DA MEMÓRIA… JOSÉ LANÇA-COELHO
Arthur Schopenhauer, filósofo alemão, nasceu em Danzing, a 22 de Fevereiro de 1788, e faleceu em Frankfurt, a 21 de Setembro de 1860, fazem agora 150 anos.
Em 1820, aos trinta e dois anos, recebeu o primeiro convite para assumir um cargo temporário e muito mal remunerado para dar aulas de Filosofia na Universidade de Berlim. De imediato, marcou a sua cadeira, intitulada A Essência do Mundo, para a mesma hora da cadeira dada por Hegel, chefe de departamento e o mais famoso filósofo da época. Assim, enquanto 200 alunos se acotovelavam para ouvir Hegel, apenas cinco ouviram Schopenhauer definir-se como um vingador que veio libertar a filosofia pós-kantiana dos paradoxos vazios e linguagem obscura e deturpada da filosofia contemporânea. Os seus alvos eram Hegel e Fichte. No semestre seguinte, não teve um único aluno, nunca mais dando aulas.
Nos trinta anos que viveu em Frankfurt, até morrer em 1860, levou uma vida tão rígida como a de Kant, começando por escrever três horas, a que se seguia uma hora a tocar flauta. Mesmo a meio do Inverno, raro era o dia em que não nadava no frio rio Meno. Almoçava sempre no mesmo clube, o ‘English Hof’, de casaca e peitilho engomado branco, traje que era a alta moda da sua juventude, mas estava completamente ultrapassado em Frankfurt, em meados do século XIX. Pagava dois almoços para garantir que ninguém se sentava na mesma mesa. Tinha a mania de discutir assuntos impróprios e chocantes como, por exemplo, elogiar a nova descoberta científica que impedia que adquirisse uma infecção venérea bastando, após o coito, mergulhar o pénis numa solução de cloreto. Costumava levar para junto da mesa onde almoçava, o seu poodle Atman, que tratava por Sir, chamando-lhe Humano, quando o cão se portava mal.
Num jantar, um jovem perguntou qualquer coisa ao filósofo, a que ele respondeu “Não sei”. Como o jovem comentou: “Pensei, que o senhor, um sábio, soubesse tudo”. O filósofo respondeu: “Não, o conhecimento é limitado, só a estupidez é ilimitada.
Qualquer pergunta sobre mulheres ou casamento tinha sempre uma resposta azeda. Assim, uma vez teve de aguentar a companhia de uma mulher muito faladora, que lhe contou detalhes de como sofria com o casamento. Ouviu-a pacientemente e quando a mulher lhe perguntou se compreendia, respondeu:
“- Não, mas compreendo o seu marido.” Noutra conversa, perguntaram-lhe se pensava casar-se, tendo respondido: “Não, pois só me traria aborrecimentos, porque teria ciúmes por a minha mulher me trair, pois eu ia merecê-lo por me ter casado.
Segundo ele, os médicos usam duas letras diferentes, uma quase ilegível, nas receitas, e outra, clara e bonita, nas contas.
“Só como celibatário se pode assumir o risco de viver sem trabalho e com poucos rendimentos.”
A sua maior raiva, era contra os dois filósofos consagrados do s.XIX, Fichte e Hegel. Num livro, vinte anos depois da morte de Hegel, refere-se a ele como sofista e “um banal, oco, asqueroso, repulsivo e ignorante charlatão, que cometeu a inigualável afronta de escrever um conjunto de disparates pegados, que foi aclamado pelos seus seguidores mercenários no exterior como sendo uma sabedoria eterna”.
Procurou na filosofia hindu o refúgio para o sofrimento pessoal. Introduziu o Budismo e o pensamento indiano na metafísica alemã.
Escreveu ensaios pungentes e aforismos ácidos, sendo um dos poucos filósofos que Wittgenstein lia e admirava.
Os temas principais do seu sistema são: volição, resignação e pessimismo; sendo o seu conceito, a vontade está acima do espaço e do tempo, mas seguir os seus ditames é o caminho mais rápido para a miséria. A sua obra principal é O Mundo como Vontade e Representação (1819), embora o seu livro mais conhecido seja Parerga e Palipomena (1851).