É.
É tempo de regressar ao meu lugar natural.
Aqui.
Mas quero começar por confessar uma coisa que não me envergonha: sabem porque é que nunca conheci pessoalmente Agostinho da Silva? Por vergonha. Há uns 24 anos atrás, mais pico, menos pico (atenção que não estou a falar em "bico", as minhas "mordeduras" são dadas pessoalmente e olhos nos olhos, de forma fraterna e leal), fui convidado para ir à casa do nosso Mestre comum, por várias vezes. Mas tive vergonha de não me saber comportar perante um gigante. É que o nosso passado, antes de se passar, deixa marcas. E alguns de nós demoram muito a libertar-se disso.
Saibam, também, que sei onde ponho, fraternalmente, as minhas carapuças e quem as enfia. Cuidado que o meu ar palhaçante não esconde ingenuidade infantil. Não respondo a provocações, nem a calúnias. Não ando às costas de cadáveres, mas de gigantes e sei-me anão. Mas vejo longe.
Despeço-me definitivamente dos meus irmãos da serpente. A partir de hoje será aqui o meu lugar.
Eu tenho uma agenda, eu não confio isso a ninguém. É a minha agenda e ninguém tem nada com isso. Mas é aqui, neste projecto, que está o santo dos santos do meu coração (que tem muitos locais de veneração).
Vou postar diariamente.
Por vezes serei violento, mas leal, na apresentação das ideais. Cuidado quem gosta de enfiar carapuças, terá por aqui muito fogo com que se queimar. Eu tenho o dom da escrita (é só uma pequena provocação, um pequeno mostrar de garras, fraternas).
E sou filho do vento. Levei muita porrada na escola por me considerarem cigano por viver num bairro social de Lisboa. Não ironizem com isso.
É aqui que estão os sonhos mais puros da nossa casa comum, a que chamamos Lusofonia. É uma casa que ainda não está construída. O voo das aves mais puras indica um caminho a seguir, mas uma Águia não é uma Serpente. Atentem nisso.
São sonhos que tornam a nossa história preciosa e sagrada. Fazem-nos ver longe. E também nos fazem ver que, no horizonte deste projecto, lá bem longe e bem elevado , brilha o alvor da Frátria. Na Frátria ninguém tem vergonha de se sentar ao pé de ninguém, e todo o Irmão é Supremo, logo não deve ser atacado, denegrido ou vilipendiado. Por pior que nos pareça o seu comportamento. Sabe-se lá que marcas é que trará do seu passado que não se passou.
A Frátria é um celeiro, ainda só sonho e bruma, onde se guardam as sementes do futuro.
E não me venham aqui passar a mão no lombo. Não gosto disso.
Tenho nojo disso.
E, para começar, depois da comemoração das medalhas olímpicas, publico aqui o texto que submeti à consideração dos responsáveis pelo projecto para publicação na Revista. Está ao seu critério publicá-lo, uma vez que ele vai ser publicado num local digníssimo: aqui.
E já agora, o meu nome verdadeiro é Paulo Feitais, mas o meu nome de baptismo é Paulo Gomes. Feitais é o nome pelo qual a minha família é conhecida numa pequena aldeia da Beira Alta, portanto uso-o com propriedade e com muito orgulho. E podem crer que daqui não saio. E aqueles que me conhecem sabem que vem de longa data a minha ligação à Filosofia em Portugal. E sei quem, lá atrás, nos meus tempos de faculdade, denegria os sonhos que aqui defendemos. Conheço-os pelo nome, mas sei que, por vezes, o tempo e a vida amadurecem os homens e redimem a sua incapacidade de escutarem o seu coração, por haverem julgado que não tinham um. Mas todos os seres humanos têm coração, mesmo os que são lavrados por uma desmesurada sede de protagonismo, que se nota à distância e, por vezes, inquina o ar dos espaços mais puros. Saibam esses que há lugar para todos os que laboram com o coração puro, porque a posteridade verdadeira e a verdadeira "fama" nasce do coração, dos destinadores e dos destinatários das acções e das obras.
Das flores aos frutos: o futuro do mundo lusófono.
Paulo Feitais
"Será bem que o mundo morra à fome?
Será bem que os últimos dias se passem em flores?
Não será bem, nem Deus quer que seja, nem há-de ser."
Padre António Vieira, Sermão da Sexagésima
Olhando ao estado deste nosso mundo globalizado, cumpre começar por defender que esta tão afamada globalização que tem, por certo, o mérito de trazer vias de aproximação e de disseminação daquilo que as culturas, fecundamente diversas, têm de seminal, deve ser ultrapassada pela via genesíaca duma autêntica Englobação.
Não já as garras dos fazedores do império da vergonha, como lhe chama Jean Ziegler, não já as urdiduras dos semeadores de destruição, mas o amplexo, necessário e indestrutível, mesmo que agora ainda seja um aceno de aproximação, da Fraternidade lusa, lúcida, transmutadora e libertadora.
Os povos restituídos ao seu campo de manifestação primordial, o mundo inteiro, constantemente recriado pelas investidas culturais vindas do mais fundo de cada homem, sem que os territórios por onde se espraia a humanidade possam ser vistos como reservas de matéria-prima e de mão-de-obra barata, quando não escrava, à disposição da rapacidade do capitalismo selvagem e desumano que hoje grassa pelo mundo.
Custa afirmá-lo, porque só o começar a tirar consequências desta premissa gela qualquer possibilidade de nos considerarmos eticamente justificáveis enquanto membros desta estrutura planetária de subjugação, mas o mundo hoje designado como "globalizado", está estruturado como um gigantesco campo de concentração, onde um genocídio sem precedentes, pelo menos se olharmos ao número anual de vítimas, está a ser implementado à escala planetária.
As mega-organizações empresariais chegaram hoje ao extremo de já não conseguirem rentabilizar as suas mais-valias, uma vez que o seu gigantismo impede que elas possam ser investidas. O capital, hoje, já não é só trabalho e sofrimento acumulados, é desolação, morte, destituição ontológica de milhões de seres humanos e o resultado, e a possibilidade reiterada, da destruição da estrutura política de dezenas de estados, impedindo que a educação, a saúde, a justiça, a segurança e a estabilidade, social, ecnonómica e cultural, possam ser vividas, com normalidade e sustentabilidade, por um número cada vez maior de seres humanos que se vêem, assim, espoliados dos mais básicos dos direitos humanos.
Hoje o dinheiro tem uma autonomia onto-teleológica que não tinha no século XIX: o dinheiro é um simulacro do espírito, insubstante, inapropriável enquanto essência, impossuível, e incontrolável, enquanto elemento estruturante da humanidade do homem submetido aos dispositivos de produção e de consumo que, e sigo aqui Giorggio Agamben, estão na base da constituição das possibilidades ontológicas de apropriação onto-gnoseológica do mundo, estruturantes das diversas formas de vivência da subjectividade por parte dos homens que hoje vivem neste planeta sequestrado.
Podemos considerar, em concordância com Jean Ziegler, que estes dispositivos que sustentam o presídio planetário têm um denominador comum: a escassez organizada. Hoje morre-se de fome em consequência de estratégias resultantes do belicismo económico que impera no mundo das grandes corporações trans e multinacionais. Esse estado de constante competição, sem olhar às consequências, sejam elas de carácter económico ou impliquem a morte à fome de crianças aos milhares, desce em cascata até ao âmago do viver humano em sociedade: a competição está radicada em todas as organizações sociais e, muito especialmente, na escola, com consequências trágicas.
Cabe lembrar aqui um aforismo do mestre Agostinho da Silva: "É melhor aprender latim ou melhor aprender matemática? É melhor não ser estúpido." Ora, hoje ensina-se, educa-se, em nome da estupidez. O que interessa é formatar as mentes de seres humanos produtores-consumidores, destinados a viverem a planura duma vida concentrada, ora na gaiola dourada das aves fúteis, ora na capoeira das aves de abate. E a fronteira entre estes dois mundos interdependentes é defendida de forma brutal contra a tentativa, levada a cabo por milhares de homens, mulheres e crianças, nascidos no lado deserdado do mundo, de a atravessar com vista à obtenção dos meios de subsistência, e dos bens sociais, que deveriam estar acessíveis a todos os homens, sem excepção. A este propósito a fortaleza da vergonha chamada Europa é um tristíssimo exemplo.
E escrevo estas linhas na proximidade cronológica da passagem da chama olímpica pela cidade de Lhassa, hoje a cidade mais lusófona do mundo.
É que a lusofonia é um imperativo ético dos povos banhados pela Graça desta língua que os urdiu. E a ética é, como é bom ver, o oposto da estupidez.
E o mundo espera a luz libertadora. E nós, convocados pelo Império da entrega à plena fruição do que somos e podemos vir a ser, não podemos viver calados, ou obscurecidos.
É difícil, na verdade, ver saídas desta malha constringente que até nos agarra por dentro, nos desejos, nas frustrações, com que nos encontramos a viver esta vida de seres humanos em sociedade.
Mas o acto de sair começa a desenhar-se antes de franqueada a "saída" que, na maior parte dos casos, é só um buraco. Há muitos exemplos de aprisionados que, mesmo havendo abertura, não deram por ela e se mantiveram cativos, posto que essa condição depende em maior medida de constrangimentos internos do que externos.
Não resisto, contudo, a deixar aqui uma sugestão: temos que deixar de dar crédito a governantes estúpidos, a políticos estúpidos, a estúpidos, sejam eles o que forem. Não que tenhamos que abdicar da compaixão, mas, por compaixão, temos que não ligar ao que leva a que homens e mulheres que poderiam ser pessoas capazes de se verem ao espelho, se assumam como cabides, ou dispositivos de sustentação, da estupidez.
Isto porque contra a estupidez não se luta, porque ela nunca vem a campo aberto com armas de Verdade, luta-se pela ética, pela sabedoria, afirmativamente, não alimentando o inimigo com a nossa negatividade que, como é natural , resultará sempre da negação de algo de bom, senão mesmo de excelente, em nós.
A indiferença é o chuveiro que pode, aos nossos olhos, lavar as almas que, alegremente, se entregam à chafurdice.
E como exerceremos essa indiferença? Governando-nos! E aqui estou, mais uma vez, a namorar as palavras sábias do mestre Agostinho. Fazendo nós como deve ser as coisas que estão ao nosso alcance, não precisamos dos gestores da insuficiência.
Irmãos que vivam verdadeiramente como irmãos não precisam de tribunais de família na sua vida.
E, então, dirijamos a nossa atenção para as palavras iluminadas de Padre António Vieira, que parecem antecipar uma das mais belas passagens de Hegel: não podemos manter-nos na estação das flores, a flor consuma-se no fruto, temos, pois, que frutificar, individual e colectivamente. Por isso temos que saber que aquilo que há e aquilo que somos não são para se manter. Temos que ultrapassar o que somos e o que há. Talvez convenha acrescentar: temos que deixar que aquilo que não somos e que não há nos ultrapasse e se consuma.
O que não há e o que não somos não têm que ser possíveis se antevistos à luz do que há e do que somos.
O que virá convoca-nos para a acção e para o despojamento. Mas não tem dispositivos que o pré-instale na estrutura ontológica predominante. É verdade que temos que suportar a patência do presente, mas para estarmos prontos a despir-nos de insuficiências e de crenças constringentes. Tal como a nossa querida Lhassa, hoje a cidade mais lusófona entre todas, nos chama do futuro, desde tempos imemoriais, posto que no futuro não há cárceres, nem subjugação, também este nosso querido mundo lusófono que a estupidez nunca conseguirá ver, é uma soltura a germinar, nas terras natais e nas diásporas, em que os nossos queridos irmãos se encontram neste presente de aço onde, a manterem-se as coisas, é impossível acordarmos humanos e investidos da nossa dignidade de filhos do futuro.
Quando os homens morrerem porque sim; quando da boca das crianças nunca se ouvir a palavra "pão"; quando todos possam ser o que forem, quando ninguém se sentir estrangeiro, ou migrante, mas viajante e descobridor, a nossa querida Lhassa estará esquecida, porque no mundo lusófono nenhuma cidade terá que ser a mais importante, porque em todas elas cada homem estará em casa, se precisar dum lar.
PEÇO FRATERNALMENTE À ADMINISTRAÇÃO QUE NÃO APAGUE COMENTÁRIOS AOS MEUS POSTS. FICARIA OFENDIDO COM ISSO.
5 comentários:
Caríssimo Paulo
Antes de mais, sê bem-vindo. Nunca percebi porque deixaste de aparecer por cá (também não tens de explicar porquê), mas as portas sempre estiveram, estão e estarão abertas para ti...
O teu texto será publicado na Revista (bem como algumas fotos tuas), mas nada tenho contra o facto de o republicares aqui. Pelo contrário: cada vez mais, o critério será valorizar o que se (e quem) publica no blogue...
Quanto aos comentários, só apagamos os ofensivos...
Abraço MIL
Afinal por detrás do poeta Feitais está o Paulo Gomes: boa nova!
Conhecemo-nos perfeitamente (não te assustes com o machado), e um dia destes te digo quem sou, melhor, mostro, antes de um estreito...
abraço!
P. S. Inverti-te o tamanho das letras nisto; o início é uma nota, e depois vem o de maior substância...
A Direcção encarregou-me da tarefa de arrumar isto; no fundo, o meu machado é um aparelho de apurada tecnologia, lâmina, mas também vassoura e pluma... (mas não faço apaganços, só alarde) ;)
P. P. S. Caso fiques curioso em excesso, o Renato tem a minha permissão para te dizer quem sou - mas guarda segredo, mesmo de quem é nosso amigo... isto já não é o que era e está cheio de perdigotos, mas o que mais me preocupa são aquelas aves sem nome, a chamada antítese da avestruz: com o corpo disforme escondido debaixo do chão e somente a cabecinha esperta de fora...
... Saber quem és, e saber-te aqui, foi a melhor coisa neste Agosto da silly season - ser um embuçado, um figaldo vampiro, e ainda um outro, é um deserto em três estações e uma solidão maior que a do Frei Agostinho da Cruz; mas congratulo-me com parco prémio: o de saber que a cada um cabe a tarefa que é sua, e eu sempre fui a cobra solitária de serviço, de língua trífida bem afiada... ;)
bem, face ao alarido à porta e cá dentro, e sem perceber patavina do que se passa e quem chegou, acho de bom-tom juntar parabéns pois festa é festa e nos últimos dias não ficava de boca aberta se visse textos ou outra merda qulquer assinados "Bórgia" et al
dizem as velhas que as dores de parto são sempre assim mas, cá pra mim, se o são, então enquanto dura junto-me é à festa - sempre me enfrasco e a coisa, seja ela qual for, amaina por anestesia.
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já agora uma coisinha antes de ir abrir uma bejeca e ver se ainda pesco uma chamussa: bonita escrita (o primeiro post, para a 2ª parte é preciso jantar primeiro) embora me tenham dado uma coceira danada as promessas explícitas e implícitas de dedo fino no gatilho e o smell de "new boy in town e agora é que isto entra nos eixos, senão pum-pum"
eu, era ainda puto, certa vez deu-me para ferrar uma paulada num pato do tamanho dum ganso, na ideia de depois metê-lo na panela. a verdade é que o gajo era um pato e não uma águia e por isso não voava para longe, mas verdade verdadinha é que tive de lhe torcer os gasganetes para o depenar, e levei boa dose de bicadelas.
com a alegoria quero dizer que dado que agora me sinto(imos) mirado e remirado, quiçá com o rabo chumbado em escrita fina se me descuido ainda não percebi em quê - não vem deste post e tua/sua re-entrada, isto já dura e dura e dura... - , que há patos do caraças, alguns bicam que nem gansos.
provavelmente estou aqui armado ao pingarelho e tudo vai "correr bem". mas caroços na garganta é que não.
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