A falta de consenso em relação ao Acordo Ortográfico tem a ver, por parte de muitos portugueses, sobretudo com a ideia, várias vezes repetida, de que esse acordo vem abrasileirar a ortografia usada em Portugal, o que representaria uma perda de identidade nacional. O que está aqui em questão é a relação entre Portugal e o Brasil e o conflito existente, mas muitas vezes subterrâneo, entre as duas normas oficias da língua lusa: o português europeu e o português brasileiro. É preciso que fique claro que este Acordo Ortográfico tem a ver com a história da ortografia da língua portuguesa no século XX – cujo processo foi sempre no sentido da simplificação e da unificação ortográfica entre Portugal e o Brasil – uma questão que é independente, do ponto de vista do processo das transformações ortográficas, da existência das duas normas oficiais, que apresentam diferenças aos níveis fonológico, morfológico, sintáctico e lexical. A ortografia não deveria fazer parte dessas diferenças.
O primeiro passo dado no sentido da simplificação foi dado por Portugal com a Reforma de 1911, em que se eliminou grande parte das grafias justificadas etimologicamente, como "hypothálamo", "occasião", "assumpção", "attender", etc. Note-se que o Brasil só adoptou essa ortografia simplificada, após vários esforços de unificação, em 1931, através de um acordo bilateral, tendo utilizado até então a antiga ortografia plenamente etimológica, ou seja, a mais conservadora. Contudo, durante os anos 30, vicissitudes políticas no Brasil deram origem, nesse país, a alterações no sentido de um regresso à ortografia etimológica. Em 1943, é redigida uma nova Convenção bilateral no sentido da simplificação e unificação, ficando bem claro que as consoantes mudas não se escrevem. Essa Convenção (que se aproxima muito do Acordo de 1990, agora em vias de implementação) diz, no ponto 16, que "não se escrevem as consoantes que se não proferem", (dando como exemplos, entre outros, "diretor" e "ótimo") e permite inclusivamente ortografias duplas para determinados vocábulos, como "secção"/"seção" ou "tacto"/"tato", de acordo com a pronúncia. Se esta Convenção foi redigida em conjunto por Portugal e Brasil, por que motivo os portugueses continuam a escrever "director" com "c" e "óptimo" com "p"? Porque em 1945 foi redigido um novo Acordo, ligeiramente menos simplificador do que a Convenção de 1943 (tendo sido reinseridas algumas consoantes mudas) aprovado em Portugal mas não ratificado no Brasil, onde continuou a vigorar a grafia decidida pelos dois países em 1943; foi nesse momento que a ortografia usada em Portugal passou a ter um aspecto mais conservador do que a ortografia usada no Brasil, invertendo-se a tendência que até então se tinha verificado. Em 1971 e 1973 ambos os países voltaram a fazer esforços para unificar a grafia do português, tendo sido adoptadas alterações nos dois lados do Atlântico. Em 1975 a Academia das Ciências de Lisboa e a Academia Brasileira de Letras elaboraram um novo projecto de unificação que não foi, contudo, aprovado oficialmente. Em 1985 o então presidente do Brasil, José Sarney, promoveu um encontro dos sete países de língua oficial portuguesa, onde foi apresentado o Memorando Sobre o Acordo Ortográfico. Em 1990 as duas academias elaboraram a base do «Acordo Ortográfico da Língua Portuguesa», que deveria ter entrado em vigor em 1994. Em 2004 foi aprovado o Protocolo Modificativo, que permite que o Acordo vigore com a ratificação de apenas três países da CPLP, o que foi feito pelo Brasil, Cabo-Verde e S.Tomé e Príncipe, razão pela qual o Acordo já está, tecnicamente, em vigor.
Tendo em conta o que acabou de ser dito, fica patente que:
- a questão da ortografia é independente do facto de existirem duas normas oficiais da língua lusa: as diferenças entre o português europeu e o português brasileiro dizem respeito à fonologia, morfologia, sintaxe e léxico, e não deveriam ser estendidas à ortografia;
- até 1911 a ortografia era comum nos dois países, tendo sido Portugal a dar início ao processo de simplificação, acompanhado pelo Brasil somente vinte anos mais tarde, o que contraria a ideia generalizada entre os portugueses de que essa simplificação está associada unicamente ao Brasil;
- sempre se trabalhou, desde 1911, pela reunificação ortográfica entre os dois países, tendo sido aprovada a abolição de todas as consoantes mudas por ambas as partes em 1943;
- as diferenças surgidas a partir de 1945 (reinserção de algumas consoantes mudas) devem-se ao facto de o Acordo desse ano não ter sido ratificado pelo Congresso Nacional do Brasil e não pelo facto de este país ter abolido as ditas consoantes "à revelia" de Portugal, como geralmente se pensa;
- do ponto de vista da história da evolução da ortografia do português, não há motivos para uma identificação exagerada entre a nação e o sistema ortográfico, nem para considerar o Acordo de 1990 como uma forma de abrasileirar o português europeu. A abolição das consoantes mudas, que tanto choca os portugueses, foi decidida pelos dois países em 1943, pelo que o Acordo de 1990 só vem reactualizar essa mesma convenção;
- a simplificação e unificação ortográfica, no ponto em que já se encontra, é um processo natural, inevitável e absolutamente irreversível.
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1 comentário:
Mais claro que isso, impossível.
Post simplesmente perfeito.
Nos agraciou com dados que por muitos são omitidos.
Parabéns e obrigado pelas informações.
[s]s
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