FERNANDA DE CASTRO, DE ALMA EM FLOR, LIBERTA NUM GOLPE DE ASA HÁ
TRINTA ANOS
Mafalda Ferro
Fernanda de Castro morreu de morte natural no dia 19 de Dezembro de 1994. Foi a enterrar no cemitério do Alto de São João onde se encontram já o seu marido e o filho mais velho. No entanto, ao contrário deles que descansam no jazigo de família, Fernanda de Castro pediu para ser enterrada na terra em contacto com a natureza que tanto amou.
Sem lápides, sem chumbo, sem jazigo; | caixão de tábuas,
derradeira casa, | onde repousarei, frágil abrigo, | até me libertar num golpe
de asa.
Então, quando estiver a sós comigo, | que ninguém chore porque o
choro atrasa, | mas que alguém, se quiser, num gesto amigo, | ponha roseiras
sobre a campa rasa.
Será medo o que sinto? Não é medo. | Serei, não serei digna do
Segredo? | Ah, meu Deus, para lá das nebulosas,
Mereça ou não a expiação, a dor, | entrego-Te a minha alma sem
temor. | O que resta, o que sobrar, é para as rosas.
Fernanda de Castro, «Testamento», em "70 Anos de Poesia", 1989.