A Águia, órgão do Movimento da Renascença Portuguesa, foi uma das mais importantes revistas do início do século XX em Portugal. No século XXI, a Nova Águia, órgão do MIL: Movimento Internacional Lusófono, tem sido cada vez mais reconhecida como "a única revista portuguesa de qualidade que, sem se envergonhar nem pedir desculpa, continua a reflectir sobre o pensamento português".
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domingo, 18 de dezembro de 2011
JOSÉ MARINHO, ENTRE DRAMA E ENIGMA (excerto)
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Daí, em suma, a subtil, a abissal diferença entre Filosofia e Religião segundo José Marinho. Enquanto que “a religião tem como origem o que designamos por sentido do drama e a urgência de resolver esse drama” – só ela, aliás, “pode dar ao homem a solução imediata do drama” –, já a Filosofia, “dando solução ao enigma, não pode dar a solução do drama” – ela “não consola, nem redime” –, dado que “sabe que o drama é insolúvel como tal” , mais propriamente, dado que sabe que “o drama da criatura, enquanto tal, é solúvel apenas pela relação ao divino oculto e impassível” . Daí, cumulativamente, a subtil, a abissal diferença entre o “Deus religioso” e o “Deus metafísico”. Enquanto que o primeiro parece apenas existir em função do homem, da sua “salvação”, o mesmo não sucede com o segundo. Eis, pelo menos, a perspectiva de José Marinho. Daí o ter-nos dito que “o fim do Deus metafísico em relação ao homem não é salvá-lo, mas muito simplesmente pensar-se no homem” , daí o ter-nos denunciado “essa última ilusão religiosa da criação e da providência, tão importante para o religioso como perigosa para o metafísico” , daí ainda, enfim, estas suas palavras: “A verdade filosófica não é a de um Deus de que carece o homem, mas a presença no ser de um divino sentido que nos importa sumamente pensar.” ; “O ser não carece de redenção porque ele é propriamente redenção. Mas esta redenção de si que não supõe um redentor como uma pessoa divina é o que se chama propriamente liberdade.” . Num seu texto intitulado “Deus e Mandamento (II)”, antecipa-nos Marinho a mais do que previsível reacção da generalidade dos homens a esse “Deus” que não pretende salvar o homem, mas apenas pensar-se nele, mas apenas “dar-se ao homem para que o homem o apreenda e compreenda tal qual ele é” : “Um Deus como esse não serve para nada. Ou um Deus que intervém na vida e na existência do homem e atende à dor e à desgraça do homem ou nenhum.” . Contra a generalidade dos homens, mas não por isso, propõe-nos Marinho a atitude inversa: que louvemos esse “Deus que não serve para nada”. Seremos capazes disso?