-afirmação: povos, sociedades, nações, estados, etc. Quem for realmente livre tem o dever ético e a tarefa pedagógica de se consagrar a promover a libertação nesses domínios ingratos, preparando-se para a incompreensão, a calúnia, a violência. Mas, quem o não for, será sempre um cego a conduzir outros cegos para o abismo da própria cegueira. E ser realmente livre é difícil...

Unknown disse...

Amigo,

deixei de ver o que te apontar... :P mas continuo a ler-te com os olhos da minha alma, tanto quanto eles podem alcançar-te.

Um beijo.

Paulo Feitais disse...

Anita, se tiveres calma e esperares que eu chegue aí perto, poderás ver-me melhor. Mas tem paciência, está?
:)

Paulo Feitais disse...

Paulo,
o "desde agora" é mesmo o "ponto" da questão. No fundo, não há seres para serem libertos, não o que seja a libertação, só assim, paradoxalmente, poderemos encontrar, na libertação, uma via, de libertação...;)
Foliemos, pois, com e sem folguedo.
:)

Unknown disse...

:) É... este meu cavalo parece sempre que anda a correr para apanhar um comboio que não existe. Já lhe disseram que o comboio é ele mas do que ele gosta é de galopar sem parar. Até quando... não sei, nem o procuro saber, de que vale? Ele não pára por eu o saber. Sigamo-lo-nos.

Abraço.

SAM disse...

Um brilhante texto, sem dúvida. E por todas as citações inseridas. As obras de Vieira sempre foram em socorro da liberdade de emoções e tolerância racial. O Sermão de Santo Antônio ou dos Peixes veio em amparo a escravização dos índios, onde disserta sobre os vícios e as vaidades do homem.


" A primeira coisa que me desedifica de vós - peixes - é que vós comeis uns aos outros. Não só vós comeis uns aos outros, senão que os grandes comem os pequenos. Se fora pelo contrário, era menos mal. Se os pequenos comessesm os grandes, bastaria um grande para muitos pequenos; mas como os grandes comem os pequenos, não bastam cem pequenos, nem mil, para um só grande e para que vejais como estes comidos na terra são os pequenos, e pelos mesmos modos, que vós vos comeis no mar..."