Não há cão nem gato daquela geração (e junto-lhe ‘a seguinte e meia’) que não conheça o slogan irreverente, desafiador: esta frase e a cara do Cohn-Bendit são os primeiros ‘flashs’ quando Maio de 68 vem à lembrança.
Nunca me interroguei sobre a sua origem, quando apareceu pela primeira vez, em que cabecinha inspirada ela ‘brilhou’ pela primeira vez. Onde, sabemo-lo: ‘aquela’ Paris, que suspeito ser tão cadáver como a Lisboa do quartel do Carmo o é. Em suma: interiorizei-a como uma das tais ‘tiradas’ anónimas que, depois, ficam no património colectivo, uns segundos extra quando se a vê inesperadamente, um sorriso em cima da amargura de, de repente, sentirmo-nos envelhecidos. Lembrança de ventos e brisas, de tanta coisa que faleceu ou foi internada, e ficou este friozinho filho-da-puta de, baixando os olhos, murmurarmos ‘estamos velhos’ e seguirmos em frente, padronizados como códigos de barras com prazo de validade.
Folheio a “le magazine littéraire” de Fevereiro de 2007 e na crónica de Enrique Vila-Matas, “Une âme belle”, fico atónito com a revelação, a ‘denúncia’ do autor (no caso autora) da célebre frase-ícone: Margarite Duras. Juro que não o sabia e estou mesmo convencido que ninguém o sabia. Diz o Enrique, logo a abrir:
“Margarite Duras est l’auteur (à ce jour, anonyme) de l’un dês plus célèbres grafittis de Mai 68: «Soyez réalistes, demandez l’impossible» C’est l’Argentin Raul Escari qui le révèle dans son livre autobiographique ‘Dos relatos porteños’ (...)” (2006, de Ed. Mansalva, Buenos Aires; o link e este acrescento são meus)
Depois desfia uma série de coisas ‘giras’ - crónica é crónica e há que esgalhá-las - mete Roland Barthes ao barulho e deixa mais uma 'pérola': uma confidência acerca do seu (Barthes) hiper-famoso “Fragmentos do discurso amoroso”, e de como as palavras se trocam, nascem, realizam-se:
“(…) L’écriture de son autobiographie (refere-se ao Escari) est direct, proche du ‘degré zéro’ , presque documentaire. Il veut que que tout soit pris au pied de la lettre. Et c’est ainsi que nous le prenons, ‘littéralement’, quand il raconte, par exemple, que Barthes lui avait dit au Flore qu’il était allé, une foi, consulter Lacan pour lui raconter son ‘amour fou’ pour un garçon et que Lacan, aprés l’avoir écouté un bon moment sans dire un mot, s’était contenté de lui dire à la fin: «Laissez tomber ce garçon». Lacan n’avait rien ajouté. «C’est étrange que des mots aussi banals, aussi plats, aient pu avoir sur moi un tel effet, immédiat, radical. J’ai mis un terme à la relation et je me suis consacré au séminaire ‘Le Discours amoureux'» avait conclu Barthes.”
…mas a surpresa-surpresa foi aquele primeiro parágrafo: quase quarenta anos depois o segredo que não o era é revelado - e não o era pois ninguém se preocupava com quem fora o pintor do famoso grafiti: quem foi o primeiro a exigir o impossível. Duras, agora já sabemos. De Daniel é conhecido pois Bruxelas é uma aldeia grande; falta saber do polícia da foto, embora esteja com ideia de, há coisa duns poucos anitos atrás, houve qualquer zum-zum sobre ele numa reportagem de imprensa, naquelas comemorativas dos xis anos da data tal.
Nunca me interroguei sobre a sua origem, quando apareceu pela primeira vez, em que cabecinha inspirada ela ‘brilhou’ pela primeira vez. Onde, sabemo-lo: ‘aquela’ Paris, que suspeito ser tão cadáver como a Lisboa do quartel do Carmo o é. Em suma: interiorizei-a como uma das tais ‘tiradas’ anónimas que, depois, ficam no património colectivo, uns segundos extra quando se a vê inesperadamente, um sorriso em cima da amargura de, de repente, sentirmo-nos envelhecidos. Lembrança de ventos e brisas, de tanta coisa que faleceu ou foi internada, e ficou este friozinho filho-da-puta de, baixando os olhos, murmurarmos ‘estamos velhos’ e seguirmos em frente, padronizados como códigos de barras com prazo de validade.
Folheio a “le magazine littéraire” de Fevereiro de 2007 e na crónica de Enrique Vila-Matas, “Une âme belle”, fico atónito com a revelação, a ‘denúncia’ do autor (no caso autora) da célebre frase-ícone: Margarite Duras. Juro que não o sabia e estou mesmo convencido que ninguém o sabia. Diz o Enrique, logo a abrir:
“Margarite Duras est l’auteur (à ce jour, anonyme) de l’un dês plus célèbres grafittis de Mai 68: «Soyez réalistes, demandez l’impossible» C’est l’Argentin Raul Escari qui le révèle dans son livre autobiographique ‘Dos relatos porteños’ (...)” (2006, de Ed. Mansalva, Buenos Aires; o link e este acrescento são meus)
Depois desfia uma série de coisas ‘giras’ - crónica é crónica e há que esgalhá-las - mete Roland Barthes ao barulho e deixa mais uma 'pérola': uma confidência acerca do seu (Barthes) hiper-famoso “Fragmentos do discurso amoroso”, e de como as palavras se trocam, nascem, realizam-se:
“(…) L’écriture de son autobiographie (refere-se ao Escari) est direct, proche du ‘degré zéro’ , presque documentaire. Il veut que que tout soit pris au pied de la lettre. Et c’est ainsi que nous le prenons, ‘littéralement’, quand il raconte, par exemple, que Barthes lui avait dit au Flore qu’il était allé, une foi, consulter Lacan pour lui raconter son ‘amour fou’ pour un garçon et que Lacan, aprés l’avoir écouté un bon moment sans dire un mot, s’était contenté de lui dire à la fin: «Laissez tomber ce garçon». Lacan n’avait rien ajouté. «C’est étrange que des mots aussi banals, aussi plats, aient pu avoir sur moi un tel effet, immédiat, radical. J’ai mis un terme à la relation et je me suis consacré au séminaire ‘Le Discours amoureux'» avait conclu Barthes.”
…mas a surpresa-surpresa foi aquele primeiro parágrafo: quase quarenta anos depois o segredo que não o era é revelado - e não o era pois ninguém se preocupava com quem fora o pintor do famoso grafiti: quem foi o primeiro a exigir o impossível. Duras, agora já sabemos. De Daniel é conhecido pois Bruxelas é uma aldeia grande; falta saber do polícia da foto, embora esteja com ideia de, há coisa duns poucos anitos atrás, houve qualquer zum-zum sobre ele numa reportagem de imprensa, naquelas comemorativas dos xis anos da data tal.
Restam-me ainda alguns mistérios, fora aqueles em que nunca os pensei como se o fossem. Tal como ser realista e exigir senão o impossível, afinal trautear "a vidinha" aos acordes de quando houve outra. A exemplo: folhear esta revista por razões de hoje, mas com teia no francês aprendido, primeiro, na "Salut les copains", depois na "Afrique-Asie". Como vêm há uma ligação: o discurso amoroso, esse pessoalíssimo mistério pelo longe, língua e cuspo de escrita em vidro, às vezes fosco, às vezes realista e exigindo o impossível.
(a famosa foto de "Daniel Cohn-Bendit enquanto jovem" estava aqui.)
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